A Armadilha de Tucídides

Xi Jinping e Donald Trump reunidos em Beijing. Dois modelos, duas realidades e uma nova história. Foto Lan Hongguang/Xinhua

Os avanços incontestáveis da China, o consenso de Beijing e as reviravoltas da história mundial

Por José Eustáquio Diniz Alves | ODS 8 • Publicada em 9 de maio de 2018 - 10:04 • Atualizada em 11 de maio de 2018 - 14:17

Xi Jinping e Donald Trump reunidos em Beijing. Dois modelos, duas realidades e uma nova história. Foto Lan Hongguang/Xinhua
Xi Jinping e Donald Trump reunidos em Beijing. Dois modelos, duas realidades e uma nova história. Foto Lan Hongguang/Xinhua
Xi Jinping e Donald Trump reunidos em Beijing. Dois modelos, duas realidades e uma nova história. Foto Lan Hongguang/Xinhua

Há pelo menos três grandes ameaças à paz e à estabilidade mundial atualmente. Primeiro: guerras militares. O mundo assiste ao “espetáculo” da guerra de mísseis na Síria, a disputa entre Estados Unidos (EUA), Reino Unido e França contra a Rússia, as demonstrações bélicas da Coreia do Norte, a rivalidade entre a Arábia Saudita e o Irã, o acirramento da questão Palestina, a crise Rohingya envolvendo Myanmar e Bangladesh, o êxodo da população venezuelana que foge da maior crise vivida pelo país de Simon Bolívar, a militarização do Mar da China, etc.

Enquanto o presidente Donald Trump enfrenta problemas crescentes com o Congresso americano, na China, o presidente Xi Jinping foi reeleito no dia 17 de março de 2018 e pode se manter no poder para o resto da vida no país mais populoso do mundo

Segundo: guerras comerciais. Há diversas ações no sentido de propagar um conflito comercial de consequências incertas, mas que pode ser de grande escala e afetar toda a economia internacional.

Terceiro: a democracia liberal está em retração. De acordo com o “Economist Intelligence Unit’s Democracy Index”, o mundo passa por uma “recessão democrática”, já que 89 países apresentaram escores mais baixos de práticas democráticas em 2017 em relação aos anos anteriores.

O que todos estes conflitos e tendências têm em comum é o posicionamento antagônico entre os interesses dos EUA e da China. Enquanto o presidente Donald Trump enfrenta problemas crescentes com o Congresso americano, na China, o presidente Xi Jinping foi reeleito no dia 17 de março de 2018 e pode se manter no poder para o resto da vida no país mais populoso do mundo. Seu aliado Vladimir Putin foi reeleito na Rússia no dia 18 de março e vai completar mais de 20 anos de controle absoluto sobre os destinos do país mais extenso do planeta.

A Pax americana, pós fim da Guerra Fria, parece estar dando lugar a um mundo pós-Americano e pós-Ocidental. A conjuntura atual não deixa de ser surpreendente para aqueles que acreditavam que os valores liberais e democráticos iriam prevalecer com a derrocada dos regimes socialistas.

O “Fim da história” e o Consenso de Washington

A queda do Muro de Berlim (1989), a reunificação da Alemanha (1990) e a dissolução da União Soviética (1991) marcaram o fim de 40 anos de Guerra Fria. Teve início um período de hegemonia unipolar dos EUA e dos valores econômicos e políticos do Ocidente.

Para o cientista político Francis Fukuyama, estes acontecimentos marcaram uma mudança de época e representaram a vitória do capitalismo liberal sobre os regimes de forte intervenção estatal. Utilizando uma linha teórica desenvolvida por Hegel (1770-1831), Fukuyama escreveu o artigo “O fim da história” (1989) e, posteriormente, o livro “O fim da história e o último homem” (1992), onde defendeu a ideia de que o capitalismo e a democracia burguesa constituem o coroamento do progresso civilizatório.

Evidentemente, não se trata do fim da história em termos cronológicos e nem significa que a democracia burguesa seja um regime perfeito. Fukuyama concorda com a famosa frase de Winston Churchill (1874-1965): “A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas”. Ou seja, diante da derrocada do “socialismo real”, a democracia liberal, com todas as suas imperfeições, tornar-se-ia a solução final e mais avançada de governo da história da humanidade.

