A micromobilidade avança nas cidades

Patinetes na ciclovia da Avenida Paulista: Prefeitura de São Paulo recebeu planos de 11 empresas para operar transporte (Foto: Florência Costa)

São Paulo prepara regulamentação do uso de patinetes elétricos que somam-se a bicicletas e skates como meios de transporte para pequenas distâncias

Por Florência Costa | ODS 16 • Publicada em 6 de abril de 2019 - 09:26 • Atualizada em 6 de abril de 2019 - 14:33

Patinetes na ciclovia da Avenida Paulista: Prefeitura de São Paulo recebeu planos de 11 empresas para operar transporte (Foto: Florência Costa)
Patinetes na ciclovia da Avenida Paulista: Prefeitura de São Paulo recebeu planos de 11 empresas para operar transporte (Foto: Florência Costa)
Patinetes na ciclovia da Avenida Paulista: Prefeitura de São Paulo recebeu planos de 11 empresas para operar transporte (Foto: Florência Costa)

Finzinho da tarde na Paulista. Na ciclovia da avenida mais famosa de São Paulo, bicicletas, skates, patinetes elétricos deslizam sem obstáculos, um fluxo de causar inveja aos motoristas de carros, amarrados no engarrafamento das 18h30. Na Pauliceia Desvairada, perder duas horas por dia no trânsito é normal. Talvez por isso, São Paulo tenha se transformado na capital da chamada micromobilidade do país. Em 2016, a cidade se tornou a primeira do Brasil a adotar medidas para ajudar a implementar esses serviços de transporte sob demanda no ambiente urbano.

A micromobilidade é a última tendência global na área de transportes: seu conceito inclui bicicletas e patinetes compartilhados, alimentados por bateria, e que percorrem trajetos de até 5 quilômetros.  São Paulo será uma das primeiras cidades do mundo a regulamentar oficialmente o uso de patinetes elétricos: espera-se que isso ocorra até maio. Em fevereiro, a prefeitura recebeu planos detalhados de operação desses sistemas de transporte de 11 empresas, como a própria Uber. Essas empresas pretendem colocar nas ruas da cidade uma frota de cerca de 100 mil patinetes.

Por enquanto, segundo o Departamento Nacional do Trânsito (Denatran), os patinetes devem seguir as regras relativas aos equipamentos de mobilidade com algum tipo de motorização e com dimensões de largura e comprimento iguais ou inferiores às de uma cadeira de rodas. Eles não podem rodar nas ruas, em meio a carros e motos. À princípio, estão liberados nos calçadões, calçadas e ciclovias, mas devem observar os limites de velocidade: 6 km por hora em calçadas e calçadões e 20 km por hora em ciclovias e ciclofaixas.

Os patinetes devem ainda ter indicador de velocidade, campainha, sinalização noturna dianteira, traseira e lateral. É recomendado o uso de capacetes. Hoje, o Denatran diz que cada cidade deve regulamentar se eles podem trafegar em calçadas e sobre os locais de estacionamento.

Patinetes no calçadão da Zona Sul do Rio: Serviços de compartilhamento já estão presentes em 11 capitais (Foto: Oscar Valporto)
Patinetes no calçadão da Zona Sul do Rio: Serviços de compartilhamento já estão presentes em 11 capitais (Foto: Oscar Valporto)

Serviços de compartilhamento de patinetes, que começaram a chegar no país no ano passado, já estão presentes em 10 capitais, além de São Paulo: Rio, Brasília, Goiânia, Recife, Belo Horizonte, Vitória, Curitiba, Porto Alegre e Florianópolis. São Paulo é a campeão deste tipo de serviços, com bicicletas (normais e elétricas), scooters, e patinetes elétricos.

Há um novo sistema chamado “dockless”, que caiu no gosto dos usuários:  não precisa de locais para prender as bicicletas e os patinetes.  Ou seja: não é preciso levar o veículo até uma estação.  Funciona por meio de aplicativos. O usuário se cadastra, encontra o veículo mais próximo e o desbloqueia por meio do app. Eles são recolhidos à noite para manutenção.

O mercado em São Paulo, por exemplo, é muito promissor: 53% dos 40 milhões de deslocamentos na cidade podem ser realizados com patinetes e bicicletas, segundo o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap)

Como o próprio nome indica, a micromobilidade está focada em soluções para pequenas distâncias, como trajetos entre bairros. Nas cidades brasileiras, estes deslocamentos são geralmente feitos a pé, e em condições ruins de infraestrutura e segurança.  Com isso, desafoga-se o trânsito nas regiões centrais.  O termo é bastante novo: foi utilizado pela primeira vez em 2017, durante o Tech Festival em Copenhagem. Foi aplicado para descrever veículos de transporte que pesassem menos de 500 quilos e que funcionassem com motores elétricos.

As cidades da Ásia e da América Latina – onde se prevê um imenso crescimento desses serviços – contam com transporte público precário e têm seu espaço mal distribuído. Por isso mesmo, são ideais para este nicho de transporte.  O mercado em São Paulo, por exemplo, é muito promissor: 53% dos 40 milhões de deslocamentos na cidade podem ser realizados com patinetes e bicicletas, segundo o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap).

Mas, como sempre, novidades trazem desafios. A invasão de calçadas é uma preocupação, já que o patinete não é brinquedo, apesar de parecer.  Assim, é preciso regulamentar a convivência entre pedestres, motoristas, motociclistas e quem adere a essas novas alternativas. Outro detalhe importante que precisa ser estudado é sobre onde deixar os veículos após o uso.

A micromobilidade já atraiu a atenção até de grandes montadoras de automóveis, como a GM e Ford, que já anunciaram investimentos em patinetes e bicicletas elétricas.  A Nissan, por exemplo, criou em 2014 um laboratório do futuro na Costa Oeste dos EUA para identificar e estudar oportunidades no setor de mobilidade. Rachel Nguyen, diretora desse laboratório, explica que a proliferação das megacidades nos países emergentes é um grande desafio para a indústria e a mobilidade é uma questão central para o desenvolvimento delas.

Em São Paulo, por exemplo, 80% do espaço das ruas é destinado aos automóveis. A pergunta que fica no ar é: se o fenômeno da micromobilidade ajudará as cidades brasileiras a distribuir melhor seus espaços viários e a criar uma infraestrutura apropriada, já que este tipo de solução  –  que tem como resultado diminuir o número de carros nas ruas –  busca melhorar o deslocamento de todos, além de melhorar a qualidade de ar. Veremos.

Florência Costa

Jornalista freelance especializada em cobertura internacional e política. Foi correspondente na Rússia do Jornal do Brasil e do serviço brasileiro da BBC. Em 2006 mudou-se para a Índia e foi correspondente do jornal O Globo. É autora do livro "Os indianos" (Editora Contexto) e colaboradora, no Brasil, do website The Wire, com sede na Índia (https://thewire.in/).

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3 comentários “A micromobilidade avança nas cidades

  1. Paul disse:

    Perfeito! Imagina uma cidade sem carros onde tudo mundo anda tranquilamente. De repente soltam milhares de carros. A tranquilidade some imediatamente e causa muitos acidentes fatais. O impacto de soltar milhares de patinetes e infinitamente menor!!

  2. Isabela Saramago disse:

    Toda mobilidade não motorizada é bem vinda. Mas para que seja segura deverá ser regulamentada. Já vi vários acidentes com os patinetes na Orla aqui em Ipanema como também na ciclovia da Lagoa Rodrigo de Freitas. Eles andam numa velocidade absurda sem nenhum alerta sonoro para avisar os pedestres. Além da ausência de equipamentos seguros como capacetes, protetor para os cotovelos e joelhos. O patinete é muito frágil.

  3. André P. disse:

    Creio que o maior obstáculo para o sucesso está no aspecto cultural. Se entendermos que patinete não é uma moto para costurar em meio ao transito ou exceder velocidade em calçadas, os riscos certamente serão reduzidos. O mesmo para bikes, skates e afins.
    Trabalho do Estado junto a essas empresas pode trazer boas soluções ao caos de nossas metrópoles.

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