Maternidade da UFRJ cria projeto para cuidar de mães veganas e vegetarianas

Médicos e profissionais de saúde de maternidade-escola pretendem também fazer pesquisas sobre riscos e diferenças no pré-natal

Por Eduarda Macedo | ODS 3 • Publicada em 12 de dezembro de 2019 - 11:52 • Atualizada em 6 de julho de 2021 - 20:08

A paisagista e arquiteta Leila Pedrosa, com seu pequeno Levi: ovolactovegetariana – consome leite e ovo, mas nenhuma carne de origem animal – ela fez seu suplementação alimentar durante a gravidez acompanhada por projeto da maternidade-escola da UFRJ (Foto: Arquivo Pessoal)

A paisagista e arquiteta Leila Pedrosa, com seu pequeno Levi: ovolactovegetariana – consome leite e ovo, mas nenhuma carne de origem animal – ela fez seu suplementação alimentar durante a gravidez acompanhada por projeto da maternidade-escola da UFRJ (Foto: Arquivo Pessoal)

Médicos e profissionais de saúde de maternidade-escola pretendem também fazer pesquisas sobre riscos e diferenças no pré-natal

Por Eduarda Macedo | ODS 3 • Publicada em 12 de dezembro de 2019 - 11:52 • Atualizada em 6 de julho de 2021 - 20:08

A equipe médica da Maternidade-escola da UFRJ, em Laranjeiras, na Zona Sul do Rio de Janeiro, criou um ambulatório para mães veganas e vegetarianas, ao constatar o crescente aumento de mulheres com essas opções alimentares . Em seis anos, o número de pessoas que se declaram vegetarianas quase dobrou no Brasil. Segundo pesquisa do Ibope de abril de 2018, cerca de 14% da população brasileira se declara vegetariana. Pela falta de pesquisas na área, a equipe de nutrição e obstetrícia decidiu acolher essas mulheres para oferecer um acompanhamento especializado. “A partir do momento que é criado um ambulatório no SUS que vai estar atendendo uma população maior, são criados também mecanismos para construir conhecimento científico e atender melhor”, explica a obstetra e ginecologista Flavia Tarabini.

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A iniciativa – nascida a partir do interesse da residente de nutrição Thais Melo, que elaborou um trabalho de conclusão de curso sobre o tema – conta com a participação de nutricionistas, ginecologistas, endocrinologistas, além de acompanhamento de psicólogos e assistentes sociais, caso seja necessário. O projeto – o primeiro para esse público no Rio de Janeiro – já atendeu cinco gestantes desde dezembro de 2018. “Ao eliminar um grupo de alimentos da dieta, a orientação é muito importante. Muitas vezes as pessoas já estão com alguma deficiência de micronutrientes e que acabam por acentuar durante a gestação”, afirma Thaís, lembrando que o pré-natal é fundamental para um resultado obstétrico favorável.

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Fazer com que os profissionais da saúde compreendam que não é uma persuasão em relação ao consumo, mas sim um respeito em relação às escolhas, também é uma base para esse ambulatório. Queremos saber quais são os riscos, para conseguirmos conversar com essas mulheres e recorrer às medidas de suplementação alimentar e recursos nutricionais, caso necessário

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A nutricionista afirma que a orientação sobre a qualidade da alimentação é a mais importante para esse grupo de pacientes, mas reforça que as deficiências podem ocorrer com todas as gestantes que não tiverem um acompanhamento adequado. “É um grupo que requer atenção diferenciada, tanto que é recomendação do Ministério da Saúde a suplementação de ácido fólico e ferro para todas as gestantes, independente do seu consumo alimentar”.

A obstetra e ginecologista Flavia Tarabini contou que, com o surgimento dessas mães, os médicos tentavam fazer com que as pacientes entendessem a necessidade do consumo da proteína animal. No entanto, ela pontua que isso vai contra à autonomia e questões filosóficas das mulheres que optam por esse estilo alimentar.  “Fazer com que os profissionais da saúde compreendam que não é uma persuasão em relação ao consumo, mas sim um respeito em relação às escolhas, também é uma base para esse ambulatório. Queremos saber quais são os riscos, para conseguirmos conversar com essas mulheres e recorrer às medidas de suplementação alimentar e recursos nutricionais, caso necessário”, explica a médica.

Flavia também acredita que projetos como esse são uma forma de estimular o debate sobre o vegetarianismo e veganismo na Medicina. “A partir desse conhecimento construído a partir deste projeto, podemos de fato ampliar esse debate, reverberar através de encontros científicos, congressos”, argumenta.

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Eu nunca jantava, sempre comia um lanche. Percebi que a minha alimentação, apesar de eu não comer fritura, refrigerante, essas coisas, era muito pobre dos elementos que eu precisava, das vitaminas e proteínas

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Experiência de mãe

A arquiteta e paisagista Leila Pedrosa, de 41 anos, escolheu ser ovolactovegetaria – consome leite e ovo, mas nenhuma carne de origem animal – há 10 anos, quando começou a praticar yoga. Ela engravidou e optou em ter o  acompanhamento na Maternidade-escola devido a gravidez de risco pela idade. Auxiliada pela equipe, após os exames, ela precisou suplementar com vitamina D, B12, ferro, cálcio e materna. “Lá pelos sete meses de gestação, fui diagnosticada com diabetes gestacional e isso foi muito ruim, mexeu com minha cabeça, tive que fazer muitos exames”, recorda Leila.

