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Pro Brasil nascer feliz – de novo

ODS 16 • Publicada em 30 de setembro de 2022 - 10:05 • Atualizada em 30 de setembro de 2022 - 13:31

“Demo o quê?”, perguntava eu, ainda criança, após ouvir que o dia da eleição era uma… festa? Só que não tinha bolo, docinho, tampouco guaraná, mas que simbolizava mesmo um encontro. Dos vizinhos no beco saindo, passando pelo churrasco que começava na hora do almoço se estendendo pela tarde, no vaivém das motos, as crianças brincando na rua, passando pelos canos dos fuzis, metralhadoras, granadas, dos subcomandos e da polícia. No subir e descer da favela que ainda é hoje um dos maiores colégios eleitorais do Rio. Um dos que mais pesa na hora de eleger quem nos representará.

“Mãe, posso votar?”, questionava, pequeno, envolto dessa energia patriota, mesmo sem camisa da seleção – afinal, não havia essa combinação. E assim, apertar os números anotados em papel, com trilha após o “confirma”.

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Crescer e ver um país se transformar pelo o que se vivia dentro desse contexto. Tomar consciência e ter a possibilidade, designado na profissão, de ampliar as reflexões sobre o papel do Estado, a dimensão do que era decidido a cada pleito eleitoral, e o valor do que que se pode ver e viver. Não é fácil ser brasileiro, nem seguir na esperança de um Brasil menos racista, preconceituoso, classista e violento.

Manifestação em defesa da democracia no Centro do Rio: eleição decisiva para o Brasil voltar a ser feliz (Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil - 20/10/2018)
Manifestação em defesa da democracia no Centro do Rio: eleição decisiva para o Brasil voltar a ser feliz (Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil – 20/10/2018)

Apesar disso, ver as transformações, batalhando, a partir de um projeto de país que fez negros, favelados, periféricos entrarem na universidade e, por sua vez, formarem-se. Vendo luz onde não tinha, além da água chegando às torneira antes vazias; tendo o pobre direito e acesso a geladeira, forno, fogão, computador, carro. Podendo comer picanha e até tomar cerveja.

Sem pessoalizar, o Brasil já pôde ser mais feliz. Ou vislumbrar novos dias, sem tantos sucateamentos, sem desmonte de políticas públicas tidas como sacramentadas – o que não estava, nem nunca foi. Por erro da sociedade em dispor atenção redobrada para que não houvesse mudanças tão duras na última década. Tempo e período que coincidiu para que eu pudesse entender e trabalhar para que a Democracia pudesse ser vivida sob ataques a cada centésimo.

O que podemos neste domingo de eleição é uma sinalização, já precisa, do que temos não só de lembrança, mas as bases onde depositar nossas forças. E mais uma vez, construir um novo lugar. Para que a festa seja de fato, sem o medo que corre até mesmo para o exercício do voto; sem que pessoas sejam mortas por suas escolhas políticas ou qualquer outro tipo de temor visível.

Tudo não muda na segunda-feira, mas pode começar. E ela pode ser a segunda pro Brasil nascer feliz. De novo.

P.S. Na última eleição, cobrindo o dia anterior ao domingo da eleição para o segundo turno, encontrei, no pé do morro, Leandro, morador que até hoje não sei sobrenome, mas que ficou na cabeça. E, junto dele, seu filho Davi, na época com dois anos. “Posso te perguntar uma coisa? Aconteceu mesmo a ditadura?”, me questionou ao ver que segurava um cartaz com os dizeres “Troco abraço por conversa”.

Na ocasião, ele estava decidido: votar em Bolsonaro como símbolo de transformação. Foi quando perguntei “Que futuro a gente vai começar a escrever para o Davi a partir de domingo?”. E tive como resposta bate e pronto: “Não sei”. E seguiu. “Se der errado, a gente tira o presidente. A gente não fez isso com a Dilma? Faz com o próximo. O que custa colocar alguém novo, diferente lá?”, jogou no meu colo.

Passado todo esse tempo e tudo o que vivemos, vou à urna neste domingo pensando novamente em Leandro e Davi. Espero que estejam bem e agora, sem tantos medos e crentes realmente em algo novo.

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