Aproveitando a conjuntura favorável, algumas instituições sediadas em Washington (FMI, Banco Mundial, Departamento do Tesouro dos Estados Unidos, etc.), buscando aprofundar a influência do capitalismo liberal, apresentaram, em dezembro de 1989, uma lista de dez pontos com recomendações de política econômica para os diversos países do mundo. A elaboração do receituário, conhecido como “Consenso de Washington” ficou a cargo do economista John Williamson e pode ser sumarizada no decálogo seguinte: 1. Disciplina fiscal e baixo déficit público; 2. Focalização dos gastos públicos em educação, saúde e infraestrutura; 3. Reforma tributária; 4. Liberalização financeira; 5. Taxa de câmbio competitiva; 6. Liberalização do comércio exterior; 7. Eliminação de restrições ao capital externo; 8. Privatização e venda de empresas estatais; 9. Desregulação das relações trabalhistas; 10. Defesa da propriedade intelectual.

Sem dúvida, a globalização neoliberal, estimulada pelo Consenso de Washington, foi claramente hegemônica no mundo na última década do século XX e na primeira década do século XXI (pelo menos até a recessão internacional de 2009).

Uma das muitas fazendas de energia solar da China. O país é o líder da produção mundial de energia renovável. Foto Zhou guoqiang / Imaginechina
Uma das muitas fazendas de energia solar da China. O país é o líder da produção mundial de energia renovável. Foto Zhou guoqiang / Imaginechina

O Consenso de Beijing

Porém, não havia unanimidade na defesa do receituário liberal. A China optou por um rumo diferente e adotou o chamado “Consenso de Beijing”, que  agrega as seguintes características: 1. Promoção das economias em que a propriedade estatal continua tendo um peso dominante; 2. Promoção de câmbio competitivo, com mudanças graduais para evitar choques e controle cambial para escapar da especulação predatória; 3. Políticas de promoção das exportações (“Export-led growth”) com proteção da indústria local e dos setores estratégicos do país; 4. Reformas de mercado, mas com controle das instituições políticas e culturais; 5. Centralização das decisões políticas e das estratégias de projeção nacional.

Em março de 2018, o Congresso Nacional do Povo, órgão máximo do Legislativo, com quase 3.000 delegados, aprovou por esmagadora maioria (apenas dois votos contrários e três abstenções), a reforma constitucional que permite ao presidente continuar no poder por toda a vida

Na prática, o Consenso de Beijing levou vantagem sobre o Consenso de Washington, pois a China soube criar salvaguardas para proteger sua economia, ao mesmo tempo em que acumulava vantagens, lidando com as regras da globalização neoliberal. Durante toda a década de 1980, a economia dos Estados Unidos representava mais de 20% da economia mundial, quando medida em poder de paridade de compra (ppp na sigla em inglês) e a economia da China representava menos de 5% do Produto Interno Bruto (PIB) global.

Nas décadas seguintes o quadro se inverteu. Em 2014, o PIB da China, representando 16,6% do PIB global ultrapassou o PIB dos EUA que ficou com 15,8% do PIB global. Em 2017, a China já levava uma vantagem de 18,3% sobre 15,3% dos EUA. Para 2022, as estimativas do Fundo Monetário Internacional (FMI) indicam que o PIB da China subirá para 20,4% do PIB global, enquanto o PIB dos EUA cairá para 14,1% do PIB global.

A hegemonia do “dragão asiático” também ocorreu no comércio mundial. No final dos anos 1970 a participação das exportações chinesas estava abaixo de 1% do total mundial, contra 12% dos EUA, segundo dados da Organização Mundial do Comércio (WTO, na sigla em inglês). No início dos anos 1990, as exportações chinesas subiram para 2% do total mundial e as exportações americanas permaneceram nos 12%. Mas o quadro mudou rapidamente nos anos seguintes. Em 2007, pela primeira vez, as exportações chinesas ultrapassaram as exportações americanas. Em 2017, as exportações da China somaram US$ 2,26 trilhões (representando 13% do total global) e as exportações dos EUA foram de US$ 1,55 trilhão (representando 9% do total global). Em 2017, o saldo comercial da China com o resto do mundo foi de US$ 421 bilhões e o déficit comercial dos EUA foi de US$ 863 bilhões.

