Não falta água, falta qualidade

O princípio do usuário pagador prevê que o valor da água, por exemplo, seja cobrado de quem usa. Não apenas o preço que remunera a companhia de distribuição, mas o valor do bem em si mesmo

Ausência de saneamento e aquecimento global são destaques na abertura de seminário sobre crise hídrica

Por Valquiria Daher | ODS 6 • Publicada em 24 de junho de 2016 - 17:01 • Atualizada em 24 de junho de 2016 - 18:55

O princípio do usuário pagador prevê que o valor da água, por exemplo, seja cobrado de quem usa. Não apenas o preço que remunera a companhia de distribuição, mas o valor do bem em si mesmo
Carlos Nobre, Luiz Alberto Oliveira, curador do Museu, Paulo Canedo, Édison Carlos e Marcio Santos
Carlos Nobre, Luiz Alberto Oliveira, curador do Museu, Paulo Canedo, Édison Carlos e Marcio Santos

Diante da crise hídrica, é melhor limpar a água disponível em lugar de buscar novos reservatórios. O raciocínio aparentemente simples, que se traduz em saneamento básico, não tem sido praticado no Brasil, concluem os participantes dos primeiros debates do Seminário Crise Hídrica no Brasil: ontem, hoje e amanhã, realizado nesta sexta-feira (24/06, no Museu do Amanhã, uma iniciativa do Projeto #Colabora.

Se o Tietê tivesse a qualidade do Tâmisa ou do Sena, o problema da água em São Paulo seria menor

“Se o Tietê tivesse a qualidade do Tâmisa ou do Sena, o problema da água em São Paulo seria menor”, avalia Carlos Nobre, do Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE), destacando que em algumas áreas paulistas, a crise hídrica é igual à do semiárido Nordestino. Um dos maiores nomes no estudo das mudanças climáticas no mundo, o climatologista traçou um cenário desolador do futuro e relacionou a intensificação da seca nordestina – a pior em cem anos – ao aquecimento global. Para ele, a não ser que as emissões de gases sejam zeradas e, a partir de 2050, passem a ser negativas, veremos a aridização do Nordeste, que se parecerá com um deserto, e boa parte da Amazônia vai se tornar uma savana empobrecida.

Mas para ter água de qualidade o Brasil ainda vai encarar um desafio que pode custar mais de R$ 500 bilhões. Um dos integrantes da mesa de abertura do seminário, que questionava como chegamos nesta situação tendo 12% de toda a água doce do planeta, o presidente do Instituto Trata Brasil, Édison Carlos, destacou que, hoje, 60% do esgoto despejado na natureza não são tratadas no país. “Temos padrões sanitários do século 19. Os jornalistas me perguntam: ‘é difícil?’. E eu respondo: os romanos resolveram. Nem os esgotos eles despejavam próximos às cidades”.

Carlos relembrou que, em meio à crise hídrica de São Paulo, recebia os especialistas estrangeiros que estranhavam a situação ao chegar à cidade e ver o Rio Tietê. “Eles perguntavam por que não conseguimos usar os rios. E tínhamos que responder: por que estão podres”.

Um paralelo entre medidas para se chegar à segurança hídrica e também ao saneamento básico foi traçado pelo professor Paulo Canedo, da Coppe/UFRJ. Assim como os demais participantes, ele acredita que o principal problema a ser enfrentado ainda é a falta de água e esgoto para uma parcela grande da população, mas destacou medidas que podem ser tomadas pelos gestores – governos – para que não cheguemos à situação limite ocorrida em São Paulo. “Lá houve uma falha de gestão”, decreta. “Os reservatórios foram feitos para enfrentarmos os períodos de falta de chuva”, explica, expondo dados sobre a dependência do Estado do Rio ao Paraíba do Sul, mas destacando que aqui a gestão do recurso foi bem feita.

Mas e as necessidades das populações? Marcio Santos, da Câmara Setorial de Equipamento de Irrigação, destacou a importância de novas tecnologias para garantir uma agricultura com menos desperdício e menos dependente do clima. “A irrigação pode ser um vilão ou pode ser a solução. Depende de como for usada”, avaliou, dando o exemplo de como a seca é a responsável, por exemplo, da alta do preço do feijão. “Na área da Bahia, onde é feito o plantio de feijão, a seca é tão grave que até a irrigação precisou ser interrompida”.

Valquiria Daher

Formada em Jornalismo pela UFF, nasceu em São Paulo, mas cresceu na cidade do Rio de Janeiro. Foi repórter do jornal “O Dia”, ocupou várias funções no “Jornal do Brasil” e foi secretária de redação da revista de divulgação científica “Ciência Hoje”, da SBPC. Passou os últimos anos no jornal “O Globo”, onde se dedicou ao tema da Educação. Editou a Revista “Megazine”, voltada para o público jovem, e a “Revista da TV”. Hoje é Editora do Projeto #Colabora e responsável pela Agência #Colabora Marcas.

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