‘Startups influenciam grandes empresas’

Egon Barbosa adota o lema dos millennials: “Melhor para mim, melhor para o mundo” Foto: Mirian Fichtner/Coca-Cola Brasil

Diretor da Coca-Cola Brasil fala da influência de valores de novas gerações para a transformação do mundo dos negócios

Por Helena Celestino | Conteúdo de marca • Publicada em 7 de março de 2017 - 21:04 • Atualizada em 18 de março de 2020 - 17:54

Egon Barbosa adota o lema dos millennials: “Melhor para mim, melhor para o mundo” Foto: Mirian Fichtner/Coca-Cola Brasil

(Conteúdo publicado originalmente no Coca-Cola JourneyNa porta de vidro da sala de Egon Barbosa estão rabiscados alguns grandes temas da sociedade contemporânea, aqueles que já se traduziram em mudanças de comportamento e, claro, criaram novos desejos de consumo. São cinco, e o primeiro deles é, talvez, o mais forte: “Better for me and better for the world” (melhor para mim e melhor para o mundo), uma síntese da preocupação dos millennials com a saúde e os valores, o que na vida cotidiana significa, por exemplo, maior consumo de orgânicos e atenção ao jeito de ser e de produzir das empresas. Com sua equipe, Egon, de 46 anos, diretor de Emerging Business, criou cinco palavras de ordem e grafitou todas elas no vidro, para que conduzam o perfil das inovações que a Coca-Cola Brasil deve prospectar junto a startups e que, eventualmente, podem evoluir para novos negócios.

Nesta entrevista, Egon fala sobre criatividade, inovação e novos negócios. E conta um pouco da sua história e de seus projetos pessoais para daqui a cinco anos.

Quando a gente pensa em inovação ou negócios emergentes, vêm à cabeça as startups. Como é possível criar um ambiente de startup numa empresa tradicional como a Coca-Cola Brasil?

Quando associamos uma grande empresa a uma startup com ideias revolucionárias, temos um match perfeito.

Egon Barbosa: Este é o desafio e também a nossa missão. Reconhecemos que uma empresa grande como a nossa não consegue fazer todas as inovações na mesma intensidade em que ocorrem as mudanças sociais. Por isso vamos beber na fonte das startups, dos empreendedores individuais. Não podemos vestir uma roupinha de startup e dizer: “Pronto, agora sou assim”. Não vai funcionar. É necessária uma mudança genuína. Mas podemos nos conectar com uma dessas empresas e obter o melhor dos dois mundos. Uma startup pode trazer para a vida o que chamamos de mínimo produto viável: eventualmente ainda tosco, mas comercializável – e fundamentalmente disruptivo –, algo novo que uma grande empresa não consegue pensar da mesma forma. Por outro lado, a startup não consegue produzir em escala. Quando associamos uma grande empresa a uma startup com ideias revolucionárias, temos um match perfeito. Algumas dessas não querem ser compradas. Isso é muito legal. Mas como resolver o impasse? Nós optamos por um modelo de ecossistema, no qual nos relacionamos com as startups, investidores, universidades, agências de informação, entidades de fomento e fornecedores numa colaboração conjunta, de onde surgem as grandes apostas.

Nós montamos uma incubadora. Não nos moldes tradicionais, aberta, mas essa já é uma transição para novos modelos. Ela incuba no Brasil produtos bem-sucedidos da companhia fora do Brasil.

Depois de reconhecer a ideia de um gênio, como fazer para ser aceita numa empresa cheia de certezas?

Com uma sensibilização interna sobre a contribuição dessa ideia para o negócio, o que toma tempo e requer foco e suporte das lideranças. É preciso ter a alavanca para começar; a autonomia para desenvolver e errar; a resiliência para melhorar e tentar acertar de novo; a consistência para executar; e a paciência para esperar o retorno. Nós montamos uma incubadora. Não nos moldes tradicionais, aberta, mas essa já é uma transição para novos modelos. Ela incuba no Brasil produtos bem-sucedidos da companhia fora do Brasil. O primeiro projeto é o Del Valle com pedaços de frutas, que é um refresco que traz uma experiência real de morder a bebida. Originalmente, se chamava Rani e, no Oriente Médio, vende mais do que a maioria das nossas marcas, sempre em embalagens individuais. Eu tenho uma plataforma de clientes parceiros, então uso essa força colaborativa com os parceiros-chave – como Zona Sul, AmPm, Prix, Mundial etc –, especialmente selecionados para essa jornada, para os quais distribuo esse produto e tenho a experiência real de consumo. É diferente da pesquisa, momento em que pergunto o que o consumidor está achando. Já é realidade. É megainovador? Não é, mas é uma transição, pois quebra um paradigma, ao estilo startup, com um time dedicado, focado na experiência. Isto sim é disruptivo.