Fonte: WTO: https://www.wto.org/english/res_e/statis_e/merch_trade_stat_e.htm

No confronto direto entre as duas maiores economias do mundo a vantagem chinesa é impressionante. O gráfico abaixo, com dados do “U.S. Census Bureau”, mostra que o déficit comercial dos EUA com a China cresceu enormemente nos últimos 25 anos, pois era de US$ 23 bilhões no começo do governo Clinton, em 1993, passou para US$ 84 bilhões no fim do governo Clinton, em 2001, atingiu a impressionante cifra de US$ 268 bilhões no fim do governo Bush, em 2008, e não parou de subir no governo Obama, chegando a US$ 367 bilhões em 2015, caindo um pouco para US$ 347 bilhões em 2016. No governo Donald Trump, a despeito de toda a retórica protecionista, o déficit comercial com a China bateu todos os recordes históricos e atingiu US$ 375 bilhões em 2017. O ano de 2018 começou com outro recorde chinês, que teve um superávit de US$ 36 bilhões em janeiro e US$ 29 bilhões em fevereiro, o maior saldo positivo de todos os tempos, para o primeiro bimestre do ano.

Fonte: Census Bureau, U.S. Trade in Goods by Country https://www.census.gov/foreign-trade/balance/index.html

 Hegemonia chinesa e orientalização do mundo

A economia internacional está mudando o seu eixo. O empresário Klaus Schwab, criador do Fórum Econômico Mundial, em evento realizado em São Paulo no mês de março de 2018, disse que vê para breve um mundo em que a China assumirá a liderança econômica global. Em 1900, o secretário de Estado dos EUA, John Hay, já previa que haveria uma mudança geopolítica estratégica no mundo. Ele disse: “O Mediterrâneo é o oceano do passado. O Atlântico é o oceano do presente e o Pacífico o oceano do futuro”. Os dados acima mostram que estas palavras prescientes estão se tornando realidade e o mundo passa por uma mudança de hegemonia entre as duas maiores potências mundiais. Na realidade, está havendo uma mudança de hegemonia entre o Consenso de Washington e o Consenso de Beijing. Ou ainda, numa perspectiva mais ampla, está havendo uma mudança de hegemonia entre o Ocidente e o Oriente.

Indubitavelmente, os Estados Unidos e a Europa estão em declínio relativo no contexto da economia global. Enquanto o governo Trump tenta construir um muro, separando fisicamente o México e a América Latina dos EUA, a Grã Bretanha implementa o Brexit e as forças da direita isolacionista crescem na Europa, a China, sob a liderança de Xi Jinping, implementa uma integração internacional por meio da política “Um cinturão, uma rota” (One Belt, One Road – OBOR), que pretende reviver o passado glorioso da antiga rota da seda. Fazem parte da iniciativa, o “Cinturão econômico rota da Seda” – que ligará a China com a Europa através da Ásia Ocidental e Central, integrando economicamente a imensa faixa terrestre da Eurásia e a “Rota da seda marítima” que ligará, em termos navais, a China com os países do Sudeste Asiático, a África, o Oriente Médio e a Europa. Adicionalmente, a China investe na exploração comercial e naval do Ártico, fortalecendo os laços de interdependência com a Rússia, além de facilitar as transações com a costa leste do continente americano.

A China tem uma situação econômica muito mais confortável do que os EUA, pois além do enorme saldo global da balança comercial (de mais de US$ 400 bilhões em 2017), tem um montante superior a US$ 3 trilhões em reservas internacionais e uma taxa de poupança agregada acima de 40% do PIB, o que possibilita altas taxas de investimento e uma grande geração de emprego. O gigante asiático é líder na produção de energia renovável e também lidera a produção de carros elétricos. O país forma cerca de 8 milhões de universitários por ano e avança a passos largos na pesquisa e na produção de ponta nas áreas de ciência e tecnologia.

O modelo chinês não é exceção na Ásia, pois o Japão e os Tigres Asiáticos (Coreia do Sul, Taiwan, Cingapura e Hong Kong) já tiveram sucesso neste tipo de estratégia de desenvolvimento. Atualmente, países como Tailândia, Malásia, Indonésia e Vietnã também emulam a China e se beneficiam dos investimentos regionais em infraestrutura.

Desta forma, a despeito das especificidades, fica cada vez mais clara a diferenciação entre os modelos econômico e político do Oeste e do Leste. No primeiro caso, o Ocidente pode ser definido pela somatória da economia de mercado e da democracia representativa, enquanto o Oriente é mais caracterizado pela presença estatal no mercado e pelo autoritarismo na política. O sucesso de Cingapura, de Lee Kuan Yew (1923-2015), tem servido de inspiração para os outros países asiáticos.  A China, por exemplo, governada por um partido único, costuma ser definida pelos oximoros “socialismo de mercado” ou “capitalismo de Estado”. Outros países “orientais” são governados por estilos autocráticos, como é o caso de Vladimir Putin na Rússia, Bashar al-Assad na Síria, Recep Erdogan na Turquia e Nursultan Nazarbayev no Cazaquistão. A novidade é que o estilo oriental de governo tem ganhado espaço em relação às democracias liberais do Ocidente.

A “Armadilha de Tucídides”

O escritor e professor da Universidade de Harvard, Graham T. Allison, concorda que existe um processo de orientalização do mundo, mas alerta para os perigos dessa mudança. No livro, “Destined for War: Can America and China Escape Thucydides’s Trap?” ele aponta para a possibilidade de uma guerra entre os EUA e a China. A razão é a “Armadilha de Tucídides”, que se refere a um padrão de estresse estrutural que resulta do movimento provocado pelo choque entre um poder ascendente e o poder hegemônico descendente. Para o professor, esse fenômeno é tão antigo quanto a própria história. Ele explica que na Guerra do Peloponeso (que devastou a Grécia antiga entre os anos de 431 e 404 a.C.), foi a ascensão de Atenas e o medo que isso incutiu em Esparta que tornou a guerra inevitável. Nos últimos séculos, essas condições de mudanças de hegemonia ocorreram dezesseis vezes, sendo que, em doze delas, estourou uma guerra. Para o autor, as condições estão dadas para gerar um conflito bélico entre os EUA e a China.

O presidente chinês, Xi Jinping, do lado direito, recebe o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi. Foto Fred Dufour
O presidente chinês, Xi Jinping, do lado direito, recebe o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi. Foto Fred Dufour

Embora os EUA sejam a potência militar dominante no mundo e tenham apresentado uma despesa militar de U$ 611 bilhões em 2016, a China é o país que mais avança nos investimentos bélicos, internos e externos, tendo contabilizado despesas militares de US$ 215 bilhões em 2016. Em terceiro lugar vem a Rússia com despesas de US$ 69 bilhões, segundo o Stockholm International Peace Research Institute. Estes três países foram responsáveis por 53% do gasto militar mundial.

Do ponto de vista político, os Estados Unidos são a democracia mais consolidada e influente do mundo. Mas 220 anos de eleições não evitaram o declínio relativo da economia americana e a eleição de Donald Trump tem gerado uma presidência com tantos atritos, nacionais e internacionais, que sugere que o país não está gabaritado para evitar a mudança de hegemonia global em curso. O último relatório do Escritório de Orçamento do Congresso dos EUA mostra que a dívida pública americana vai aumentar em US$ 12,4 trilhões entre 2019 e 2028, devendo alcançar quase 100% do PIB no final da próxima década.

Enquanto isto, a batalha pela liderança digital avança. Os gigantes tecnológicos da China, Alibaba e Tencent, têm valores de mercado superiores a US$ 500 bilhões. A China possui o maior mercado de pagamentos on-line. Tem o supercomputador mais rápido. É o maior centro de pesquisa de computação quântica. E seu projetado sistema de navegação por satélite competirá com o GPS dos EUA até 2020.

