COP28: Indígenas lutam contra a desdemarcação de seus territórios

Em reunião com o presidente na COP28, em Dubai, Txai Paiter Suruí segura uma placa pedindo providências do governo. Foto Raylson Santos

Povo Guarani espera que o governo Lula resolva pendenga que já dura 8 anos no Pico do Jaraguá, em São Paulo

Por Raylson Santos | ODS 16 • Publicada em 11 de dezembro de 2023 - 07:31 • Atualizada em 19 de dezembro de 2023 - 10:00

Em reunião com o presidente na COP28, em Dubai, Txai Paiter Suruí segura uma placa pedindo providências do governo. Foto Raylson Santos

Após séculos de luta e resistência, em 1987, o território dos Guarani localizado no Pico do Jaraguá, em São Paulo, foi demarcado pela primeira vez com uma área de apenas dois hectares, menor reserva indígena até então. Em 2015, durante o governo de Dilma Rousseff, a portaria n° 581/15 expandiu o território para 523 hectares. A nova demarcação foi fundamental para garantir os direitos dos Guarani, visto que desde a expansão demográfica de São Paulo, o pico do Jaraguá, cercado pelas rodovias Anhanguera e Bandeirantes, era foco da especulação imobiliária e de empresas de transporte logístico.

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Influenciado por esses interesses econômicos, em 2017, no mandato de Michel Temer, o Governo Federal, em articulação com o estado de São Paulo, publicou a portaria n° 683/17 de desdemarcação, que  reduziu a reserva indígena Jaraguá  aos antigos 2 hectares da década de 80. À época, o então ministro da justiça, Torquato Jardim, argumentou que a portaria de revogação foi publicada porque não havia segurança jurídica e o Parque Jaraguá pertencia ao Governo de São Paulo. Após diversas mobilizações e ocupação do escritório da secretaria da presidência, em São Paulo, e do Ministério da Justiça, em Brasília, a Justiça Federal de São Paulo, através de uma liminar, suspendeu a portaria de revogação e a reserva indígena voltou a ter 523 hectares. No entanto, após seis anos e três governos diferentes, essa portaria ainda não foi homologada pela presidência da república.

“O Ministério da Justiça atual do governo Lula continua se posicionando na manutenção de uma portaria que desdemarcava o nosso território e nos expõe à agressão de uma expulsão violenta do Estado. E, aí, a gente está tentando dialogar com o governo para que eles sejam responsáveis, não usem mais a nossa imagem, a nossa luta apenas como marketing de governo, marketing de campanha’’, disse Thiago Karai Djekupé, após a reunião do presidente Lula com a sociedade civil em Dubai, na COP28

Durante todo o encontro, Thiago e sua namorada Txai Paiter Suruí, indígena do povo Paiter Suruí, seguravam uma placa  em direção ao presidente com a seguinte frase: “Lula revoga a portaria n° 683/2017 que ameaça a terra Jaraguá”. Na COP 26, em Glasgow, Txai Suruí chamou a atenção do mundo inteiro ao denunciar o descaso do governo Bolsonaro com os povos indígenas em seu discurso no palco principal da conferência. E neste ano, ela foi eleita pela revista Time como uma das 100 lideranças mundiais da nova geração.

O presidente Lula discursa na COP28, em Dubai: contradições climáticas e cobranças indígenas. Foto Jakub Porzycki/NurPhoto via AFP
O presidente Lula discursa na COP28, em Dubai: contradições climáticas e cobranças indígenas. Foto Jakub Porzycki/NurPhoto via AFP

No final da reunião, Thiago e outros indígenas entregaram uma carta ao presidente Lula pedindo mais empenho nas demarcações de terras indígenas e a revogação da portaria. Horas depois, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva viajou para a Alemanha e a ministra Sonia Guajajara assumiu a chefia da delegação brasileira na COP28, sendo a primeira indígena a desempenhar essa função.

Com esse aparente protagonismo dos povos indígenas, representantes do povo Guarani conseguiram dialogar sobre a garantia do seu território com a ministra do meio ambiente, Marina Silva, com o ministro da Economia, Fernando Haddad, e com a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara. Mas para Thiago ainda falta um esforço concreto das autoridades brasileiras.

“Todos prometeram resolver a situação. A única que está realmente empenhada buscando articular é a nossa ministra dos povos indígenas, que vem atuando nessa situação, no diálogo. Mas os demais só foram promessas mesmo de articulação e nenhum retorno até o momento’’, disse ele, reforçando a esperança de conseguir um diálogo concreto com o governo brasileiro.

“Seis anos já. Desde o governo Temer, depois Bolsonaro que a gente vem lutando, fazendo diversas mobilizações para garantir o nosso território […] desde quando o governo Lula assumiu, nós não fizemos nenhuma mobilização, porque acreditamos que vai haver o diálogo. O problema é que se passou um ano e o diálogo ainda não aconteceu’’.

Raylson Santos

Raylson Santos é paraibano, agricultor, estudante de jornalismo na Universidade Federal da Paraíba e bolsista Climático do Latin American Youth Climate Scholarships (LAYCS)

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