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Outros exemplos?
Estamos montando uma aceleradora. Vamos identificar projetos promissores – seja produtos, capacitação comercial, experiência de marca ou projetos de valor compartilhado que se conectem com nosso negócio – e operar via startup. Acompanharemos e ajudaremos até o momento em que decidirmos juntar os negócios, quando isto fizer sentido. Faremos uma busca ativa: seja propondo aos empreendedores para virem até nós ou indo aos canais certos.

Qual o perfil dos negócios que interessam à Coca-Cola Brasil?
Negócios que levem em consideração a preocupação dos consumidores com saúde, como os que envolvem produtos funcionais, orgânicos e bebidas integrais, e que sejam deliciosos e com a cara da Coca-Cola Brasil. Procuramos produtos para um mundo cada vez mais urbano habitado por pessoas sempre com pouco tempo, que bebem no caminho para seus compromissos. Os cafés em cápsulas, por exemplo, têm comodidade. Assinatura de vinhos é outro exemplo de pura conveniência: receber as garrafas uma vez por mês, escolhidas por pessoas que entendem do assunto, e ainda pagar mais barato. A gourmetização é outra tendência. Em meio ao boom dos grandes chefs, como usar esse caminho na minha empresa? Ainda destaco duas outras tendências: “aging”, que é a experiência do envelhecimento saudável e cheio de energia; e “Indulgence beyond food and drinks”, ou seja: como a minha bebida pode trazer uma experiência além do ato de beber? A indústria automobilística, por exemplo, já faz isso. Está oferecendo experiências no lugar de carros. Em vez de comprar um carro novo, o consumidor assina a experiência de dirigir um modelo de última geração. É o conceito do carro compartilhado: você dirige um carro que não teria e, ainda por cima, não se aborrece com burocracias. Tudo isso vai vingar? Não. A minoria vai vingar, mas não importa.

Dê um exemplo de algo que deu certo…
Nossa fonte de inspiração é o modelo VEB (Venturing and Emerging Brands) da América do Norte. Este modelo foi implementado na The Coca-Cola Company há pouco mais de sete anos, e entrega resultados significativos e crescentes, ao apostar na aceleração de startups. Os projetos acelerados que viraram negócios representaram, em 2015, 25% do crescimento da companhia nos Estados Unidos, sendo 37% para bebidas não carbonatadas (sem gás). São projetos como Honest Tea, Fair Life e Core Power, que nasceram das mentes de empreendedores individuais e, hoje, integram o portfólio da empresa.

A Coca-Cola Brasil acabou de comprar também a Verde Campo. Já é o perfil ‘Better for me and better for the world’?
A Verde Campo não está inserida nesse universo das startups e dos negócios disruptivos, mas carrega valores semelhantes. A empresa fabrica produtos leves, saudáveis e gostosos. Além disso, seus fundadores têm crenças interessantes que pautam o negócio: compartilham os benefícios, os produtos são especiais e a maneira como são feitos importa. Existiam duas indústrias fortes em que a Coca-Cola Brasil não tinha relevância: café e leite. E entendemos que era importante entrar nessas categorias. Por isso lançamos o Café Leão e compramos a Verde Campo, uma boutique de produtos lácteos, uma startup já com maturidade – 300 funcionários e uma margem operacional acima da média do mercado. A missão da Coca-Cola Brasil, agora, é fazer esta joia crescer, sem perder o DNA.

A inspiração é muito importante. Paredes cinzas podem produzir ideias cinzas, mas não necessariamente paredes coloridas produzem ideias coloridas. Investir em startups é só uma forma de inovação para grandes empresas, existem outras. Mas nenhuma prescinde de um processo, de metodologia.

