Black Friday, o dia do consumo inconsciente?

Anúncio do ‘Black Friday’ em uma loja na Oxford Street, em Londres. Foto Tolga Akmen/AFP

Vídeos com consumidores fazendo loucuras em liquidações viralizam e deixam a dúvida: é possível comprar com responsabilidade nesta data?

Por Valquiria Daher | ODS 12 • Publicada em 29 de novembro de 2019 - 16:25 • Atualizada em 21 de novembro de 2022 - 15:40

Anúncio do ‘Black Friday’ em uma loja na Oxford Street, em Londres. Foto Tolga Akmen/AFP

Basta clicar na hashtag #BlackFriday2019, um dos assuntos mais comentados do Twitter nesta sexta-feira, para se deparar com cenas assustadoras de multidões correndo com suas cestinhas de compras, gente caindo no chão, outros passando por cima até de crianças e velhinhos. Não se sabe se todos os vídeos são realmente deste 29 de novembro de 2019, mas comunicam bem o impulso de consumo que toma conta de muitos nesta época do ano. 

E pensar que até 2014 apenas 27% dos consumidores brasileiros sabiam da existência da Black Friday, típica da ressaca pós-feriado de Ação de Graças nos Estados Unidos. Hoje são 99,5% são impactados por essas liquidações, informa levantamento da plataforma Gente, da Globosat

Mas, afinal, o que move os desesperados dos vídeos que viralizaram? São boas oportunidades de compra? É o efeito de campanhas publicitárias que, só nas principais redes sociais, atingiram quase 300 milhões de pessoas no mundo em 2018, segundo o Global Digital Report? 

“Nas condições atuais, espera-se que a classe média mundial tenha quase dobrado entre 2009 e 2020, de 1,8 para 3,2 bilhões. Com isso, aumenta-se o poder de compra e, consequentemente, o consumo em excesso. Esse aumento é agravado por diversas situações, como o ‘Efeito Manada’, onde o consumidor, ao ver outras pessoas fazendo uma compra, sente-se pressionado socialmente e passa a desejar o mesmo produto”, avalia Fernanda Iwasaka, analista de Conteúdos e Metodologias do Instituto Akatu.

Comparadas por internautas aos zumbis da série “The Walking Dead”, essas pessoas teriam a opção de aproveitar a liquidação e, ao mesmo tempo, fazer compras de uma forma consciente?

LEIA MAIS: Delírios de consumo de uma Black Friday

LEIA MAIS: AR-15 na liquidação. Pegar ou largar

 “A Black Friday pode ser o momento para adquirir algo planejado ou necessário mas, por outro lado, expõe os consumidores a ofertas atraentes e constantes de produtos que podem induzi-los a consumir impulsivamente, por conta da sensação de ganho de vantagem decorrente das promoções divulgadas. Ou seja, é possível aproveitar a data de maneira consciente mas, sim, os apelos são atraentes e os consumidores devem estar atentos ao que é oferecido”, avisa Fernanda. 

Para a analista do Akatu, alguns comportamentos podem dar aquela “segurada” nos impulsos consumistas: “Reflita sobre suas necessidades e possibilidades de pagamento; se estiver em dúvida sobre uma compra, vá para casa, tome algum tempo até que a vontade passe e reflita sobre os motivos que tornam aquele item desnecessário. Essa mudança de ambiente ativa um novo lado do cérebro, que é mais racional, em comparação ao que é impulsivo e instintivo, que nos é útil em algumas situações, mas não no momento de uma compra”.

Seis perguntas para uma compra sustentável

Comprar e consumir não são sinônimos. “Não existe vida sem consumo e nem consumo sem impacto, ou seja, todas as nossas atividades geram impacto no meio ambiente, na economia, na sociedade e nas nossas vidas. Consumir conscientemente não significa deixar de consumir, mas fazê-lo de modo diferente, sem excessos, considerando toda a cadeia produtiva de um produto ou serviço e buscando melhor impacto”, explica Fernanda. O Akatu fez uma lista do impacto dos produtos mais vendidos na Black Friday.

