ODS 1
O maior acidente de trabalho da história do Brasil
Tragédia de Brumadinho confirma a mineração como o setor que mais mata trabalhadores no país
Ninguém sabe ainda, exatamente, qual será o número final de vítimas da tragédia provocada pelo rompimento de uma barragem da mina Córrego do Feijão, em Brumadinho. Nem mesmo se todos serão encontrados. Até agora, as estatísticas do Corpo de Bombeiros falam em 121 mortos e mais de 200 desaparecidos. Duas certezas, no entanto, se destacam na lama dos escombros. A primeira: seja qual for a lista de mortos e feridos, ela será majoritariamente composta por funcionários próprios ou terceirizados da Vale. A segunda: este já é o maior acidente de trabalho da história do Brasil.
[g1_quote author_name=”Mario Parreiras de Faria” author_description=”Médico e auditor do Ministério do Trabalho” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]Para cada cem mil trabalhadores brasileiros, seis morrem em acidentes de trabalho. Quando falamos em mineração, o número é quase cinco vezes maior. São 26 mortos para cada grupo de 100 mil trabalhadores. É maior do que a construção civil, o setor de transportes e qualquer outro
[/g1_quote]A própria Vale informou que havia 427 funcionários trabalhando no momento em que a barragem de rejeitos se rompeu na tarde da última sexta-feira. Em entrevista a jornalistas, o presidente da empresa, Fabio Schvartsman, disse que o restaurante da companhia foi soterrado e que ele estava cheio de funcionários próprios e terceirizados. A primeira vítima identificada foi a médica Marcelle Porto Cangussu, de 35 anos, que trabalhava na mineradora desde 2015.
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Veja o que já enviamosSegundo o médico Mario Parreiras de Faria, Coordenador da Comissão Permanente Nacional do Setor Mineral (CPNM), órgão do Ministério do Trabalho, não existe nenhuma atividade no país que mate mais do que o setor de mineração: “A distância é absurda. Para cada cem mil trabalhadores brasileiros, seis morrem em acidentes de trabalho. Quando falamos em mineração, o número é quase cinco vezes maior. São 26 mortos para cada grupo de 100 mil trabalhadores. É maior do que a construção civil, o setor de transportes e qualquer outro”.
Mario Parreiras é um dos maiores especialistas em saúde e segurança do trabalho na área de mineração. Com 35 anos de experiência, ele acompanhou praticamente todas as tragédias envolvendo o rompimento de barragens no Brasil. Desde a barragem de Fernandinho, em Itabirito, em 1986, até a barragem do Fundão, em Mariana, em 2015. A primeira teve 7 mortos, mas apenas um corpo foi encontrado. Na segunda foram 19 mortos, cinco moradores da região, um funcionário da Samarco e 13 trabalhadores terceirizados. O médico lembra que, em 2014, quando a barragem de Herculano rompeu, também em Itabirito, um dos três corpos das vítimas só foi encontrado graças à ajuda da cachorra que vivia na mina.
Mas essa divisão entre trabalhadores próprios e terceirizados é um dos problemas apontados por Parreiras para acompanhar as estatísticas de mortes e acidentes do trabalho. A lei brasileira obriga as empresas a fazerem uma Comunicação dos Acidentes de Trabalho, o chamado CAT. Mas isso vale apenas para os funcionários próprios. No caso dos terceirizados, o CAT é feito pelas prestadoras de serviços, o que dificulta o acompanhamento e o histórico de tragédias como as de Mariana e Brumadinho.
Dados do Ministério Público do Trabalho (MPT) e da Organização Internacional do Trabalho (OIT) mostram que, desde o começo de 2017, ao menos um trabalhador brasileiro morreu a cada quatro horas e meia, vítima de acidente de trabalho. Entre 2012 e 2017, a Previdência Social gastou mais de R$ 26,2 bilhões com o pagamento de auxílios-doença, aposentadorias por invalidez, auxílios-acidente e pensões por morte de trabalhadores. De acordo com os cálculos da OIT, o país perde, anualmente, 4% do seu Produto Interno Bruto (PIB) com gastos decorrentes de “práticas pobres em segurança do trabalho”. Depois da tragédia de Brumadinho, esses gastos certamente vão crescer. Já as práticas pobres tendem a continuar as mesmas. Infelizmente.
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Formado em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Foi repórter de Cidade e de Política, editor, editor-executivo e diretor executivo do jornal O Globo. Também foi diretor do Sistema Globo de Rádio e da Rádio CBN. Ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo, em 1994, e dois prêmios da Society of Newspaper Design, em 1998 e 1999. Tem pós-graduação em Gestão de Negócios pelo Insead (Instituto Europeu de Administração de Negócios) e em Gestão Ambiental pela Coppe/UFRJ. É um dos criadores do Projeto #Colabora.
Aprendam de uma vez por todas:
NÃO EXISTE ACIDENTE EM OBRAS DE ENGENHARIA!
Caro Vitor, obrigado pelo comentário, neste caso, a expressão “acidente de trabalho” se refere exclusivamente ao fato de as pessoas teriam sido vitimadas, fatalmente ou não, enquanto estavam trabalhando. Segue a definição da lei: Conforme dispõe o art. 19 da Lei nº 8.213/91, “acidente de trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução,
O ocorrido em Mariana poluiu o Rio Doce e não o Rio São Francisco, como consta na tabela resumo dos rompimentos de barragens.
Barragens cujo barramento se assenta sobre barro, material mole, vão se romper mais dia, menos dia.
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