ODS 1
Saneamento público ou privado?
Debate sem apoio na realidade atrasa solução de problemas. O Brasil precisa de ambos!
Nas últimas semanas, muito tem se falado sobre o novo programa do Governo Federal que incentiva uma maior participação do setor privado no saneamento básico, principalmente nos serviços de água e esgotos. Nesta primeira etapa, o programa pretende promover a participação privada nas empresas operadoras de água e esgotos do Rio de Janeiro, Pará e Rondônia. O debate gera polêmica, especialmente por aqueles que entendem que a solução para o país seria um ou outro. Isso é um erro: o país precisa de ambos.
[g1_quote author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”solid” template=”01″]O país precisará de recursos financeiros da ordem de R$ 300 bilhões somente para que todos os brasileiros possam ter acesso aos serviços de água e esgotos. Se juntarmos as necessidades dos serviços de resíduos sólidos e drenagem das águas de chuva, esses recursos passam de R$ 500 bilhões.
[/g1_quote]Olhando os indicadores nacionais desde a Lei 11445, de 2007, a chamada Lei do Saneamento, bem como o Ranking que o Instituto Trata Brasil publica todos os anos desde 2009, com base nos dados fornecidos pelas 100 maiores cidades, vemos que o país avança lentamente nesses serviços e que, a se manter nesse ritmo, não conseguiremos levar água e esgotos a todos os brasileiros antes de 2050. Esta constatação, sozinha, já deveria servir para mostrar que o Brasil precisa dos dois. Importante ressaltar que temos exemplos bons e ruins tanto no saneamento público quanto no privado, então cabe uma visão mais apurada.
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Veja o que já enviamosSe tomarmos apenas os indicadores das 20 melhores cidades do Ranking do Trata Brasil – ano base 2014 do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS – Ministério das Cidades) – temos 11 cidades operadas por empresas estaduais, 5 por empresas municipais e 4 por sistemas envolvendo participação privada. Se pegarmos as 20 últimas colocadas também teremos os mesmos modelos. E o que isso significa? Que mais importante do que analisar se o modelo é público ou privado é ver a eficiência com que se opera o saneamento naquela cidade, a sequência de investimentos que vem sendo feita a longo prazo e o foco que os governantes locais e a empresa operadora têm em encontrar soluções concretas para os serviços de água e esgotos.
Pelos números divulgados pelas entidades ligadas ao saneamento básico, cerca de 70% da população brasileira é atendida por empresas estaduais de saneamento, 20% por empresas municipais e 10% por empresas privadas. Isso mostra que, apesar dos avanços do setor privado (e que continuará), é impossível pensar que o setor privado substituirá o papel das empresas públicas, que atendem 90% das pessoas. Se não paira dúvida sobre a importância das empresas públicas no saneamento, então porque a polêmica?
Podemos dizer que a participação privada no saneamento básico está vivendo a mesma pressão enfrentada anos atrás por outras áreas da infraestrutura, como rodovias, telecomunicação e energia elétrica. A simples sinalização de que a iniciativa privada pode entrar mais forte nos serviços de água e esgotos gera pressão contrária daqueles que veem esses serviços como essencialmente públicos. Os fatos e a história mostram, no entanto, que o descaso de nossos governantes e a omissão com o crescimento desenfreado das áreas urbanas fez com que o modelo predominantemente público não fosse suficiente para levar saneamento básico a todos na velocidade necessária.
Não é culpa, portanto, das empresas, mas de grande parte dos governadores, prefeitos e governo federal que nas décadas de 80 a 2000 fecharam os olhos para o planejamento sanitário. Sendo pragmático e analisando apenas os números do Plano Nacional de Saneamento Básico (PLANSAB), promulgado em 2013, vemos que o país precisará de recursos financeiros da ordem de R$ 300 bilhões somente para que todos os brasileiros possam ter acesso aos serviços de água e esgotos. Se juntarmos as necessidades dos serviços de resíduos sólidos e drenagem das águas de chuva, esses recursos passam de R$ 500 bilhões.
Isso tudo para resolver a situação em 20 anos. Um tempo absurdo para a situação vergonhosa que vive o país que possui 35 milhões de brasileiros sem água tratada, mais de 100 milhões sem coleta de esgotos e que tem somente 40% de seus esgotos tratados. Verificando a dramática situação econômica de estados, municípios e mesmo do governo federal, é certo que essas instâncias não têm como fazer frente aos desafios do saneamento básico e que, portanto, é essencial a entrada do setor privado. E a importância desse setor não se dá apenas pelo aporte adicional de recursos, mas principalmente por trazer em seu DNA os conceitos mais aprofundados de gestão, governança, produtividade, capacitação, lucratividade e tantas outras características que faltam à muitas das empresas públicas do setor de saneamento.
Como em qualquer serviço público, mais relevante do que questionar se a empresa é pública ou privada, o essencial é que haja fiscalização e regulação, que se cobrem metas de desempenho, atendimento de indicadores mínimos de performance e que se preste um bom serviço ao cidadão. Que as tarifas sejam condizentes com capacidade de pagamento dos moradores, que ele seja respeitado em suas demandas, mas também que a empresa possa sobreviver com as tarifas do sistema. Não é o caso, portanto, de considerar a entrada da iniciativa privada como uma ameaça, ao contrário, o mais inteligente é pensar nela como um complemento importante para promovermos avanços mais rápidos na mais básica e esquecida das infraestruturas. Uma oportunidade de trabalhar junto, dividindo riscos, ganhando escala e partilhando soluções. Temos que lembrar, portanto, que mais importante do que promover debates sem fundamento na realidade é lembrar que saneamento traz saúde, protege as crianças, ajuda a educação e o turismo, gera renda e melhora nossos recursos hídricos. Isso sim é relevante para o país.
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É Presidente Executivo do Instituto Trata Brasil. Químico industrial de formação, por muitos anos atuou em áreas ligadas à Comunicação e Relações Institucionais nos setores químico e petroquímico. Além de formado em Química pelas Faculdades Oswaldo Cruz, o executivo é pós-graduado em Comunicação Estratégica, já tendo atuado nas áreas de tratamento de águas e efluentes. Atuou por quase 20 anos em várias posições no Grupo Solvay, sendo que nos últimos anos foi responsável pela área de Comunicação e Assuntos Corporativos da Solvay Indupa. Em 2012, Édison Carlos recebeu o prêmio “Faz Diferença – Personalidade do Ano” do Jornal O Globo – categoria “Revista Amanhã” que premia quem mais se destacou na área da Sustentabilidade em todo o país.