ONGs criticam indicação de novo ministro

Em seu blog, durante a campanha eleitoral, Ricardo Salles pregou tolerância zero: “Agora é a hora de agir. Vamos mostrar que você não aguenta mais essa cambada de maconheiro baba-ovo de bandido”.Foto Reprodução Facebook Endireita Brasil

Investigado por fraude ambiental, Ricardo Salles recebeu apoio de ruralistas e da Fiesp

Por Agostinho Vieira | ODS 14ODS 8 • Publicada em 10 de dezembro de 2018 - 00:04 • Atualizada em 10 de dezembro de 2018 - 00:44

Em seu blog, durante a campanha eleitoral, Ricardo Salles pregou tolerância zero: “Agora é a hora de agir. Vamos mostrar que você não aguenta mais essa cambada de maconheiro baba-ovo de bandido”.Foto Reprodução Facebook Endireita Brasil
Em seu blog, durante a campanha eleitoral, Ricardo Salles pregou tolerância zero: “Agora é a hora de agir. Vamos mostrar que você não aguenta mais essa cambada de maconheiro baba-ovo de bandido".Foto Reprodução Facebook Endireita Brasil
Em seu blog, na campanha eleitoral, Ricardo Salles pregou tolerância zero: “Agora é a hora de agir. Vamos mostrar que você não aguenta mais essa cambada de maconheiro baba-ovo de bandido”. Foto Reprodução Facebook Endireita Brasil

Justiça seja feita. Ninguém pode dizer que foi pego de surpresa. Depois das muitas idas e vindas em torno da fusão dos ministérios da Agricultura com o Meio Ambiente, das críticas ao que classifica como “indústria das multas ambientais” e do costumeiro desdém com que trata do aquecimento global, o presidente eleito Jair Bolsonaro confirmou o nome do advogado Ricardo Salles como novo Ministro do Meio Ambiente. Salles, último indicado para o ministério, não chega ao posto pelo seu conhecimento técnico da área, trabalhos publicados ou realizações anteriores, mas pelo alinhamento ideológico com o presidente e o apoio que recebeu de entidades como a Sociedade Rural Brasileira (SRB), a União da Agroindústria Canavieira (Única) e a Fiesp.

Presta atenção. O Bolsonaro não foi multado por pescar. Ele foi multado porque estava com uma vara de pesca. O fiscal presumiu que ele estava pescando. Então, veja bem, este exemplo já mostra como a questão ideológica permeia a atuação estatal nesses casos. É preciso ter muito equilíbrio antes de rotular

O futuro ministro é alvo de uma ação por improbidade administrativa, acusado de manipular mapas de manejo ambiental do rio Tietê, em São Paulo, quando foi secretário de Meio Ambiente do Governo Geraldo Alckmin (2016-2017). Nas últimas eleições, Ricardo Salles foi candidato a deputado federal pelo Partido Novo, mas não se elegeu. Durante a campanha chegou a sugerir o uso de munição de fuzil contra os representantes do MST e da esquerda.  Em seu blog, ainda no 1º turno, escreveu: “Agora é a hora de agir. Vamos mostrar que você não aguenta mais essa cambada de maconheiro baba-ovo de bandido. Já deu o que tinha que dar. #tolerânciazero”.

Ricardo Salles, novo ministro do Meio Ambiente. Foto Governo de São Paulo
Ricardo Salles, novo ministro do Meio Ambiente. Foto Governo de São Paulo

ONGs ligadas ao meio ambiente criticaram fortemente a indicação do novo ministro. Para Marcio Astrini, coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil, “a principal função do novo ministro será a promoção de uma verdadeira agenda contra o meio ambiente, colocando em prática medidas que vão resultar na explosão do desmatamento na Amazônia e na diminuição do combate ao crime ambiental. O que já está ruim, pode piorar”. Em nota, o Observatório do Clima segue na mesma linha e diz que “Se por um lado, a indicação contorna o desgaste que o governo poderia ter com a extinção formal da pasta, por outro garante que o Ministério do Meio Ambiente deixará de ser, pela primeira vez desde sua criação, em 1992, uma estrutura independente na Esplanada. Seu ministro será um ajudante de ordens da ministra da Agricultura. O ruralismo ideológico, assim, compromete o agronegócio moderno – que vai pagar o preço quando mercados se fecharem para nossas commodities“.

O WWF Brasil foi mais comedido e preferiu ressaltar o papel imprescindível do MMA na redução do desmatamento. Segundo o seu diretor executivo, Maurício Voivodic, “é essencial que o ministério tenha capacidade de dialogar com os diversos setores da sociedade, uma vez que o direito a um meio ambiente saudável se aplica a todos, desta e das futuras gerações”. Já a ex-ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, disse que não conhece o trabalho de Ricardo Salles, mas ressaltou que o ministério não pode ficar refém de achismos: “A política ambiental brasileira é reconhecida em todo o mundo. Espero que ele não se submeta aos velhos interesses da Esplanada e que tenha autonomia política para não apequenar a trajetória ambiental do Brasil”.

A nomeação de Salles ocorre no momento em que a área ambiental recebe uma série de más notícias. O desmatamento da Amazônia registrou o maior índice dos últimos dez anos e o país acaba de retirar sua candidatura para sediar a COP-25. Além disso, o futuro Ministro das relações exteriores, Ernesto Araújo, assumiu publicamente que não acredita na existência das mudanças climáticas. O próprio presidente eleito já admitiu que pode retirar o Brasil do Acordo de Paris, assinado em 2015 por mais de 190 países, e que prevê a limitação do aquecimento global a 2ºC.

Material de campanha do então candidato a deputado federal Ricardo Salles. Reprodução Facebook
Material de campanha do então candidato a deputado federal Ricardo Salles. Reprodução Facebook

Em sua primeira entrevista após a indicação, Ricardo Salles disse ao jornal Folha de S. Paulo que a discussão sobre o aquecimento global é secundária e criticou o que chama de trabalho ideológico de órgãos ambientais como o Ibama. Fundador do Movimento Endireita Brasil (MEB), Salles deu uma interpretação curiosa para a multa por pesca ilegal recebida por Bolsonaro, em 2012, em uma reserva em Angra dos Reis: “Presta atenção. Ele não foi multado por pescar. Ele foi multado porque estava com uma vara de pesca. O fiscal presumiu que ele estava pescando. Então, veja bem, este exemplo já mostra como a questão ideológica permeia a atuação estatal nesses casos. É preciso ter muito equilíbrio antes de rotular”.

Agostinho Vieira

Formado em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Foi repórter de Cidade e de Política, editor, editor-executivo e diretor executivo do jornal O Globo. Também foi diretor do Sistema Globo de Rádio e da Rádio CBN. Ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo, em 1994, e dois prêmios da Society of Newspaper Design, em 1998 e 1999. Tem pós-graduação em Gestão de Negócios pelo Insead (Instituto Europeu de Administração de Negócios) e em Gestão Ambiental pela Coppe/UFRJ. É um dos criadores do Projeto #Colabora.

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