Antagonismos à parte, ambientalistas e militares juntos contra crise climática

Floresta Amazônica em chamas: Centro Soberania e Clima junta militares e ambientalistas pela Amazônia e contra crise climática (Foto: Bruno Kelly/Amazônia Real – 11/08/2020)

Centro de Soberania e Clima, criado para discutir o Brasil como potência ambiental, quer aproximar comunidades do ambiente e da defesa

Por Liana Melo | ODS 13 • Publicada em 17 de agosto de 2022 - 09:09 • Atualizada em 29 de novembro de 2023 - 10:22

Floresta Amazônica em chamas: Centro Soberania e Clima junta militares e ambientalistas pela Amazônia e contra crise climática (Foto: Bruno Kelly/Amazônia Real – 11/08/2020)

Mudar a rota de destruição que paira sob a Amazônia, que associa inação e ação deliberada do atual governo a favor do desmatamento, levou um grupo de brasileiros, aparentemente de campos políticos opostos, a se juntarem, sentarem à mesma mesa e, depois de um ano e duas dúzias de seminários temáticos, criarem o Centro de Soberania e Clima (CSC) – um think tank capitaneado por um ex-ministro da Defesa, Raul Jungmann, um general da reserva, o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional Sérgio Etchegoyen, e um ex-diretor do Greenpeace, Marcelo Furtado. É um esforço pioneiro no Brasil colocar na mesma mesa ativistas do meio ambiente e da defesa e soberania. Havia um temor que não desse certo, mas deu “match”.

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“Se a gente olhar o Brasil com os desafios e as oportunidades que temos e pela potência ambiental que somos, como podemos ler a soberania?”, questiona Marcelo Furtado, cofundador, membro do Conselho de Administração e diretor técnico do CSC.  A pergunta norteou os debates que antecederam à criação da entidade, que culminou com o documento “Conexões e diálogos para convergir”. Com o início da campanha eleitoral de 2022, o texto será entregue aos candidatos à presidência da República e a parlamentares do Congresso Nacional. Participaram dos seminários cerca de 50 especialistas nos setores do clima, da soberania, da política, da diplomacia, da economia, da ciência e dos direitos humanos.

O documento defende que é fundamental uma articulação entre diferentes atores nacionais e internacionais, estatais e não estatais. Prega ainda um debate plural sobre como “construir uma governança climática capaz de superar a crise ambiental atual sem renunciar aos interesses nacionais: direitos humanos, justiça social, desenvolvimento sustentável, segurança e soberania”.

Se é verdade que soberania e mudanças climáticas são, muitas vezes, tratadas como questões separadas, isoladas e até antagônicas; a urgência no enfrentamento da crise climática e na interrupção da escala de desmatamento na Amazônia se transformaram, no último ano, em uma oportunidade para construir pontes e ampliar o diálogo em relação à soberania da Amazônia.

Com os dados de alerta do Deter-B do mês de julho último, o sistema de detecção de desmatamento em tempo real do Inpe, já é possível estimar a área acumulada de alertas na Amazônia em 2022: 8.590 km2. É a terceira maior alta da série histórica iniciada em 2015, e todos os recordes ocorreram no governo Bolsonaro. Só em julho, a área de alertas de desmatamento atingiu 1.487 km2, o equivalente ao tamanho da cidade de São Paulo.

Uma vez que o país é detentor de cerca de 15% a 20% da biodiversidade global, o que o coloca o Brasil no centro da discussão sobre governança global climática e ambiental, a destruição sistemática da Amazônia durante o governo Bolsonaro vem abalando a reputação do país.

“Em termos ambientais nós somos uma superpotência e temos que assumir isso, que nós somos decisivos e que não se monta o tabuleiro na área ambiental sem a presença do Brasil”, sintetiza Raul Jungmann, presidente do CSC, em uma das frases pinçadas do documento.

O pensamento de Jungmann teve o apoio do presidente do Conselho de Administração do CSC, Sergio Etchegoyen: “Temos que entender como conciliar os nossos interesses, a nossa soberania e a questão ambiental em benefício da nossa sociedade”. Juntar os militares nessa discussão não é tarefa fácil, dado que as Forças Armadas falharam na tarefa de conter o desmatamento. A ação da Força Nacional de Segurança na Amazônia foi alvo de críticas severas de ambientalistas, que enxergaram na ação promovida pelo governo Bolsonaro uma iniciativa fracassada, especialmente porque implementada sem nenhuma coordenação com os órgãos de fiscalização ambiental.

Para Furtado, seria um equívoco transformar a soberania em uma moeda de troca, já que na visão dos membros do CSC, ela é uma ferramenta necessária para garantir a sobrevivência das sociedades como as conhecemos: “Seria um erro transformar a mudança climática em uma questão de segurança”.

Liana Melo

Formada em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Especializada em Economia e Meio Ambiente, trabalhou nos jornais “Folha de S.Paulo”, “O Globo”, “Jornal do Brasil”, “O Dia” e na revista “IstoÉ”. Ganhou o 5º Prêmio Imprensa Embratel com a série de reportagens “Máfia dos fiscais”, publicada pela “IstoÉ”. Tem MBA em Responsabilidade Social e Terceiro Setor pela Faculdade de Economia da UFRJ. Foi editora do “Blog Verde”, sobre notícias ambientais no jornal “O Globo”, e da revista “Amanhã”, no mesmo jornal – uma publicação semanal sobre sustentabilidade. Atualmente é repórter e editora do Projeto #Colabora.

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