O avanço do atraso no Congresso

Mais da metade da população brasileira não tem acesso à coleta de esgoto. Foto Custódio Coimbra

Comissão Mista aprova relatório da MP 844 que dificulta muito a universalização do saneamento no país

Por #Colabora | ODS 6 • Publicada em 5 de novembro de 2018 - 19:20 • Atualizada em 5 de junho de 2019 - 03:09

Mais da metade da população brasileira não tem acesso à coleta de esgoto. Foto Custódio Coimbra
Mais da metade da população brasileira não tem acesso à coleta de esgoto. Foto Custódio Coimbra
Mais da metade da população brasileira não tem acesso à coleta de esgoto. Foto Custódio Coimbra

Na noite de quarta-feira, enquanto a oposição ainda comemorava o adiamento da votação do projeto retrógrado da Escola sem Partido na Comissão Especial da Câmara, no plenário 3 do Senado Federal, a Comissão Mista da Medida Provisória 844, que altera o marco legal do saneamento no Brasil, aprovou o relatório do senador – não reeleito – Valdir Raupp (MDB/RR). Um parecer, que, na opinião de deputados oposicionistas, piora ainda mais a MP pois encurta o prazo de transição.  A MP transfere do Ministério das Cidades, ameaçado de extinção sob o governo Bolsonaro, para a Agência Nacional de Águas a regulação dos serviços de água e saneamento, facilita a participação da iniciativa privada na prestação desses serviços e enterra a prática do subsídio cruzado, onde os municípios mais ricos financiam os mais pobres.

Trata-se de uma MP inconstitucional, que afeta a titularidade municipal, o subsídio cruzado e a lógica dos ganhos de escala, prejudicando os municípios mais pobres e gerando um grande risco de aumento das tarifas de água e esgoto em todo o país. Nesse contexto, estará comprometida a universalização dos serviços

Nota conjunta assinada pela Frente Nacional de Prefeitos, a Associação Brasileira dos Municípios, entidades do saneamento básico (Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental – Abes, Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento – Aesbe, Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento – Assemae), Frente Nacional pelo Saneamento Ambiental) e organizações da sociedade civil afirma que “as mudanças propostas pela MP não serão capazes de enfrentar os problemas do saneamento básico, trazendo ainda mais insegurança jurídica, com a iminente desestruturação das políticas públicas do setor”.

De acordo com as entidades, “trata-se de uma MP inconstitucional, que afeta a titularidade municipal, o subsídio cruzado e a lógica dos ganhos de escala, prejudicando os municípios mais pobres e gerando um grande risco de aumento das tarifas de água e esgoto em todo o país. Nesse contexto, estará comprometida a universalização dos serviços. E a MP, ao contrário do defendido pelo Governo Federal, promoverá a desestruturação do setor de saneamento, agravando as diferenças entre cidades ricas e pobres”. Estes foram também os argumentos usados pelos deputados da oposição na reunião da Comissão Mista que, entretanto, não sensibilizaram os governistas do MDB, DEM e PSDB, que comandaram a aprovação da MP no órgão colegiado.

Relatório aprovado em comissão mista do Congresso foi criticado por várias entidades da sociedade civil. Foto Custódio Coimbra
Relatório aprovado em comissão mista do Congresso foi criticado por várias entidades da sociedade civil. Foto Custódio Coimbra

Nunca é demais repetir que 35 milhões de brasileiros não têm acesso a água tratada; metade da população, pouco mais de 100 milhões de pessoas, não têm acesso aos serviços de coleta de esgoto; e, do esgoto coletado, apenas 42% são tratados.  Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o Brasil – apesar de ser a nona economia mundial – está 123ª posição no ranking do saneamento.  Ainda de acordo com a OMS, 15 mil pessoas morrem no Brasil todos os anos devido a doenças ligadas à precariedade do saneamento, e, em duas décadas, isso pode custar a vida de 255 mil brasileiros, caso esse cenário não mude. É isso que está em jogo e, de acordo com as entidades do saneamento, este quadro dramático que a MP 844 só vai aprofundar.

Esse jogo no Congresso Nacional ainda não acabou.  Para virar lei, o texto ainda precisa ser aprovado pelos plenários da Câmara dos Deputados e do Senado. A MP 844 perde a validade no dia 19 de novembro. Como se viu na comissão, o governo Temer, apesar da impopularidade, tem base para aprovar o avanço do atraso na questão do saneamento. Como o tempo é curto e quase metade dos deputados não estará na Câmara em 2019, a aprovação da MP 844 não pode ser considerada certa.  Mas nada garante que proposta semelhante não possa voltar no governo Bolsonaro. Também não devemos esquecer uma máxima atribuída ao ex-presidente da Câmara, Ulysses Guimarães: “se você acha que o atual Congresso é ruim, então espere pelo próximo“.

#Colabora

Texto produzido pelos jornalistas da redação do #Colabora.

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