Fogo na Amazônia dispara em florestas públicas e avança em terras indígenas e áreas privadas

Dados do Mapbiomas mostram que, de janeiro a agosto, incêndios em todo o Brasil atingiram 11,39 milhões de hectares, aumento de 116% em relação a 2023

Por Oscar Valporto | ODS 13ODS 15 • Publicada em 12 de setembro de 2024 - 18:30 • Atualizada em 19 de setembro de 2024 - 11:02

Incêndio florestal na Amazônia: fogo disparou em florestas públicas e avançou em terras indígenas e áreas privadas (Foto: Marizilda Cruppe / Greenpeace – 01/08/2024)

Dados divulgados nesta quinta-feira (12/09) do Monitor do Fogo, levantamento realizado mensalmente pelo MapBiomas, confirmam o cenário trágico enfrentado pelo Brasil nas últimas semanas – de janeiro a agosto de 2024 os incêndios atingiram 11,39 milhões de hectares do território do país, seis milhões de hectares a mais – crescimento de 116% – na comparação com o ano passado. As queimadas foram concentradas em agosto: do total identificado, 5,65 milhões de hectares foram consumidos pelo fogo apenas no mês passado, 49% do total de todo o ano de 2024.

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Com a seca extrema enfrentada pelo Brasil nesta crise climática, as queimadas avançam em quase todos os biomas, em quase todos os estados e em todas as categorias fundiárias. A Amazônia concentrou 48% de toda a área queimada no Brasil nos oito primeiros meses de 2024 – 5,4 milhões de hectares. A coordenadora do Mapbiomas Fogo, a geógrafa Ane Alencar, também diretora de Ciência do Ipam ((Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), alertou para a disparada do fogo nas FPNDs (Florestas Públicas Não Destinadas), principal alvo de grilagem na Amazônia, que enfrentaram o maior aumento entre as categorias fundiárias: 175%, passando de 308.570 hectares atingidos pelo fogo de janeiro a agosto de 2023 para 849.521 hectares queimados em 2024. As FPNDs representam 16% da área queimada na Amazônia no período.

No mês de agosto, o fogo na Amazônia avançou de maneira preocupante, com um aumento significativo na área queimada em comparação ao ano passado. Trinta por cento da área queimada foi de formação florestal. A combinação de atividades humanas e condições climáticas desfavoráveis, como a seca, está intensificando a ocorrência de incêndios, especialmente em áreas de pastagem e vegetação nativa

Ane Alencar
Geógrafa, coordenadora do Mapbiomas Fogo e diretora de Ciência do Ipam

Na categoria fundiária, o Monitor do Fogo também registrou aumento de queimadas em terras indígenas que registraram a maior parte (24%) do que queimou na Amazônia nos oito primeiros meses do ano. Em comparação com 2023, quando tiveram 937.148 hectares queimados no período, os 1.300.646 hectares atingidos em 2024 significam aumento de 39% no fogo nesses territórios. Os imóveis rurais privados com CAR (Cadastro Ambiental Rural) e SIGEF (Sistema de Gestão Fundiária) representaram com 23% da área queimada no bioma de janeiro a agosto deste ano: foram 696.586 hectares queimados em 2023 e 1.233.888 hectares queimados em 2024, aumento de 77%.

“O aumento da área queimada em terras indígenas, nas florestas públicas não destinadas revela uma dificuldade de combater o fogo em áreas onde a infraestrutura e o acesso são difíceis, ainda mais quando várias estão queimando ao mesmo tempo. Para reduzir os incêndios nestas áreas é fundamental reduzir o uso do fogo nos imóveis rurais privados, que também têm uma abrangência grande de área queimada, e combater o uso criminoso do fogo em terras públicas”, afirmou Ane Alencar, que deu entrevista, via Zoom, na tarde desta quinta-feira, para explicar os números do Monitor do Fogo.

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Na série histórica comparativa dos oito primeiros meses de cada ano desde 2019 quando o Monitor do Fogo foi instalado, agosto é sempre o mês com maior área queimada – um prenúncio da “temporada do fogo” anual na Amazônia. Agosto de 2024, entretanto, registrou um aumento de 54% na área queimada no bioma em relação a 2023, impulsionado, principalmente, pelas queimadas em áreas de florestas. “O aumento na área de floresta queimada já era algo que estávamos observando. Em uma nota técnica publicada pelo IPAM em julho deste ano, mostramos a alta de 36% nos incêndios florestais na Amazônia em 2023 em relação a 2022. Ou seja, as políticas de redução de desmatamento, apesar de efetivas, precisam ser complementadas com uma atuação específica para a redução do uso do fogo na paisagem como um todo para além da redução do desmatamento”, destacou a coordenadora do Mapbiomas Fogo.