Leila admite que sempre se achou bem saudável e natural, mas confessou que, depois da gravidez, percebeu que seus hábitos não eram. “Eu nunca jantava, sempre comia um lanche. Percebi que a minha alimentação, apesar de eu não comer fritura, refrigerante, essas coisas, era muito pobre dos elementos que eu precisava, das vitaminas e proteínas. Eu percebi a importância de jantar. Mas demorou para cair a ficha”, explica a arquiteta. 

Além disso, Leila contou que sempre teve o costume de ficar muito tempo sem comer; isso, junto com o emocional, prejudicava o resultado dos exames. “Eu comia seis da tarde e ia fazer o exame só no dia seguinte, às sete da manhã. A taxa de açúcar dava muito alta. Me perguntava o que tinha feito de errado porque jantava uma salada com ervilha e  fazia tudo o que a nutricionista estava me passando. Eles já queriam me dar insulina e eu negava, porque eu estava fazendo tudo certo. Demorei para entender isso, porque não é só fazer as coisas certas. Tem toda uma questão emocional envolvida no processo da diabetes”, afirma Leila. 

A suplementação de vitaminas e minerais ajudou o fim da gravidez e o pequeno Levi nasceu sem problemas no parto e saudável. “Com o tempo, esse aprendizado me ajudou a melhorar a minha alimentação, mesmo depois do nascimento do meu filho”, conta Leila – seu bebê está hoje com 7 meses.

Leila, com Levi recém-nascido no colo, a nutricionista Thaís e o endocrinologista Marcus Miranda: ambulatória na maternidade-escola da UFRJ para mães veganas e vegetarianas (Foto: Arquivo Pessoal)
Leila, com Levi recém-nascido no colo, a nutricionista Thaís Melo e o endocrinologista Marcus Miranda: ambulatória na maternidade-escola da UFRJ para mães veganas e vegetarianas (Foto: Arquivo Pessoal)

Classificações de veganas e vegetarianas

O endocrinologista Marcus Miranda, também do ambulatório da maternidade, afirma que entender as escolhas dessas mães e ajudá-las a levar adiante esse projeto é possível e viável. Segundo ele, o primeiro passo é identificar quais filosofias levaram cada uma dessas mães optarem por esse estilo alimentar e o tempo que elas estão sem ingerir proteína animal.  Para Miranda, entender as classificações de vegetarianas e veganas e suas variações é indispensável para o acompanhamento. “Precisamos entender esses aspectos e classificar, porque essa paciente pode ser ovolactovegetariana, ovovegetariana, lactovegetariana, vegetariana estrita, vegana, ou estar em transição, com uma alimentação de base vegetariana, mas uma vez por mês ainda come peixe ou alguma proteína de origem animal”, explica o médico.

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Até o momento no Brasil, não identificamos nenhum projeto acompanhando as gestantes que seguem esse estilo alimentar: é mais uma motivação para estudar este público e poder fornecer subsídios para a estruturação do processo de acompanhamento destas gestantes

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Miranda também reforça que o fato dessas mães serem vegetarianas não está necessariamente ligado com uma alimentação saudável e balanceada. Um erro bastante comum dos vegetarianos e veganos é o consumo exagerado de carboidratos.  A obstetra Flavia alerta que isso pode aumentar o risco de diabetes gestacional e prejudicar o crescimento do bebê. Diabetes gestacional é uma condição específica da gravidez e afeta entre 2% e 10% das gestações a cada ano, segundo dados da Sociedade Brasileira de Endocrinologia. É uma doença que eleva os níveis de açúcar no sangue e aumenta o risco de desenvolver diabetes do tipo 2 no futuro, tanto na mulher quanto no bebê.

Devido a esses possíveis problemas, uma rotina de exames básicos devem ser feitas, segundo o endocrinologista Marcus Miranda e a obstetra Flavia Tarabini. Hemograma completo, dosagem de vitamina B12, cálcio, vitamina D, cinética de ferro, dosagem de ferro e ferritina são alguns deles. Além desses, podem ser feitos a dosagem de proteínas totais, albumina e, a critério do nutricionista, a de micronutrientes. A partir desses exames que surgem as orientações, mas eles afirmam que muitas coisas podem ser resolvidas com a adequação da alimentação e o acompanhamento do nutricional.

A Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB) disponibiliza trabalhos acadêmicos científicos sobre vegetarianismo e veganismo. Além disso, a entidade criou um guia alimentar para bebês vegetarianos com menos de dois anos. Mas ainda não existe nenhum específico para gestantes. “Até o momento no Brasil, não identificamos nenhum projeto acompanhando as gestantes que seguem esse estilo alimentar: é mais uma motivação para estudar este público e poder fornecer subsídios para a estruturação do processo de acompanhamento destas gestantes”, afirma a nutricionista Thaís.

Eduarda Macedo

É estudante de Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo, na PUC-Rio. Sempre à procura de novos desafios, no 7º período já trabalhou como repórter da Rádio PUC, redatora da Órama Investimentos, assessora do GNT na In Press Porter Novelli e faz iniciação científica pelo CNPq/PIBITI.

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