Aquecimento: mundo tem 40% de chance de romper limite até 2025

Cenário de seca perto de Quixeramobim, no Ceará: aquecimento global nos próximos anos reduzirá chuvas no Nordeste e na Amazônia (Foto: Evaristo Sá / AFP – 21/02/2017)

Organização Meteorológica Mundial aponta que temperatura acima do limite de 1,5º₢ de aumento será temporária mas reforça urgência em implementar Acordo de Paris

Por Observatório do Clima | ODS 13 • Publicada em 28 de maio de 2021 - 13:23 • Atualizada em 2 de junho de 2021 - 10:10

Cenário de seca perto de Quixeramobim, no Ceará: aquecimento global nos próximos anos reduzirá chuvas no Nordeste e na Amazônia (Foto: Evaristo Sá / AFP – 21/02/2017)

A Organização Meteorológica Mundial nos deu uma má e uma boa notícia nesta quinta-feira (27). A má é que até 2025 a temperatura global tem 40% de chance (e crescendo) de ultrapassar o limite de 1,5oC de aquecimento acima do nível pré-industrial – limite estabelecido pelo Acordo do Clima de Paris e marca a partir do qual os impactos da crise climática se tornam muito difíceis de manejar. A boa, se é que dá para falar nisso, é que a ruptura dificilmente será permanente. Por enquanto.

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O fantasma do chamado “overshoot” assombra a humanidade desde 2015, quando a COP21, a conferência do clima de Paris, concordou em inserir no tratado do clima uma meta “aspiracional” de limitar o aquecimento da Terra neste século a 1,5oC em relação à era pré-industrial.

O relatório da OMM mostra que estamos praticamente jogando uma moeda com o limite de temperatura do Acordo de Paris. Para que isso seja apenas momentâneo e possamos ficar dentro do aquecimento que a ciência diz que é mais seguro os países precisam de metas mais ambiciosas de redução de emissões para 2030 e correr para zerá-las em 2050. Não podemos contar com a sorte.

Naquela época os cientistas sabiam que, com o planeta já mais de 1oC mais quente, seria virtualmente impossível impedir que o limite fosse ultrapassado (essa ultrapassagem recebeu o nome em inglês de “overshoot”). A ideia era cortar emissões rapidamente de forma a que a temperatura média global, mesmo que ultrapassasse o limite, pudesse retornar o quanto antes a patamares menores e mais seguros.

O que pouca gente esperava é que a primeira ultrapassagem estivesse tão próxima. Embora o limite provavelmente já tenha sido brevemente rompido por alguns meses entre 2016 e 2017, o mundo ainda não passou um ano inteiro além de 1,5oC. Este não deve tardar. No Relatório de Atualização Climática Anual a Decadal, publicado nesta quinta (27/05), a OMM afirma que é quase meio a meio a chance de um ano qualquer dos próximos cinco anos assista a um “overshoot”. As médias anuais entre 2021 e 2025 devem ficar entre 0,9oC e 1,8oC acima do pré-industrial.

A organização, citando dados do Met Office, o instituto britânico de meteorologia, também afirma que é de 90% a chance de que algum dos anos entre 2021 e 2025 seja o mais quente da história, ultrapassando o recorde por ora estabelecido por 2016.

“Estas são mais do que apenas estatísticas”, disse o secretário-geral da OMM, Petteri Taalas, no lançamento do estudo. “O aumento das temperaturas significa mais derretimento do gelo, níveis mais elevados do mar, mais ondas de calor e outras condições climáticas extremas e maiores impactos na segurança alimentar, saúde, meio ambiente e desenvolvimento sustentável”, acrescentou.

A OMM alerta para a necessidade de os países preparem adequações para as mudanças no clima e seus efeitos. “Apenas metade dos 193 membros da OMM têm serviços de alerta precoce de última geração. Os países precisam continuar a desenvolver os serviços que serão necessários para apoiar a adaptação em setores sensíveis ao clima – como saúde, água, agricultura e energia renovável – e promover sistemas de alerta precoce que reduzam os impactos adversos de eventos extremos. Além das limitações nos serviços de alerta precoce, estamos tendo graves lacunas nas observações do tempo, especialmente na África e nos estados insulares. Isso tem um grande impacto negativo sobre a precisão dos avisos antecipados nessas áreas mas também globalmente”, frisou Taalas.

Aquecimento significa menos chuva na Amazônia e Nordeste

Em compensação, e sorria se puder, é de apenas 10% a chance de que a média global verificada entre 2021 e 2025 seja maior que 1,5oC.

A OMM informa que a chance de um “overshoot” dobrou em relação à última previsão porque o Met Office está usando uma nova base de dados climatológicos, o que fez com que o aquecimento estimado entre 1850 e 2020 saltasse de 0,91oC para 1,07oC. Em 2020 a Terra já estava 1,1oC mais quente que no período pré-industrial, e sobre os continentes, desconsiderando os oceanos, o 1,5oC já foi atingido.

O relatório lista outras previsões climáticas para o período 2021-2025: o Sahel, a imensa faixa semiárida ao sul do Saara, deve ver mais chuvas; o Ártico terá aquecido mais do que duas vezes mais rápido do que o restante do planeta; e o número de furacões no Atlântico Norte será ainda maior do que em anos recentes.

A probabilidade de que toda a América do Sul vivencie temperaturas acima da média é maior do que 90%. No mundo inteiro, apenas parte do Atlântico Norte ao sul da Groenlândia, do Oceano Austral e do Pacífico Sul devem ficar imunes a aquecimento adicional. O que é mais preocupante, o centro-norte da América do Sul, onde estão partes da Amazônia e do Nordeste brasileiro, deve ser uma das regiões do mundo com maior redução de precipitação.

“O relatório da OMM mostra que estamos praticamente jogando uma moeda com o limite de temperatura do Acordo de Paris”, diz Stela Herschmann, especialista em Política Climática do Observatório do Clima. “Para que isso seja apenas momentâneo e possamos ficar dentro do aquecimento que a ciência diz que é mais seguro os países precisam de metas mais ambiciosas de redução de emissões para 2030 e correr para zerá-las em 2050. Não podemos contar com a sorte.”

Observatório do Clima

O Observatório do Clima é uma rede que reúne entidades da sociedade civil para discutir a questão das mudanças climáticas no contexto brasileiro.

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