Qual será o legado da Rio-2016?

Benefícios de longo prazo é que definirão se as Olimpíadas serão ou não sustentáveis

Por Aga Latawiec | Economia VerdeODS 14 • Publicada em 11 de março de 2016 - 08:00 • Atualizada em 2 de setembro de 2017 - 15:43

Para ser sustentável, deve se considerar os impactos de longo prazo das obras na população local. O ideal é fazer uma medição após as Olimpíadas
Olimpiadas/ Custodio Coimbra
Para ser sustentável, deve se considerar os impactos de longo prazo das obras na população local. O ideal é fazer uma medição após as Olimpíadas

Depois de viver meses em um canteiro de obras, que consumiu mais de R$ 24 bilhões em projetos que prometeram transformações na cidade, a população do Rio vai ter história de sobra para contar após a festa de encerramento das Olimpíadas 2016. Além das muitas memórias olímpicas, haverá o registro de um novo Rio. O que pode ser um prato cheio para afirmar que a passagem dos jogos foi extraordinária para a cidade. A questão é como medir o efeito real disso. Em uma análise mais rápida, que sempre agrada à política e aos investidores, não faltarão dados para contabilizar o número de postos de trabalho gerados, o aumento de renda no período dos jogos, a melhora na imagem da cidade no exterior ou mesmo a quantidade de obras realizadas. Mas fica a dúvida: o quanto essas iniciativas e intervenções foram de fato sustentáveis?

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Hoje há uma onda verde com todo o tipo de projeto vendendo sustentabilidade e é preciso saber diferenciar o que realmente trouxe desenvolvimento e/ou proteção da natureza.

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Medir a sustentabilidade de uma iniciativa é mais complexo do que parece. Um bom indicador de sustentabilidade deve mostrar a duração dos efeitos, além de abordar aspectos sociais, ecológicos e econômicos. Como nem sempre há um indicador ideal que reúna todos os pontos, muitas vezes o recomendável é usar mais de um por projeto para buscar este efeito combinado. Voltando aos jogos do Rio, se na pressão por bons resultados olharmos apenas os empregos criados e o aumento de renda proporcionado, estaríamos focando apenas em um efeito imediato.

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Em geral, achamos que um projeto foi um sucesso porque aumentou a renda das pessoas e avaliamos que isso é sustentável. Ocorre que este olhar não é suficiente. Para chamar de ‘sustentável’ precisamos saber mais.  A pergunta deveria ser: esse aumento de renda trouxe benefícios no bem-estar a longo prazo? Ou se desfez ao fim dos jogos?

Seguindo esse raciocínio, medir a quantidade, qualidade e efeito do treinamento realizado para que os profissionais brasileiros desempenhassem seus mais diversos papéis ou mesmo o desenvolvimento de novas habilidades proporcionado pelos jogos seriam, estes sim, indicadores de sustentabilidade, pois a capacitação não se perde após o último apito. Elas permanecem com o cidadão para o restante da sua vida profissional.

O mesmo pode se dizer de todos os projetos de infraestrutura. Não basta dizer que foram criados. Eles servem para depois? Para ser sustentável, deve se considerar os impactos de longo prazo das obras na população local. O ideal é fazer uma medição após as Olimpíadas. Olhar qual o efeito desse legado depois de, por exemplo, dez anos. Assim saberemos se a intervenção foi boa ou ruim em longo prazo. Mas para isso muitas vezes ou não se tem dinheiro ou não se tem interesse.

Entender esses conceitos nos deixam mais críticos. Hoje há uma onda verde com todo o tipo de projeto vendendo sustentabilidade e é preciso saber diferenciar o que realmente trouxe desenvolvimento e/ou proteção da natureza. Tudo depende do contexto no qual o projeto está inserido. Foi pensando nisso que reuni um grupo de mais de vinte pesquisadores em todo o mundo para produzir o livro “Indicadores de Sustentabilidade na Prática”, editado por mim pelo Dr. Dorice Agol (UEA), avaliando, via estudos de casos no Brasil, África e Europa, o que é de fato útil na hora de medir um projeto sustentável.

O trabalho mostra casos de uso de indicadores relacionados a diversos temas, como água, agricultura, biodiversidade, saneamento, poluição do ar, mudanças climáticas. O ponto comum e que não cansamos de afirmar é que os pesquisadores devem sempre considerar o contexto de seus projetos e utilizar vários indicadores combinados. O que é medido deve variar também conforme o objetivo definido antes de uma determinada intervenção. Por exemplo, se o objetivo for a restauração ecológica, a mera área reflorestada pode não ser suficiente para indicar o sucesso da restauração. Em vez disso, a diversidade das espécies plantadas e a sua sobrevivência devem ser levadas em consideração. Indicadores devem ser também utilizados considerando um contexto local onde a intervenção está sendo feita.

O livro é open access e pode ser baixado para download no site da editora De Gruyter. Queremos que seja usado tanto nas universidades e centros de pesquisas como pelo público em geral. Esperamos que o livro encoraje mais trabalho, maior participação e colaboração no uso de indicadores. Só porque a sustentabilidade é difícil e muitos realmente não sabem como fazer um mundo verdadeiramente sustentável (especialmente porque existem diferentes pontos de vista sobre o que é um mundo sustentável), isso não significa que não podemos fazer coisas para sermos menos insustentáveis.

Aga Latawiec

Agnieszka Ewa Latawiec é polonesa, co-fundadora e diretora de pesquisa do Instituto Internacional para a Sustentabilidade (IIS) no Brasil e professora Associada da Universidade de Tecnologia de Opole, na Polônia. É também pesquisadora no Departamento de Geografia na PUC Rio e da escola de Ciências Ambientais da Universidade de East Anglia, da Inglaterra.

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