As chaves das cidades do futuro

Os investimentos em mobilidade e redução das emissões de carbono fazem com que Copenhague seja uma presença constante nas listas de melhores cidades do mundo. Foto Jim Nix / Robert Harding Premium

Estudo revela que crescimento sustentável, participação da população e eficiência serão os principais indicadores de sucesso

Por Gisela Campos | ODS 11 • Publicada em 21 de setembro de 2017 - 09:20 • Atualizada em 21 de setembro de 2017 - 13:44

Os investimentos em mobilidade e redução das emissões de carbono fazem com que Copenhague seja uma presença constante nas listas de melhores cidades do mundo. Foto Jim Nix / Robert Harding Premium
Os investimentos em mobilidade e redução das emissões de carbono fazem com que Copenhague seja uma presença constante nas listas de melhores cidades do mundo. Foto Jim Nix / Robert Harding Premium
Os investimentos em mobilidade e redução das emissões de carbono fazem com que Copenhague seja uma presença constante nas listas de melhores cidades do mundo. Foto Jim Nix / Robert Harding Premium

Qual a chave do sucesso das cidades do futuro? O que significa ser uma “cidade inteligente”? Este é um dos grandes desafios do século. Mais da metade do planeta já vive hoje em cidades e até 2030 este número deve chegar a 66%. Ou seja, até lá provavelmente teremos mais 1,4 bilhão de pessoas vivendo em cidades. Hoje é nas cidades que a maioria da população mundial vive e trabalha. São o motor da economia mundial, consumindo a maior parte da energia e dos recursos naturais, gerando 80% do PIB mundial – e 70% das emissões de carbono. Fazer as cidades melhores é o desafio de infraestrutura mais crítico de nossos dias.

Uma cidade altamente tecnológica e monitorada, mas onde a população está alijada do processo de criação, planejamento e gestão é uma cidade que servirá apenas à elite governante e ao grupo que a sustenta

Um estudo do Instituto Global McKinsey (MGI) estimou que, entre hoje e 2025, a população mundial deve crescer, em média, cerca de 65 milhões de pessoas por ano, o que dá cerca de 179 mil pessoas por dia. Atender às demandas desta nova demografia será um desafio necessário. O que teremos que fazer para viver em cidades melhores?

Para tentar responder a esta pergunta, o Instituto Global Mckinsey entrevistou vários gestores de cidades e especialistas em temas urbanos da Ásia, Europa, Oriente Médio e Américas do Norte e Latina. O resultado deste estudo, que buscou respostas em cidades de portes, histórias e administrações diferentes, encontrou três “atitudes” que foram consideradas importantes para uma “cidade de sucesso”.

A primeira das três “atitudes de sucesso” é obter um crescimento inteligente. Mas o que seria isso? Toda cidade precisa de crescimento econômico para proporcionar boas infraestruturas e boa qualidade de vida aos seus moradores. Um “crescimento inteligente” é aquele que, segundo o resultado do estudo, proporciona um crescimento sustentável.  Mas é quase um senso comum ter como objetivo um crescimento sustentável. Para Luiz Roberto Arueira, Diretor de Informações da Cidade, do Instituto Pereira Passos, uma cidade inteligente é uma cidade que se conhece, ou seja, “está além de sensores e tecnologia, mas os usa para gerar e compartilhar dados, produzindo conhecimento de forma coletiva e colaborativa” Arueira reforça, entretanto que “uma cidade altamente tecnológica e monitorada, mas onde a população está alijada do processo de criação, planejamento e gestão é uma cidade que servirá apenas à elite governante e ao grupo que a sustenta”.

Mais de 35 milhões de brasileiros não têm acesso à água tratada. Sem saneamento básico fica difícil pensar em futuro. Foto Custódio Coimbra
Mais de 35 milhões de brasileiros não têm acesso à água tratada. Sem saneamento básico fica difícil pensar em futuro. Foto Custódio Coimbra

Sendo assim, qual seria a chave de sucesso para as cidades no futuro? Segundo Arueira, “conhecimento e participação cidadã são as chaves para o desenvolvimento das cidades do futuro que, obrigatoriamente, serão cidades sustentáveis, resilientes e inclusivas”. Para o Diretor-Executivo da SDSN Brasil, rede que reúne organizações da sociedade civil, instituições acadêmicas e empresas públicas e privadas que tem como objetivo apresentar soluções para o desenvolvimento urbano sustentável, a chave do sucesso das cidades brasileiras ainda está distante: “infelizmente, a maior parte dos desafios das nossas cidades ainda são desafios do século XX, ou mesmo do século XIX, como a universalização do saneamento básico, da energia elétrica ou do acesso a água tratada”.

