Corte de verbas prejudica crescimento

Pesquisador de Stanford diz que o salário do trabalhador no Brasil poderia ser até 30% maior se houvesse um investimento consistente em educação

Por Agostinho Vieira | ODS 4 • Publicada em 15 de maio de 2019 - 16:33 • Atualizada em 4 de abril de 2020 - 13:05

Estudantes e professores lotam a Avenida Paulista em protesto contra os cortes de verbas da educação. Foto Nelson Almeida/AFP

Enunciado do problema: “Um professor da Universidade de Stanford gastou 2.700 dólares na compra de uma passagem de avião de São Francisco, na Califórnia, até o Rio de Janeiro. Quanto custaria essa passagem, em euros, considerando que 1 euro equivale a 1,5 dólar?”. De acordo com o professor Eric Hanushek, doutor em economia pelo MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) e personagem da história, nada menos que 64% dos estudantes brasileiros com 15 anos de idade não têm condições hoje de resolver questões semelhantes a esta.

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Existe uma relação clara entre os anos de escolaridade, a qualidade do ensino e o crescimento do país. Se considerarmos os resultados do PISA, o Brasil vem ocupando as últimas posições há muitos. Se o país alcançasse o mesmo índice de desempenho do México, que é apenas um pouco melhor, o PIB per capita seria 5,6% maior e os trabalhadores brasileiros ganhariam, em média, cerca de 11% a mais

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No dia em que professores e estudantes lotaram as ruas do país para protestar contra o cortes de verbas para a educação, Eric Hanushek foi um dos convidados a falar na Reunião Magna 2019 da Academia Brasileira de Ciências, que acontece esta semana no Museu de Amanhã e tem como foco principal os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODSs). Especialista em temas que ligam análises econômicas e educação, o pesquisador criticou a recente decisão do governo brasileiro de cortar verbas das universidades, de pesquisas acadêmicas e de várias outras áreas do ensino no Brasil. Para ele, com isso, o país perde a oportunidade de ver um crescimento maior do PIB (Produto Interno Bruto) e do salário médio dos trabalhadores.

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“Existe uma relação clara entre os anos de escolaridade, a qualidade do ensino e o crescimento do país. Isso vale para o Brasil, para os Estados Unidos e qualquer outra nação. Se considerarmos os resultados do PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos), coordenado pela OCDE, o Brasil vem ocupando as últimas posições há muitos. Se o país alcançasse o mesmo índice de desempenho do México, que é apenas um pouco melhor, o PIB per capita seria 5,6% maior e os trabalhadores brasileiros ganhariam, em média, cerca de 11% a mais”.

O professor Eric Hanushek explica, em palestra no Museu do Amanhã, porque o Brasil não pode parar de investir em educação. Foto Agostinho Vieira

Para Hanushek, dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, dois podem ser considerados os mais importantes, pois depende deles a realização de todos os demais. Seriam o ODS 8 (Trabalho Digno e Crescimento Econômico) e o ODS 4 (Educação de Qualidade): “Sem melhorar as escolas, não alcançaremos o crescimento e não chegaremos aos outros objetivos”. O professor de Stanford elogiou muito o trabalho que vem sendo feito na área de educação no Ceará. Inspirado nessa experiência, ele recomendou que os governos devem seguir três prioridades na hora de fazer qualquer investimento em educação: “O primeiro deles é melhorar a qualidade do trabalho do professor, o segundo é melhorar a qualidade do trabalho do professor e o terceiro, sem dúvida, é melhorar a qualidade do trabalho do professor”, brincou, antes de falar sério: “Não há nada mais importante do que investir na qualificação do professor”.

Rede estadual do Ceará: investimento em escolas de tempo integral (foto Rosane Gurgel/Seduc/CE)

Além das comparações que fez com os resultados do México nas provas da OCDE, Hanushek mostrou cálculos que consideravam os benefícios que uma educação de mais qualidade traria para a economia brasileira. O primeiro cenário levava em conta apenas a possibilidade de todos os brasileiros de 15 anos de idade estarem matriculados em uma escola, mesmo que o desempenho não melhorasse. Se isso viesse a acontecer, o crescimento do PIB per capita já seria de 3,5%. Se todos estivessem na escola e, além disso, alcançassem o nível mínimo de qualidade de 420 pontos no PISA, o PIB per capita cresceria 16% e o salário dos trabalhadores poderia ter um ganho fantástico de 30%. Hoje, o máximo que o Brasil consegue são 407 pontos em leitura, 401 em ciências e 377 em matemática.

O pesquisador concluiu a sua palestra com uma mensagem de otimismo e uma advertência: “O foco fiscal e previdenciário de vários países, inclusive do Brasil, não pode significar uma negligência com o futuro”. E repetiu: “Não haverá crescimento sem investimento em educação de qualidade”. Para ele, sempre é possível melhorar, mesmo quando os recursos são poucos. E o compromisso precisa ser contínuo. Por fim, se você ainda não conseguiu resolver o problema do início do texto, saiba que a passagem custaria  1.800 Euros. #100diasdebalbúrdiafederal.

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3/100 A série #100diasdebalbúrdiafederal pretende mostrar, durante esse período, a importância  das instituições federais e de sua produção acadêmica para o desenvolvimento do Brasil.

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Agostinho Vieira

Formado em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Foi repórter de Cidade e de Política, editor, editor-executivo e diretor executivo do jornal O Globo. Também foi diretor do Sistema Globo de Rádio e da Rádio CBN. Ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo, em 1994, e dois prêmios da Society of Newspaper Design, em 1998 e 1999. Tem pós-graduação em Gestão de Negócios pelo Insead (Instituto Europeu de Administração de Negócios) e em Gestão Ambiental pela Coppe/UFRJ. É um dos criadores do Projeto #Colabora.

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