Taxação e tributação para financiar adaptação às mudanças climáticas

Painel sobre financiamento climático no Fórum Brasileiro de Finanças Climáticas: taxação e tributação para financiar adaptação às mudanças climáticas (Foto: Fotoka/Divulgação)

Especialistas debatem fortalecimento da agenda de financiamento climático em fórum promovido por ONGs

Por Guilherme Silva | ODS 13 • Publicada em 29 de fevereiro de 2024 - 09:34 • Atualizada em 7 de março de 2024 - 09:49

Painel sobre financiamento climático no Fórum Brasileiro de Finanças Climáticas: taxação e tributação para financiar adaptação às mudanças climáticas (Foto: Fotoka/Divulgação)

Relatório do Comitê Permanente de Finanças da Convenção do Clima revelou que os países em desenvolvimento precisam de US$ 5,8 a 5,9 trilhões de dólares até 2030, para implementar as metas nacionais de redução metas de redução de emissão de gases de efeito estufa (NDCs) dos países em desenvolvimento. E o Relatório das Nações Unidas sobre a Lacuna de Adaptação 2023 aponta que, em vez de acelerar, o progresso na adaptação climática está diminuindo de velocidade.

Nós precisamos de um plano de investimento e recursos inovadores para avançar na pauta climática. Mas a justiça social deve estar na base das reflexões

Laurence Tubiana
CEO da European Climate Foundation

Durante o painel “Últimas tendências para fortalecimento da agenda de financiamento climático”, no Fórum Brasileiro de Finanças Climáticas, evento promovido por sete organizações da sociedade civil em São Paulo, foi destacada a necessidade de focar em tributação e taxação para assegurar os recursos para adaptação do planeta, principalmente dos países mais pobres, às mudanças climáticas. CEO da European Climate Foundation (ECF), Laurence Tubiana, ex-embaixadora de Mudanças Climáticas da França, e uma das principais arquitetas do Acordo de Paris, defendeu pensar maneiras de buscar projetos de tributação e taxação pensando em justiça social. “Devemos ter em mente o elemento de justiça social nas questões de financiamento climático”, destacou. “Precisamos de diferentes tipos de financiamento”.

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Laurence Tubian argumentou que ,embora alguns países poluam mais, o impacto dessa poluição é sentida de forma desigual, citando, por exemplo, a discussão mais recente sobre o impacto de jatinhos particulares por grandes artistas, como foi no caso com a cantora Taylor Swift – que chegou a vender um de seus jatos após um estudo revelar o nome dela como celebridade que mais emitiu carbono. A ambientalista apontou outros setores que devem também ser tributados, como aviação e transporte marítimo, para financiar a adaptação climática. “Nós precisamos de um plano de investimento e recursos inovadores para avançar na pauta climática. Mas a justiça social deve estar na base das reflexões”, frisou.

O economista Luiz Awazu, ex-diretor do Banco de Compensações Internacionais (BIS) e do Banco Central, disse quando o assunto é clima, há risco e que, ao mesmo tempo, existe um paradoxo: “Temos garantias de US$ 130 trilhões de dólares de ativos financeiros do setor privado destinados para a transição climática, mas com dificuldade de canalizar esses ativos de tomar risco”.

Os projetos precisam ser charmosos para atrair investidores e precisam dar resultado com inclusão, combate à desigualdade, emprego e renda para as pessoas que mais necessitam

Cristina Fróes
Subsecretária de Desenvolvimento Econômico Sustentável do Ministério da Fazenda

Awazu citou propostas concretas que precisam ser colocadas em prática para tentar resolver esse paradoxo: construir ativos financeiros securitização do risco onde o investidor pode assumir o grau de risco que ele considere como aceitável; criar mercados de bônus verde (financiamento ou refinanciamento de projetos verdes, isto é, sustentáveis e socialmente responsáveis); ampliar os fundos de transição para permitir países desenvolvidos e em desenvolvimento façam a transição para a neutralidade de carbono antes de embarcarem em uma trajetória de alto carbono; e aprimorar e definir corretamente os chamados cat bonds – títulos que têm por objetivo ajudar as resseguradoras, seguradoras, governos e empresas a gerenciar sua exposição a grandes riscos.

O economista também citou a necessidade de criar mecanismos que facilitam a doações para países pobres por conta da necessidade de estar atento a justiça social a partir dos fenômenos climáticos: “Os acidentes climáticos atingem essencialmente pessoas pobres, em países ricos e pobres e países pobres, então a questão de como mobilizar mais doação e filantropia me parece uma questão essencial”, disse Awazu.

Obstáculos políticos

Subsecretária de Desenvolvimento Econômico Sustentável do Ministério da Fazenda, a economista Cristina Fróes frisou que há obstáculos para conseguir financiamento climático, mencionando a falta de dados e metodologias para entender a realidade e mapear que o país possa criar e ter acesso a políticas públicas de uma maneira mais fácil. “Às vezes iniciativas são muito pontuais, como grandes organizações, vem e fazem um grande trabalho junto ao governo e, às vezes, se perdem”, disse Cristina Fróes.

Além disso, em relação à implementação, a subsecretária citou o obstáculo de estabelecer metodologias que se permanecem na formação, implementação e operação dessas políticas públicas e colocou como resolução, o investimento de novas tecnologias e digitalização para obtenção de dados e metodologias. O desafio, na sua visão, é desenvolver oportunidades de renda que sejam atraentes para que financiadores tradicionais queiram migrar para esse novo caminho da sustentabilidade. “Os projetos precisam ser charmosos para atrair investidores e precisam dar resultado com inclusão, combate à desigualdade, emprego e renda para as pessoas que mais necessitam”, concluiu Cristina Fróes.

Diretora de Parcerias, Comunicação e Conhecimento do Instituto Clima e Sociedade (iCS), a advogada e economista Alice Amorim, especialista em política climática, destacou outros obstáculos. “Existem muitos números à mesa, mas o funcionamento dos diferentes instrumentos de financiamento climático não está claro”, afirmou, frisando que os recursos financeiros – sejam mecanismos de taxação, redirecionamento de subsídios, recursos públicos, investimento privado ou filantrópico – precisam ajudar a resolver problemas da vida real. A diretora do iCS lembrou que o ano de 2023 registrou recorde de temperatura, enquanto tempestades, inundações, secas e ondas de calor demonstraram a urgência das estratégias de financiamento para enfrentar as mudanças climáticas.

Especialista em macroeconomia e finanças do desenvolvimento, Rogério Studart, senior fellow do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), frisou que a maior parte dos países em desenvolvimento não tem capacidade para mobilizar recursos e enfrentar a crise climática. “O ecossistema de finanças climáticas precisa evoluir, com modelos mais promissores que possam ajudar a criar instrumentos para facilitar e construir uma ponte para o financiamento internacional”, disse Studart do painel do Fórum Brasileiro de Finanças Climáticas, que foi organizado conjuntamente pelo Instituto Arapyaú, Instituto AYA, Instituto Clima e Sociedade (iCS), Instituto Igarapé, Instituto Itaúsa, Open Society Foundations e Uma Concertação pela Amazônia.

Guilherme Silva

Jornalista formado pela Universidade Nove de Julho. Atualmente integra o time de repórteres correspondentes da Agência Mural de Jornalismo das Periferias e foi estagiário no Canal Reload. Nascido e criado nas periferias da Zona Sul de São Paulo, é apaixonado por comunicação, histórias e explorar a cidade de bicicleta.

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