Colcha de retalhos

Leila e outras mulheres resolveram criar o espaço, a princípio, para reunir artistas plásticos que já haviam passado pela Pedra e não moravam mais lá

Mulheres de Pedra valoriza a cultura negra há 15 anos no litoral da zona oeste

Por Andre Luis Mansur | ODS 9 • Publicada em 10 de junho de 2016 - 08:00 • Atualizada em 10 de junho de 2016 - 18:25

Leila e outras mulheres resolveram criar o espaço, a princípio, para reunir artistas plásticos que já haviam passado pela Pedra e não moravam mais lá
No espaço de convivência das Mulheres de Pedra acontecem saraus, apresentações teatrais, exibições de filmes, exposições, palestras e muito mais
No espaço de convivência das Mulheres de Pedra acontecem saraus, apresentações teatrais, exibições de filmes, exposições, palestras e muito mais

Bem perto do belo litoral da Pedra de Guaratiba, zona oeste do Rio de Janeiro, fica o espaço de convivência do coletivo Mulheres de Pedra, que há 15 anos desenvolve diversas atividades culturais e de valorização da mulher e da cultura negra. No simpático e aconchegante espaço ocorrem saraus, apresentações teatrais, exibições de filmes, exposições, palestras etc, inclusive com hospedagem de grupos de vários lugares da cidade e de outros estados. “O maior retorno é o trabalho coletivo, é acreditar cada vez mais num mundo melhor, acreditar no afeto, no amor e no trabalho colaborativo. Acreditar e vencer”, afirma a pedagoga Leila Souza Netto, denominada a matriarca das Mulheres de Pedra.

O maior retorno é o trabalho coletivo, é acreditar cada vez mais num mundo melhor, acreditar no afeto, no amor e no trabalho colaborativo. Acreditar e vencer.

Leila e outras mulheres resolveram criar o espaço, a princípio, para reunir artistas plásticos que já haviam passado pela Pedra e não moravam mais lá. Uma das grandes inspirações para ela foi a artista Dora Romana, já falecida, que incentivou a produção de arte em quadrados de pano, que depois seriam transformados em grandes colchas de retalhos, ou painéis temáticos, um símbolo do trabalho feito pelas Mulheres de Pedra. A Pedra de Guaratiba até hoje é um local de muitos artistas plásticos, com grande presença de ateliês e exposições, abrigando nomes como os de Sérgio Vidal da Rocha e Mestre Saul, muito conhecidos na região. Heitorzinho dos Prazeres, filho do pintor e compositor Heitor dos Prazeres, teve um ateliê na Pedra por muito tempo, onde ofereceu oficinas de desenho e pintura para as crianças do bairro.

O coletivo está integrado ao Polo Cultural e Gastronômico da Pedra de Guaratiba, que atrai muita gente ao bairro, principalmente nos fins de semana, onde acontece um chorinho em frente à praia, assim como uma feira de artesanato. Sobre o retorno da população ao trabalho das Mulheres de Pedra, Leila diz que as pessoas veem o espaço de convivência como um território negro, como um espaço de trocas, não só pelos eventos, mas também pelas oficinas que o coletivo oferece. Além disso, as Mulheres de Pedra promovem essa troca com escolas da região, entre elas o Ciep Heitor dos Prazeres, a escola Myrthes Wenzel, a Casa Arte Vida e a Fundação Xuxa Meneghel. O grupo também se apresenta em outros espaços pela cidade, como aconteceu recentemente no 1º Circuito Carioca de Saraus, que circulou pelas arenas culturais do Rio, entre elas a Arena Abelardo Barbosa, a Arena Chacrinha, bem perto da sede das Mulheres de Pedra. Na Folia de Reis realizada em janeiro deste ano, a apresentação percorreu as ruas do bairro, com grande participação dos moradores.

Leila e outras mulheres resolveram criar o espaço, a princípio, para reunir artistas plásticos que já haviam passado pela Pedra e não moravam mais lá
Leila e outras mulheres resolveram criar o espaço, a princípio, para reunir artistas plásticos que já haviam passado pela Pedra e não moravam mais lá

Após tantos eventos importantes ocorridos nesses anos todos, a matriarca das Mulheres de Pedra destaca o ocorrido em outubro do ano passado, “Territórios da Fé…meninas ninadas do ventre poético do manguezal”, que reuniu 60 pessoas no espaço de convivência durante o fim de semana. “O objetivo era a realização de um filme, mas o mais importante foi a imersão de tanta gente reunida e a troca com coletivos de todo o Brasil hospedados aqui. Foi um sentimento muito forte, o fazer coletivo, a construção de um mundo melhor, de amor, de carinho, solidário. Economia solidária, um universo mais justo”, afirma Leila. Este projeto, como o filme gerado por ele, deu ao coletivo o primeiro lugar do prêmio Geraldo Jordão Pereira, do Instituto Rio. Outro filme produzido pelas Mulheres de Pedra, “Elekô”, ganhou quatro prêmios no Festival 72 horas Rio 2015, incluindo melhor filme e direção.

O espaço de convivência das Mulheres de Pedra fica na rua Saião Lobato, 138, pertinho do píer da Pedra e do Polo Gastronômico. Também fica perto da praça Raul Barrozo, no centro do bairro, também conhecida como praça do Rodo, pois era ali que o antigo bonde que vinha do bairro de Campo Grande rodava para fazer a viagem de volta. Mas a praia da Pedra, assim como toda a Baía de Sepetiba, infelizmente é poluída, um cenário bem diferente de algumas décadas atrás, quando a região era um balneário carioca, frequentado por milhares de pessoas no verão. A luta pela recuperação do meio ambiente tem mobilizado setores da sociedade local, inclusive as Mulheres de Pedra.

Para quem quiser conhecer este belo trabalho, no próximo sábado, dia 11, acontece no centro de convivência o Sarau-ato Afeto que Afeta, com a presença do Madalenas Rio, movimento de mulheres que faz parte do Centro de Teatro do Oprimido e que discute o machismo e a violência que as mulheres sofrem diariamente – nada mais atual, ainda mais após a repercussão do estupro sofrido pela jovem na Praça Seca recentemente e que gerou um amplo debate sobre a cultura do estupro. Para encerrar o espetáculo, a performance “Bela, recatada e do lar”, outra referência bem atual, desta vez sobre o título da matéria da revista Veja sobre a esposa do presidente interino, Michel Temer, Marcela Temer. Como sempre acontece nos eventos do Mulheres de Pedra, os microfones ficarão abertos para quem quiser se manifestar.

Andre Luis Mansur

Jornalista e escritor, tendo passado por veículos como Tribuna da Imprensa, Jornal do Brasil e O Globo, onde publicou mais de cem críticas literárias. Tem nove livros publicados, a maioria sobre a história da cidade do Rio de Janeiro, como “O Velho Oeste Carioca”, “Fragmentos do Rio Antigo” e “Marechal Hermes – a história de um bairro”. Vive na zona oeste do Rio de Janeiro, no bairro de Campo Grande.

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