Voltando ao estudo, cujo enfoque é internacional, o mesmo revela que o importante é descobrir as principais vantagens competitivas de cada cidade e, a partir daí, construir um modelo principal de negócios que faça sentido econômico para a cidade e seus moradores. A partir do momento em que a cidade determina sua força, sua vocação e aquilo pelo qual ela quer ser conhecida, seus negócios passam a ser desenvolvidos nesta direção. Dubai, por exemplo decidiu criar o maior porto mundial e construiu toda a infraestrutura para tal, focando todos seus esforços para isso. Marco Simões, da SDSN Brasil, considera que, como país, teremos de chegar a um consenso quanto às nossas ambições, “para atender as necessidades mínimas da população enquanto combatemos a destruição de nossas florestas e realizamos a transição para uma sociedade de baixo carbono. São desafios muito grandes e para os quais não temos ainda um consenso e atenção nacional apropriados”.

A segunda “atitude de sucesso” apontada pelo estudo é “fazer mais com menos”. Todos os prefeitos e gestores de cidades do mundo queixam-se de seus orçamentos e dos valores disponíveis para atender às necessidades da população. O estudo aponta que o segredo para o sucesso não é gastar menos, mas gastar “melhor”. Para lidar com as pressões orçamentárias, cidades fazem todos os esforços possíveis para coletar impostos e gerir seus recursos de forma eficiente. Algumas ações específicas a serem tomadas poderiam ser, por exemplo, terceirizar uma parte da administração ou alguns serviços como manutenção de parques, serviços de limpeza, dentre outros. Parcerias público-privadas eficientes podem também fornecer infraestrutura e serviços a um preço mais baixo com qualidade mais alta. O segredo está em definir objetivos concretos e mensuráveis utilizando análises de custo-benefício e métricas rigorosas. A Inglaterra fez isso através de parcerias para construção de estradas, por exemplo.

Segundo Daniela Goes, especialista em gestão pública pela Harvard University, as parcerias público-privadas podem ser um instrumento de eficiência fiscal no curto e no médio prazo, principalmente por serem capazes de alocar recursos para a infraestrutura, uma vez que os projetos são financiados no curto prazo pelo setor privado e pagos pelo setor público no longo prazo. Segundo Daniela, “esta estratégia de financiamento do setor público pode ser comparada, por exemplo, a um empréstimo bancário e contribui para canalizar recursos de forma mais eficaz para a infraestrutura”.

A terceira e última atitude de sucesso recomendada pelo estudo é conquistar o “apoio necessário para fazer as mudanças”. Esta última é, talvez, a mais difícil de todas. Negócios estabelecidos, comunidades e interesses políticos muitas vezes preferem o status quo. Gestores precisam ser persistentes e resilientes para obterem resultados rápidos, positivos e visíveis. Para isso, o estudo recomenda, por exemplo, ter uma equipe de servidores motivada e dedicada. Nesta linha, Singapura, que tem um dos formatos de gestão pública mais bem avaliados pelo estudo, criou um sistema de promoção de servidores públicos baseado em méritos e produtividade, e não em tempo de serviço.

Aqui no Brasil temos ainda muito chão pela frente, mas a cidade de Curitiba é citada no relatório, por conta dos BRTs, já replicados no Rio de Janeiro e outros municípios brasileiros. Segundo Marco Simões, “são imensas as adversidades que nossas cidades já enfrentam e que deverão se tornar ainda mais complexas nos próximos anos, com as mudanças climáticas e a contínua tendência de urbanização do país”. Para Marco, “construir uma urbanidade mais humana é um dos grandes desafios que temos. Mais de 85% da população brasileira está hoje nas cidades. Em 2050, serão mais de 90% nos centros urbanos. A cada segundo, novos habitantes chegam, o que gera crescimento de forma desordenada. Ao pensar em cidades, precisamos considerar toda a região metropolitana, levando em conta aspectos como mobilidade, desigualdade, informalidade e exclusão”. Que nos próximos anos outras cidades brasileiras encontrem suas chaves para o sucesso para que sejam citadas como exemplo.

Gisela Campos

É publicitária e jornalista. Mestre em Literatura Brasileira e autora dos romances As ideias todas (Record), As boas vindas (Relume Dumará) e Bill e a máquina do tempo (Diadorim). Mora em Botafogo com a filha Manuela e a cachorrinha Mel.

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