Para ela, é preciso que o consumidor compreenda que a compra é apenas uma das etapas do ciclo de vida do produto, cuja produção demanda recursos (água e energia); mudança no uso de terra, prejudicando não só as espécies que antes ali habitavam, como também comunidades locais que dependiam dela para sua sobrevivência; emissões de gases de efeito estufa (GEE) no processamento e transporte; além da geração de resíduos que acabam indo parar em aterros. Pensando em todos esses pontos, Fernanda destaca seis perguntas que todos devemos fazer antes e depois de uma compra.

Protestantes fazem uma marcha contra o Black Friday, em Bordeaux, na França. Foto Jerome Gilles/NurPhoto
Protestantes fazem uma marcha contra o Black Friday, em Bordeaux, na França. Foto Jerome Gilles/NurPhoto

Por que comprar? Reflita se você realmente precisa comprar ou se está sendo levado por um impulso do momento. Antes, pense se você já não tem o suficiente ou se você pode, em vez de comprar, fazer uma troca, reutilizar ou pegar emprestado.

O que comprar? Pense sobre quais características do produto atenderão à sua necessidade e leve em consideração os impactos associados ao produto na hora da seleção.

Como comprar? É hora de pensar sobre as formas de pagamento e sobre a logística dessa compra. Como é melhor para você, comprar à vista ou a prazo? Como vai buscar e levar as mercadorias, de forma a ter o menor impacto negativo possível no mabiente? 

De quem comprar? Sempre que puder, acompanhe notícias de fontes confiáveis e tente descobrir informações sobre as empresas que fabricam e vendem o produto ou serviço: verifique se há cuidado no uso dos recursos naturais, se os funcionários são respeitados.

Como usar? Cuide para estender ao máximo a vida útil daquilo que você compra. Assim você evita os impactos associados à fabricação, o transporte e o descarte de outros produtos.

Como descartar? Aquilo que não tem mais utilidade para você pode ser reformado ou pode ser interessante para outra pessoa. Se isso não for mais possível, é preciso fazer um descarte adequado. Veja se o material pode ser encaminhado para a reciclagem ou se exige descarte especial.

Valquiria Daher

Formada em Jornalismo pela UFF, nasceu em São Paulo, mas cresceu na cidade do Rio de Janeiro. Foi repórter do jornal “O Dia”, ocupou várias funções no “Jornal do Brasil” e foi secretária de redação da revista de divulgação científica “Ciência Hoje”, da SBPC. Passou os últimos anos no jornal “O Globo”, onde se dedicou ao tema da Educação. Editou a Revista “Megazine”, voltada para o público jovem, e a “Revista da TV”. Hoje é Editora do Projeto #Colabora e responsável pela Agência #Colabora Marcas.

Newsletter do #Colabora

Um jeito diferente de ver e analisar as notícias da semana, além dos conteúdos dos colunistas e reportagens especiais. A gente vai até você. De graça, no seu e-mail.

Um comentário em “Black Friday, o dia do consumo inconsciente?

  1. André Pires disse:

    Parabéns pelo texto, Valquiria!

    Infelizmente vivemos numa sociedade orientada para o consumo e o brasileiro, mais do que muitos outros povos, adora uma promoção ou um desconto.

    É uma pena viver em um dos países com umas das maiores riquezas naturais do mundo e ver a sua população tão iludida, consumindo de forma desenfreada.

    A desigualdade social desenvolveu no brasileiro esse hábito ruim de comprar quando a oportunidade aparece, mesmo que não se precise. Em contrapartida, o mundo corporativo também se aproveita dessa data comemorativa americana para manipular a massa.

    Muitas empresas se dizem preocupadas com a sustentabilidade e meio ambiente mas poucas fazem realmente alguma coisa a respeito. Uma empresa de artigos esportivos chamada CURTLO parou de vender na Black Friday como forma de apoiar o consumo consciente.

    https://www.facebook.com/curtlobr/photos/a.192799467422085/2621943661174308
    https://www.instagram.com/p/B5cqZi5lbPC

    Se alguém souber de mais empresas responsáveis, postem aqui para que outras pessoas também tomem conhecimento!

    Um abraço a todos!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *