Câmara aprova projeto que fragiliza proteção ambiental em áreas urbanas

Trecho do Rio Capibaribe, no Recife: Câmara aprova proposta que transfere ao município responsabilidade de definir ocupações às margens de rios e outras Áreas de Preservação Permanente (Foto: Victor Moura – 15/06/2021)

Ambientalistas e deputados criticam proposta que transfere para municípios atribuição de definir as ocupações de Áreas de Preservação Permanente (APP)

Por #Colabora | ODS 11ODS 15 • Publicada em 27 de agosto de 2021 - 10:13 • Atualizada em 31 de agosto de 2021 - 08:52

Trecho do Rio Capibaribe, no Recife: Câmara aprova proposta que transfere ao município responsabilidade de definir ocupações às margens de rios e outras Áreas de Preservação Permanente (Foto: Victor Moura – 15/06/2021)

A Câmara dos Deputados aprovou nesta quinta-feira (26/08) projeto de lei que altera o Código Florestal e transfere para os municípios a atribuição de definir as ocupações de Áreas de Preservação Permanente (APPs) em áreas urbanas. A nova boiada antiambiental foi aprovado por 314 votos a favor e 140 contrários, sob protestos da oposição e de ambientalistas, e todos os destaques que tentavam estabelecer alguma regra de proteção foram rejeitados.

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De acordo com nota técnica do Instituto Sociambiental, divulgada na semana anterior quando os deputados aprovaram a urgência para o PL 2510/2018, o projeto faz parte de um pacote de mudanças para alterar o Código Florestal e, neste caso, reduzir as Áreas de Preservação Permanente que “são fundamentais para o controle de inundações, assoreamento, erosão e poluição, além de garantir a qualidade e a quantidade dos mananciais de água”.

Atualmente, o Código Florestal fixa faixas marginais que variam de 30 a 500 metros conforme a largura dos rios, considerando-as Áreas de Preservação Permanente. A proposta aprovada permite que os municípios estabeleçam faixas de proteção diferentes em áreas consolidadas urbanas, que já contam com edificações, sistema viário, loteamento e equipamentos de infraestrutura urbana.

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Os oposicionistas alertaram sobre o aumento de enchentes, inundações e outros desastres naturais que podem ser provocados pela ocupação das áreas de proteção permanente. O deputado Nilto Tatto (PT-SP) afirmou que a proposta pode configurar “estímulo à ocupação” das APAs urbanas, que já sofrem com ocupações irregulares. “Essas áreas têm um papel fundamental para a proteção ambiental, para a proteção da água, para evitar catástrofes ambientais como desmoronamentos, que têm aumentado e ocorrido com frequência nas cidades”, destacou o parlamentar, ex-presidente da Comissão de Meio Ambiente.

Para o deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP), coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, é necessário estabelecer áreas de preservação mínimas em áreas que ainda não foram ocupadas a fim de evitar a degradação futura. “Eu sou um deputado municipalista, mas nós temos que defender uma faixa mínima. A Lei de Parcelamento do Solo Urbano fala em 15 metros, o Código Florestal fala em 30 metros, e aqui, hoje, nós estamos deixando sem nenhuma faixa mínima. O texto chega a avançar e dizer que, para as ferrovias, são 15 metros, mas, para as faixas hídricas, para as nascentes, para as margens de córregos, nada!”, discursou Agostinho.

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Líder da Minoria, deputado Marcelo Freixo (PSB-RJ) disse que a proposta vai “inviabilizar a questão ambiental” nas áreas urbanas. “A lei de um município será diferente daquela do vizinho sobre o mesmo rio. É o projeto da ganância. O Brasil já está sofrendo sanções econômicas internacionais pela questão ambiental e esse projeto contribui para uma péssima visão sobre o nosso país”, declarou.

O plenário da Câmara rejeitou cinco emendas de deputados da oposição que queriam preservar faixas mínimas de proteção, restaurar a vegetação nativa ou alterar a data-limite de regularização de casas. O deputado Ivan Valente (Psol-SP) acusou a proposta de entregar a legislação ambiental para especulação imobiliária. “A pressão do poder econômico por áreas valorizadas é enorme e pode provocar desastres ambientais com enchentes”, alertou. “Não podemos permitir que os municípios estabeleçam as condições de áreas de proteção permanente.”

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A deputada Erika Kokay (PT-DF) afirmou que, ao transferir a responsabilidade sobre as Áreas de Preservação Permanente para os municípios, a proposta desrespeita o meio ambiente. “Se houvesse preocupação em flexibilizar a ocupação de áreas urbanas consolidadas, a proposta deveria observar o interesse público e social, recuperação ambiental e condições técnicas para moradias seguras”.

De acordo com o Código Florestal, as APPs têm a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, além de proteger o solo e assegurar o bem-estar das população. “As APPs possuem funções ecológicas essencialíssimas para a garantia do meio ambiente ecologicamente equilibrado, sendo certo que novos desmatamentos nessas áreas podem repercutir gravemente sobre os serviços ecossistêmicos prestados pela vegetação nativa”, frisa a nota técnica do ISA, divulgada dia 17/08.

Com a aprovação, o projeto de lei da Câmara será enviado ao Senado onde está na pauta projeto semelhante, o PL 1869/2021, que teve sua votação adiada pela segunda vez pela resistência de muitos senadores à proposta, que também atribui aos municípios o dever de regulamentar as faixas de restrição à beira de rios, córregos, lagos e lagoas nos seus limites urbanos, além de abrir caminho para regularizar construções que já existam nessas áreas.

#Colabora

Texto produzido pelos jornalistas da redação do #Colabora, um portal de notícias independente que aposta numa visão de sustentabilidade muito além do meio ambiente.

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