Os números de agosto de 2024 explicam o alarme: a área de floresta queimada na Amazônia cresceu 132% na comparação com o mesmo mês do ano passado. Este tipo de vegetação nativa, que representou, por exemplo, 12% da área queimada do bioma em agosto de 2019, concentrou 34% de tudo o que pegou fogo na região em agosto – a maior concentração de fogo em floresta para o mês em cinco anos. No total, foram 685.829 hectares de floresta queimada na Amazônia em agosto de 2024 e 295.777 hectares em agosto de 2023.

Em 2019, a área queimada em agosto foi de 207.259 hectares. “No mês de agosto, o fogo na Amazônia avançou de maneira preocupante, com um aumento significativo na área queimada em comparação ao ano passado. Trinta por cento da área queimada foi de formação florestal. A combinação de atividades humanas e condições climáticas desfavoráveis, como a seca, está intensificando a ocorrência de incêndios, especialmente em áreas de pastagem e vegetação nativa”, avaliou Ane Alencar.

Bombeiros de Mato Grosso do Sul combatem incêndio no Pantanal: entre janeiro e agosto de 2024, a área queimada no bioma aumentou 249% em relação à média dos cinco anos anteriores (Foto: Bruno Rezende / GovMS - 21/06/2024)
Bombeiros de Mato Grosso do Sul combatem incêndio no Pantanal: entre janeiro e agosto de 2024, a área queimada no bioma aumentou 249% em relação à média dos cinco anos anteriores (Foto: Bruno Rezende / GovMS – 21/06/2024)

Cerrado e Pantanal em chamas

De janeiro a agosto, o segundo bioma com maior área queimada foi o Cerrado, com pouco mais de 4 milhões de hectares atingidos pelo fogo – cerca de 36% de todo território queimado no Brasil. Mas os pesquisadores do Mapbiomas alertaram para a disparada dos incêndios no Cerrado em agosto, quando o bioma concentrou a maior área queimada: 2,4 milhões de hectares (43% do total do mês), à frente da Amazônia, com 2 milhões de hectares queimados (em um bioma duas vezes maior).

“Agosto trouxe um cenário alarmante para o Cerrado, com um aumento expressivo da área queimada, a maior nos últimos seis anos. O bioma, que é extremamente vulnerável durante a estiagem, viu a maior extensão de queimadas nos últimos seis anos, refletindo a baixa qualidade do ar nas cidades,” disse Vera Arruda, pesquisadora no IPAM e coordenadora técnica do Monitor do Fogo. De acordo com o Mapbiomas, foi o pior agosto da série do Monitor de Fogo, iniciada em 2019, para quase todos os biomas. Na comparação entre agosto de 2023 e de 2024, os incêndios afetaram 3,3 milhões de hectares a mais em 2024, registrando um crescimento de 149%.

Entre janeiro e agosto de 2024, a área queimada no Pantanal aumentou 249% em comparação à média dos cinco anos anteriores. Foram 1,22 milhão de hectares, 874 mil hectares a mais que a média. Mais da metade (52%) desse total queimou em agosto. Os 648 mil hectares queimados em agosto representam a maior área queimada já observada no Pantanal para esse mês pelo Monitor do Fogo do MapBiomas. “A atenção para a alta incidência de incêndios permanece, visto que o mês de setembro é historicamente o mês que mais queima no bioma, que passa por um período de seca extrema”, alerta Eduardo Rosa, do MapBiomas.

Agosto também foi dramático na Mata Atlântica: 500 mil hectares foram queimados, um aumento de 683% em relação à média do mês, e quase 90% da área atingida pelo fogo em 2024: o total queimado entre janeiro e agosto foi de 615 mil hectares. Na Caatinga, 51 mil hectares foram queimados entre janeiro e agosto de 2024, um aumento de 22% em relação ao mesmo período de 2023, com 66% das queimadas concentradas em formações savânicas. O Pampa foi o único bioma que registrou queda na área atingida pelo fogo: a área queimada entre janeiro e agosto de 2024 foi de 2,7 mil hectares, o menor número dos últimos três anos para esse período. O Mapbiomas informou que este padrão está associado com a maior umidade observada na região, com chuvas acima da média para o período.

Nesses oito primeiros meses de 2024, o fogo se alastrou principalmente em áreas de vegetação nativa, que representaram 70% do que foi queimado – áreas campestres (24,7%) formações savânicas (17,9%), áreas florestais ( 16,4%) e campos alagados (9,5%). As pastagens representaram 21,1% de toda a área atingida; também houve impacto em plantações de cana e soja.

Oscar Valporto

Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade

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