#RioéRua: a vitalidade do beco

História com gastronomia no ponto dos barbeiros do Brasil Colônia

Por Oscar Valporto | ODS 11 • Publicada em 5 de março de 2018 - 08:08 • Atualizada em 5 de março de 2018 - 13:42

O Beco dos Barbeiros ganhou o nome ainda no período colonial pelos especialistas em barba, cabelo e bigode que, naquela época, se instalaram por ali. Foto Oscar Valporto
O Beco dos Barbeiros ganhou o nome ainda no período colonial pelos especialistas em barba, cabelo e bigode que, naquela época, se instalaram por ali. Foto Oscar Valporto
O Beco dos Barbeiros ganhou o nome ainda no período colonial pelos especialistas em barba, cabelo e bigode que, naquela época, se instalaram por ali. Foto Oscar Valporto

Rua escura, estreita e curta – às vezes, sem saída: esta é a definição de beco no Aurélio, um tipo de logradouro bem comum até o século XIX, que foi desaparecendo com a modernização da cidade. No Centro, registravam-se, até a chegada do século XX, mais de 30 logradouros com nome oficial de beco. A Rua Mayrink Veiga, perto da Praça Mauá, era o Beco de Santa Rita; a vizinha Alcântara Machado era o Beco dos Cachorros; a Teotônio Regatas, na movimentada Lapa, era o Beco da Alegria; a Travessa do Comércio, ainda hoje conhecida como Arco do Telles, era o Beco do Telles. Outras dessas passagens estreitas e curtas acabaram desaparecendo com as sucessivas reformas urbanas.

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Quase dois séculos depois, promoveram o beco à Travessa Onze de Agosto, homenagem ao dia da criação dos cursos jurídicos, mas, em 1965, a tradição venceu e o Beco dos Barbeiros voltou ao nome histórico. E segue esbanjando vitalidade

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Neste século XXI, os becos mais famosos da cidade não têm oficialmente o nome nem se enquadram na definição clássica. O Beco das Sardinhas nada tem de beco: é um trecho, nada estreito, da Rua Miguel Couto dominado pelos bares que servem essa iguaria, ali apelidada de frango marítimo, com mesas pela generosa calçada. O Beco das Garrafas – estreito, curto e sem saída – é apenas a lateral comercial de um prédio residencial na Rua Duvivier, em Copacabana, um espaço tornado famoso pelos shows da Bossa Nova, há mais de 50 anos. Até hoje, duas pequenas boates – Bottles e Little – cultivam o gênero e a boa música brasileira no beco que ganhou o apelido porque moradores vizinhos, incomodados com o barulho, jogavam garrafas sobre os boêmios.

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Sobraram, pelo Centro, poucos becos clássicos como o Beco do Bragança entre a Rua da Candelária e a da Quitanda ou o Beco das Cancelas, um estreitamento da Rua do Carmo, entre Rosário e Buenos Aires. O mais movimentado, sem dúvida, é o Beco – escuro, estreito e curto – dos Barbeiros, viela na lateral da Igreja do Carmo, ligando a pedestre Rua do Carmo à barulhenta Primeiro de Março. Ganhou o nome ainda no período colonial pelos profissionais especialistas em barba, cabelo e bigode que, naquela época, ainda arrancavam dentes, e por ali se instalaram depois da construção da nova igreja em meados do século XIX. Quase dois séculos depois, promoveram o beco à Travessa Onze de Agosto, homenagem ao dia da criação dos cursos jurídicos, mas, em 1965, a tradição venceu e o Beco dos Barbeiros voltou ao nome histórico. E segue esbanjando vitalidade.

São menos de 100 passos para atravessar o beco, mas, de uma ponta à outra, são cinco bocas de cerveja. A ruela vai do Mundo Edeal – assim mesmo com E – do português Manoel Durão, que serve comida tradicional e honesta na esquina da rua do Carmo até o Mix, restaurante a quilo, tocado por família oriental, na esquina da Primeiro de Março; no caminho, passa-se por A Travessa, que tem restaurante no nome, mas é um botequim de poucas atrações, fundado na época em que o beco tinha sido promovido. Passa-se ainda pelo Beco do Hamburguer, hamburgueria moderninha em busca da fama. Mas o principal responsável pelo movimento no lugar é o setentão Escondidinho, estabelecido no beco desde 1947 e referência para os amantes da boa mesa de todas as partes da cidade.

O restaurante – aberto por uma mineira e um português e tocado agora pelos seus descendentes – tem atrações diversas da nossa culinária, espalhadas pela semana: frango com quiabo, rabada com polenta, moqueca à baiana. Mas o prato que dá fama à casa é a costela bovina, cozida por horas na panela o que lhe dá sabor diferente – nem melhor nem pior – do que as famosas costelas ao bafo do Cachambeer ou do Zinho Beer. Na minha última visita, pouco antes do Carnaval, a estrela do beco veio bem acompanhada de agrião, aipim e cerveja gelada. E, depois desta experiência, deixa-se o Escondidinho com a sensação de que a vida carioca é boa, mesmo que haja momentos em que pareça escura, estreita e curta – às vezes, sem saída. #RioéRua

Oscar Valporto

Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade

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Um comentário em “#RioéRua: a vitalidade do beco

  1. Juliano Borges disse:

    Ótimo texto. Faltou lembrar do Beco do Rato, entre a Lapa e a Glória, onde viveu Manuel Bandeira, lugar de intensa efervescência cultural e boêmia.

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