O presidente Xi Jinping, no cargo desde março de 2013, fez, durante o 19º Congresso do PCC, de forma incomum, um discurso longo e cheio de ambições. O termo oficial “Socialismo com características chinesas” foi acrescido de “Nova Era”, pois, segundo ele, a China está em uma junção histórica. Assim, o “Socialismo com características chinesas para uma nova Era” tem um plano de desenvolvimento em dois estágios: 1) ser líder mundial em inovação até 2035 e 2) um país plenamente desenvolvido (nas palavras de Xi “próspero, forte, democrático, culturalmente avançado, harmonioso e bonito”) até 2050.

Em março de 2018, o Congresso Nacional do Povo, órgão máximo do Legislativo, com quase 3.000 delegados, aprovou por esmagadora maioria (apenas dois votos contrários e três abstenções), a reforma constitucional que permite ao presidente continuar no poder por toda a vida. Aprovou também a inclusão do “pensamento de Xi” na Constituição do país. Isto significa o fim da “liderança coletiva”, estabelecida por Deng Xiaoping, após os trágicos fracassos impulsionados pelo personalismo autoritário de Mao Tsé-Tung. Desta forma, o presidente Xi Jinping opta pela via do poder monocrático e do culto de personalidade para levar a cabo o “Consenso de Beijing”.

Enquanto Donald Trump rompe com o multilateralismo, estabelece barreiras comerciais e gera insegurança na governança global, o presidente Xi Jinping centraliza o poder imperial e aumenta o controle político interno, para transformar seu país em potência hegemônica internacional entre os anos de 2035 e 2050. A China, que está acostumada a trabalhar numa perspectiva de longo prazo, se prepara para unir o Oriente e deixar em segundo plano os EUA e a Europa, viabilizando o declínio relativo do hemisfério ocidental.

A consolidação do “Triângulo estratégico” formado por Rússia, Índia e China (RIC) tende a mudar a correlação de forças internacionais, à medida em que crescem as iniciativas trilaterais entre estes três grandes países para se consolidarem como potências na Eurásia e fazer da região uma “cabeça de ponte” para as suas aspirações globais. A Rússia já tem seus interesses bastante alinhados com os da Índia e da China. Faltaria um acerto mais efetivo entre os dois países mais populosos do mundo e que são berço de duas grandes civilizações. O passo foi dado nesta última semana de abril de 2018, com o encontro bilateral da cúpula entre os líderes Narendra Modi e Xi Jinping, que promete estabelecer uma sinergia mútua, ao mesmo tempo que abre a possibilidade de fortalecer a diplomacia triangular do grupo RIC, como meio para reconfigurar a economia global e a governança internacional.

Como se vê, a história não para e continua sua marcha sem fim. Tudo indica que a economia de mercado e a democracia liberal não representam o coroamento do progresso da humanidade, como imaginou Fukuyama. A ocidentalização está sendo substituída pela orientalização. O modelo intervencionista e autoritário ganha força e a China se prepara para ser a líder do “Triângulo estratégico”, visando a liderança global em detrimento dos interesses dos EUA. Essa mudança de hegemonia pode repetir o que aconteceu há mais de 2.400 anos na Grécia, e que gerou a Guerra do Peloponeso.

Portanto, a “Armadilha de Tucídides” continua sendo um fato real e altamente provável. A diferença em relação aos conflitos anteriores é que a dimensão dos arsenais nucleares e o uso da Inteligência Artificial e dos robôs assassinos por parte das potências militares em confronto não tem paralelo no tempo e nem registro semelhante nos anais da história. Uma Terceira Guerra Mundial pode provocar um apocalipse universal.

Se a governança global não for capaz de apresentar soluções para o complexo quadro das relações internacionais e a deterioração das condições sociais e ecológicas – num cenário de aumento dos conflitos entre as potências ascendente e descendente – muita gente vai se recordar, talvez com saudade, como foi equivocado, mas alentador, o sonho do “fim da história”.

José Eustáquio Diniz Alves

José Eustáquio Diniz Alves é sociólogo, mestre em economia, doutor em Demografia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar/UFMG), pesquisador aposentado do IBGE, colaborador do Projeto #Colabora e autor do livro "ALVES, JED. Demografia e Economia nos 200 anos da Independência do Brasil e cenários para o século" (com a colaboração de F. Galiza), editado pela Escola de Negócios e Seguro, Rio de Janeiro, 2022.

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