Uma característica das startups de tecnologia é que elas têm ambientes divertidos, coloridos, com mesa de pingue-pongue, horários e regras flexíveis. Acha isso importante para a inovação?
A inspiração é muito importante. Paredes cinzas podem produzir ideias cinzas, mas não necessariamente paredes coloridas produzem ideias coloridas. Investir em startups é só uma forma de inovação para grandes empresas, existem outras. Mas nenhuma prescinde de um processo, de metodologia. No fim das contas, estamos todos falando sobre gestão de marketing voltada para criar empreendimentos novos, olhando para as tendências da sociedade. Mas tem de ter um processo. Aquela ideia de levar o cachorro para o trabalho para fazer uma ideia acontecer é romântica. Ter uma ideia nova não é difícil, ainda mais em um mundo cheio de conexões, 20 anos depois da revolução da web. Gerar ideias é a parte mais fácil, o difícil é transformá-las em realidade. A parte mais complicada é executar bem e fazer isso ter impacto no mercado, para a empresa ou para a sociedade. Isso é inovação. Antes disso, é obra de arte – é lindo, mas não se vende, fica no acervo particular. As empresas vencedoras são aquelas que conseguem transformar ideias em realidade. Os estímulos são importantes? São, mas precisa-se de metodologia e processo. A inovação não prescinde de plano de negócios. Precisa também de suporte da organização, liberdade para errar.

Você comentou que negócios emergentes são as mais eficientes ferramentas para cometer erros rápidos e baratos. Como assim?
Se você não erra, há uma chance de você estar certo e de apresentar algo importante para o mercado. Mas claro que, em algum momento, algo pode dar errado. E se o empreendimento for grande demais, o tombo é muito grande. Por isso, é saudável errar logo no começo da jornada e aplicar esse conhecimento para fazer as escolhas certas antes de se produzir em larga escala. Ou então o investidor perderá muito dinheiro. Isso só é possível com muita experimentação e ouvindo o usuário, o cliente, o comprador, o fornecedor…

Agora, você. Como chegou a diretor de Emerging Business e por que a especialidade em inovação?
Minha mãe sempre conta uma história de quando eu tinha três anos de idade e ficava no fundo do quintal brincando com carrinhos de plásticos, fazendo túneis. Ela dizia: “Meu filho vai ser engenheiro”. Ela me achava criativo. Acho que tenho um pouco de DNA questionador. Tenho vontade de mudar a situação, mudar o ambiente, um certo inconformismo. Quando eu ainda era criança, havia uma gráfica perto da minha casa. Depois de um Dia dos Pais, pedi os cartões de parabéns que eles iam jogar fora. Guardei-os por um ano e fui vender na feira livre. Ali já estava uma veia empreendedora. O novo me fascina. Montei três negócios antes de entrar para o time da Coca-Cola Brasil. Um deles, a Backstage Marketing, uma consultoria de marketing e comunicação que ainda existe, foi a ponte para a Coca-Cola Brasil me encontrar há mais de 16 anos e me convidar para um processo seletivo. Minha primeira função foi gerenciar o portfólio de marcas na região Sul. O sonho de qualquer marqueteiro é gerenciar marcas desafiadoras como a Coca-Cola. Então troquei meus clientes por este doutorado em marcas que é trabalhar na companhia. Fui consultor e professor de cursos de empreendedorismo do Sebrae, quando as startups ainda não atendiam por este nome. O prêmio pelo esforço era ver a vida e os negócios se transformarem. Como não se apaixonar por empreendedorismo? Na Coca-Cola Brasil, passei por áreas de Brand Management, Key Accounts e integrei o time que teve a responsabilidade de montar a área de Inovação em 2009, pois a companhia entendeu que precisava acelerar o ingresso em novas alternativas para a indústria, com o objetivo de atender o consumidor. Hoje, VEB é um duplo clique de inovação dentro do nosso negócio. É a “inovação da inovação”, e soma-se aos esforços que atendem a uma estratégia única desenhada pela vice-presidência de Planejamento e Inovação. Viu? Empreender é meu sobrenome (risos).

 

COCA-COLA BRASIL

 

Helena Celestino

Jornalismo é um vício assumido, é difícil me imaginar longe da notícia. Acostumei a viver com o dedo na tomada: aprendi isto trabalhando, viajando pelo mundo e sendo por muitos anos editora executiva do Globo.

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