Educação e responsabilidade

Para Rene Silva, fundador do jornal Voz da Comunidade, no Complexo do Alemão, “o momento é de voltar às aulas na escola pública, com todos cuidados possíveis e necessários”. Foto Custódio Coimbra

Indicadores melhoram, consistentemente, desde a virada do século, mas ainda estamos caminhando a passos de cágado manco

Por Agostinho Vieira | ODS 1 • Publicada em 15 de outubro de 2015 - 21:42 • Atualizada em 4 de novembro de 2015 - 11:33

Para Rene Silva, fundador do jornal Voz da Comunidade, no Complexo do Alemão, “o momento é de voltar às aulas na escola pública, com todos cuidados possíveis e necessários”. Foto Custódio Coimbra
Os últimos resultados da prova ABC, aplicada pelo Inep, mostram que grande parte dos alunos do ensino fundamental não pode ser considerada “plenamente alfabetizada”. Em escrita, só 53,3% alcançaram a nota mínima
Os últimos resultados da prova ABC, aplicada pelo Inep, mostram que grande parte dos alunos do ensino fundamental não pode ser considerada “plenamente alfabetizada”. Em escrita, só 53,3% alcançaram a nota mínima

Da Escola Sarmiento, no Engenho Novo, à Escola de Comunicação, na UFRJ, passando pelo Colégio Pedro II, sempre estudei em estabelecimentos públicos. Até hoje lembro com carinho dos nomes e dos rostos das minhas professoras primárias: D. Neide, D. Ivanir, D. Terezinha, D. Berta e D. Eunice. O “D” de dona era comum na época, faz parte da lembrança e me parece fundamental.

Foram elas que me ensinaram a fazer conta de cabeça, me mostraram o prazer da leitura e me obrigaram a decorar o hino da Argentina. Este último faz muito sucesso em épocas de Copa do Mundo. Voltei a falar sobre as cinco na semana passada, quando um grupo de amigos discutia a situação da educação no Brasil. As avaliações variavam entre o ruim e o vergonhoso. Os culpados eram municipais, estaduais e federais. Mas sobraram críticas também para os particulares.

Dizer que absolutamente nada tem sido feito seria injusto, tem muita gente trabalhando duro nesse assunto. Mas os números confirmam a percepção generalizada de que estamos caminhando a passos de cágado manco. Em 2000, 83,8% das crianças e jovens entre 4 e 17 anos estavam matriculadas na escola. Em 2011 esse índice subiu 8,2 pontos percentuais, chegando a 92%, mas ainda assim abaixo da meta de 94,1% sugerida pelo movimento “Todos pela Educação” para a data.

Criada em 2006, a entidade reúne representantes de vários setores da sociedade e tem como objetivo garantir que o país tenha uma educação básica de qualidade até 2022, ano do bicentenário da independência do Brasil. Para isso, eles sugerem um conjunto de cinco metas, cinco bandeiras e cinco atitudes. Simples e objetivas. No caso das matrículas, deveríamos chegar a 2022 com 98% do problema resolvido. Por que não 100%? Estamos falando de mais oito anos de trabalho.

Se garantir a presença das crianças nas escolas está complicado, imagine o desafio de fazer com que elas aprendam. Seria ótimo se até o aniversário da independência todas soubessem ler, escrever e fazer contas básicas. Está difícil. Os últimos resultados da prova ABC, aplicada pelo Inep, mostram que grande parte dos alunos do terceiro ano do ensino fundamental não pode ser considerada “plenamente alfabetizada”. Em escrita, só 53,3% alcançaram a nota mínima. Em leitura, 56,1%, e em matemática, apenas 42,8%. É verdade que esses números já foram piores, mas isso não serve como consolo.

Outro problema sério é garantir que esses alunos tenham um aprendizado adequado ao seu ano. O pessoal do “Todos pela Educação” sonha com um índice de 70% até 2022. Hoje, ele varia entre 10,3% para os estudantes de matemática do terceiro ano do ensino médio até 40% para os de português no quinto ano do fundamental. No exemplo da matemática, conseguimos a façanha de piorar o resultado entre 2003 e 2011.

Um ponto importante, no entanto, é que, mesmo sendo ruins, não faltam números. E essa é uma boa notícia. Até bem pouco tempo não tínhamos essas avaliações externas como a Prova Brasil e o Índice Brasileiro de Educação Básica (Ideb). Não sabíamos se estávamos indo bem ou mal. O que falta agora é transformar esses resultados em novos aprendizados. E isso passa pela formação do professor. De acordo com o Censo Escolar 2010, 13% dos que trabalham no ensino médio do país não têm conhecimento adequado à função que ocupam.

Por outro lado, dados do MEC revelam que, de um modo geral, a remuneração do magistério brasileiro é 40% menor que a de outros profissionais com a mesma formação.  E essa é outra questão fundamental. A profissão não é valorizada pela sociedade, pelos governos e, muitas vezes, nem pelos pais dos alunos.  Aliás, se queremos ter um cenário melhor em 2022, precisamos retomar algumas práticas antigas, como levar e pegar filhos nas escolas, ajudar nos deveres de casa e evitar que eles faltem ou cheguem atrasados. Tem trabalho para todo mundo.

Agostinho Vieira

Formado em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Foi repórter de Cidade e de Política, editor, editor-executivo e diretor executivo do jornal O Globo. Também foi diretor do Sistema Globo de Rádio e da Rádio CBN. Ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo, em 1994, e dois prêmios da Society of Newspaper Design, em 1998 e 1999. Tem pós-graduação em Gestão de Negócios pelo Insead (Instituto Europeu de Administração de Negócios) e em Gestão Ambiental pela Coppe/UFRJ. É um dos criadores do Projeto #Colabora.

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