Na pandemia, 2020 empata com 2016 como ano mais quente da história

Serviço europeu de mudanças climáticas aponta a década 2011/2020 como a mais quente desde o começo dos registros

Por Observatório do Clima | ODS 13 • Publicada em 11 de janeiro de 2021 - 11:22 • Atualizada em 13 de janeiro de 2021 - 16:43

Cuiabá em dia de recorde de calor – 43,7ºC – setembro de 2020: ano se igualou a 2016 como o mais quente da história (Foto: Secom/MT)

Jaqueline Sordi*

Apesar da pandemia de coronavírus, que derrubou a atividade econômica e as emissões de carbono, e de um evento La Niña que, em tese, deveria ter resfriado o mundo, o ano de 2020 empatou com 2016 como como o mais quente já registrado. O dado, divulgado pelo Copernicus Climate Change Service, programa da União Europeia para monitorar informações sobre clima e emissão de gases, indicou ainda que a última década (2011-2020) se consolidou como a mais quente desde que os registros começaram a ser feitos.

A informação não chegou a causar surpresa. Em dezembro, a Organização Meteorológica Mundial (OMM) já havia previsto que o ano passado alcançaria um aumento recorde de temperatura, e que esta elevação se aproximaria do limite de 1,5°C estabelecido no Acordo de Paris para evitar os piores efeitos da crise do clima. De acordo com o documento mais recente, 2020 foi 0,6°C mais quente do que o período de referência padrão de 1981-2010 e cerca de 1,25°C acima do período pré-industrial, de 1850-1900. Esses dados preocupam, pois “é preciso levar em conta que 2020 iguala o recorde de 2016, apesar de um resfriamento de La Niña”, indicou o serviço europeu de mudanças climáticas em comunicado à imprensa.

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O ano de 2016 havia sido marcado por um forte episódio do El Niño, fenômeno oceânico natural que provoca um aumento da temperatura e que, naquela ocasião, contribuiu para uma elevação de 0,1 a 0,2ºC.Aqui no Brasil, os efeitos deste calor foram sentidos em diversas regiões. No início do ano, Belo Horizonte vivenciou a maior chuva de sua história. Em setembro e outubro, ondas de calor provocaram temperaturas recordes em Nova Maringá (MT) de 44,6oC e recordes históricos de temperatura em Cuiabá, Curitiba e Belo Horizonte. O destaque do relatório, no entanto, foi para a Europa, que teve seu ano mais quente já registrado, com 1,6°C acima do período de referência (1981-2010) e 0,4°C acima de 2019, que já havia sido o mais quente. Além disso, o documento destacou que o maior desvio anual de temperatura da média concentrou-se no Ártico e no norte da Sibéria, chegando a mais de 6°C acima da média.

As concentrações de CO2 ao longo de 2020 também ganharam destaque, já que elas seguiram aumentando apesar da queda drástica das atividades econômicas devido às restrições de circulação impostas pela pandemia. Vincent-Henri Peuch, Diretor do Copernicus Atmosphere Monitoring Service (CAMS), alertou que “embora as concentrações de dióxido de carbono tenham aumentado um pouco menos em 2020 do que em 2019, isso não é motivo para complacência. Até que as emissões globais líquidas sejam zeradas, o CO2 continuará a se acumular na atmosfera e impulsionar novas mudanças climáticas”.

Embora uma forte La Niña possa baixar um pouco as temperaturas em 2021, os níveis de dióxido de carbono na atmosfera provavelmente permanecerão altos, contribuindo para o aquecimento contínuo. Para Matthias Petschke, diretor de Espaço da União Europeia, os dados do relatório devem servir como um alerta. “Não temos tempo a perder. Devemos nos unir como uma comunidade global, para garantir uma transição justa para um futuro líquido zero. Será difícil, mas o custo da inação é muito alto”.

Crianças se refrescam em fonte de Colmar, no leste da França, em dia de calor de 40 graus no verão francês: Europa teve ano mais quente da história (Foto: Sebastien Bozon)
Crianças se refrescam em fonte de Colmar, no leste da França, em dia de calor de 40 graus no verão francês: Europa teve ano mais quente da história (Foto: Sebastien Bozon)

Recorde de calor absoluto na Europa

Na Europa, 2020 foi o ano mais quente registrado – acima até de 2016 – e sazonalmente o inverno 2019/20 e o outono de 2020 também foram os mais quentes registrados. O inverno europeu de 2020 – de dezembro de 2019 a fevereiro de 2020 – excedeu o anterior mais quente de 2016 em quase 1,4 ° C, enquanto o outono (setembro a novembro de 2020) ultrapassou o antigo recorde estabelecido em 2006 em 0,4 ° C. Além disso, a Europa Ocidental experimentou uma onda de calor significativa no final de julho e início de agosto. Os próximos quatro anos mais quentes para a Europa também aconteceram durante a última década.

Uma análise completa e detalhada do clima na Europa será lançada em abril, quando a Copernicus apresentar seu relatório anual European State of the Climate 2020. Carlo Buontempo, Diretor do Copernicus Climate Change Service (C3S), comenta: “2020 se destaca por seu calor excepcional no Ártico e um número recorde de tempestades tropicais no Atlântico Norte. Não é surpresa que a última década foi a mais quente registrado, e é mais um lembrete da urgência de reduções ambiciosas de emissões para evitar impactos climáticos adversos no futuro”.

O Hemisfério Norte, em geral, experimentou temperaturas acima da média durante o ano, com exceção de uma região sobre o Atlântico Norte central. Partes do Hemisfério Sul, ao contrário, tiveram temperaturas abaixo da média, principalmente no Pacífico equatorial oriental, associadas às condições mais frias de La Niña que se desenvolveram durante a segunda metade do ano. O serviço climático europeu afirma ser “notável que 2020 corresponda ao recorde de 2016, apesar de ser afetado por um La Niña de resfriamento, enquanto 2016 foi um ano recorde que começou com um evento El Niño de forte aquecimento”.

Partes do Ártico e do norte da Sibéria registraram algumas dos maiores oscilações de temperatura anuais em relação à média em 2020, com uma grande região apresentando aumentos de até 3 °C e em alguns locais até mais de 6°C para o ano como um todo. Em uma base mensal, as maiores anomalias positivas de temperatura para a região atingiram repetidamente mais de 8°C. A Sibéria Ocidental experimentou um inverno e primavera excepcionalmente quentes, um padrão também visto durante o verão e o outono no Ártico da Sibéria e em grande parte do Oceano Ártico.

Além disso, a temporada de incêndios florestais foi excepcionalmente ativa nesta região, com os primeiros incêndios detectados em maio, continuando durante todo o verão e até o outono. Como resultado, no pólo do Círculo Polar Ártico, os incêndios liberaram uma quantidade recorde de 244 megatons de dióxido de carbono em 2020, mais de um terço a mais do que o recorde de 2019. Durante a segunda metade do ano, o gelo marinho do Ártico foi significativamente menor do que a média para a época do ano, com julho e outubro tendo a menor extensão de gelo marinho registrada para o mês respectivo.

*Observatório do Clima

Observatório do Clima

O Observatório do Clima é uma rede que reúne entidades da sociedade civil para discutir a questão das mudanças climáticas no contexto brasileiro.

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