A iniciativa é uma parceria da ONG The Nature Conservancy (TNC), a Amazon e o World Agroforestry (ICRAF). A restauração de uma área de 18 mil hectares no sudeste e no nordeste do Pará, e na região da rodovia Transamazônica, onde vivem esses agricultores familiares, tem potencial para remover 9,6 milhões de toneladas de carbono da atmosfera em 30 anos. É com essa redução que a Amazon conta para neutralizar emissões que não podem ser eliminadas por outros meios. Sem isso, a empresa não cumpre o compromisso de se tornar carbono líquido zero até 2040.
A iniciativa é o tipo de implementação que tende a virar mantra para os países e os mercados no mundo pós-COP26. Ao deixar de ser um obstáculo para a criação de um mercado global de carbono, o Brasil, que é dono de um terço da área de floresta tropical do mundo, se credencia a ser um dos maiores receptores de recursos financeiros oriundos desse novo mecanismo de troca internacional. Só que o país vinha insistindo na ideia exdrúxula da dupla contagem: queria ter o direito de vender créditos de carbono sem ter a obrigação de reduzir suas emissões. Nas três últimas COPs, as de 2017 a 2019, o tema emperrou. Aprovado na Conferência do Clima, o mercado de carbono segue sem consenso.
[g1_quote author_name=”Emílio La Rovere” author_description=”coordenador do Centro de Estudos Integrados sobre Meio Ambiente e Mudanças Climáticas (CentroClima)” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]É um mecanismo fundamental, especialmente para o Brasil
[/g1_quote]O Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds) calcula em US$ 72 bilhões o potencial do mercado de carbono para o país em 2030. “É um mecanismo fundamental, especialmente para o Brasil”, defende Emílio La Rovere, coordenador do Centro de Estudos Integrados sobre Meio Ambiente e Mudanças Climáticas (CentroClima), da Coppe. O projeto “Acelerador de Agroflorestas e Restauração” é um exemplo de negócio que já vinha ocorrendo no mercado voluntário de carbono, onde empresas e indivíduos neutralizavam voluntariamente suas emissões de gases de efeito estufa. No último dia 13 de novembro, quando terminou a Conferência do Clima, o mercado de crédito de carbono foi regulamentado,o que permitirá que os países signatários do Acordo de Paris passem a negociar créditos de carbono.
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Veja o que já enviamos“Com a aprovação do mercado de carbono, há expectativa de ampliar o número e a escala de projetos para a redução de gases de efeito estufa com estes novos mercados”, avalia Karen Oliveira, gerente para Políticas Públicas e Relações Governamentais na TNC Brasil. Abrigando 9% da floresta tropical mundial, o Pará é uma região prioritária de conservação na Amazônia – um dos motivos que levou a TNC implementar seu projeto no estado. Sua vegetação nativa é quatro vezes o tamanho do estado de São Paulo. Rico em floresta, o Pará é também é líder em desmatamento: em 2019, respondeu por 41% de todo o desmatamento na Amazônia, e, no ano passado, por 47%.
Às vésperas da COP26, um conjunto de entidades, entre academia, ambientalistas, governo e movimentos indígenas e de jovens, incluindo o CentroClima, traçou possíveis cenários de desenvolvimento inclusivo e de baixo carbono para o país. O estudo gerou um documento, que foi apresentado em Glasgow. Lá, a defesa é de que “uma reciclagem inteligente das receitas de precificação de carbono, combinada com investimentos estratégicos e políticas públicas, pode mitigar desigualdades raciais, sociais e de gênero”.
[g1_quote author_name=”Tatiana Oliveira” author_description=”assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc)” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]Os mercados de carbono são licenças para poluir
[/g1_quote]Em oposição a essa visão, o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) foi um dos signatários da Carta de Belém, onde o mercado de carbono é visto como um “falsa solução à crise climática”. Para a assessora política do Inesc, Tatiana Oliveira, os “mercados de carbono são licenças para poluir”. E “trata-se de um incentivo para que agentes econômicos poluidores não alterem as suas condutas socioambientais degradantes e sigam poluindo como já fazem hoje”. Tatiana sustenta que “os mercados de carbono implicam trocas ecológicas desiguais, que beneficiam países e setores econômicos poluentes em detrimento das iniciativas de grupos que realmente contribuem para a conservação ambiental”. Ela cita, por exemplo, entre esses grupos os povos indígenas e as comunidades quilombolas, extrativistas, ribeirinhas e camponesas, além dos projetos agroecológicos das periferias urbanas de grandes cidades.
“Pressionamos muito para não entrar no livro de regras do Acordo de Paris os offsets florestais, que estava previsto no artigo 6.2. Conseguimos. Foi uma vitória. Mas seguimos com nossa crença. O enfrentamento da crise climática segue sendo por uma busca real de cortes de emissões. Os mecanismos de flexibilização só adiam ainda mais as medidas concretas necessárias para evitar a catástrofe climática”, critica Maureen Santos, coordenadora do Grupo Nacional de Assessoria da FASE.
Esta reportagem integra série sobre o impacto da crise climática na vida dos brasileiros, parte das comemorações dos seis anos do #Colabora, e tem o apoio da Fundação Heinrich Böll Brasil