ODS 1
Acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares. Conheça as reportagens do Projeto Colabora guiadas pelo ODS 1.
Veja mais de ODS 1O Brasil bateu diversas marcas trágicas na semana de 21 a 27 de março de 2021 e a velocidade da pandemia é tão exagerada que os eventos estão sendo contados em minutos. No dia 25/03, o Ministério da Saúde registrou 100.158 novas infecções (70 casos por minuto) e no dia 26/03 foram registradas 3.650 vidas perdidas (2,5 mortes por minuto). O país ultrapassou o montante acumulado de 12 milhões de brasileiros infectados e 300 mil vítimas fatais da covid-19. A semana foi de recordes não desejados por ninguém, pois, superando todos os limites hebdomadários anteriores, houve impressionantes 539.903 casos e 17.798 mortes em 7 dias ou 10.080 minutos.
Não há vivos, há os que morreram e os que esperam a vez
O Brasil pandêmico parece um trem desgovernado que vai perdendo seus vagões ao longo dos trilhos. Nesta analogia, ilustrada no gráfico abaixo, cada vagão perdido significa 50 mil vítimas. O primeiro vagão descarrilhou no dia 21 de junho de 2020. O segundo, saiu dos trilhos 48 dias depois (08/08), somando 100 mil falecimentos. O terceiro se perdeu no dia 10 de outubro somando 150 mil vítimas fatais. O quarto se soltou no dia 07 de janeiro de 2021, acumulando 200 mil mortes. O quinto se desprendeu no dia 24 de fevereiro notificando 250 mil óbitos e, 28 dias depois, o último vagão baldado, com outros 50 mil óbitos, foi registrado na quarta-feira passada (dia 24 de março de 2021), atingindo a lastimável marca de 300 mil vidas perdidas para a covid-19.
Se as instituições da “Ferrovia Brasil” estivessem funcionando com presteza e seriedade, o trem poderia ser controlado e paralisado. Mas nada parece deter a máquina maluca que mais parece o Titanic, pois há vagões realizando festas, enquanto a República assiste bestificada as manobras descontroladas dos maquinistas, comandados por um capitão genocida. Neste ritmo, pode-se prever (entre os diversos cenários possíveis) que o sétimo vagão se perderá, com uma distância de apenas 24 dias, no dia 16 de abril e o oito sairá dos trilhos no dia 13 de maio, somando 400 mil vidas perdidas. Provavelmente alguma coisa será feita para mitigar esta tragédia e para diminuir o ritmo das perdas. Supondo que em algum momento o ritmo do trem vá diminuir, o nono vagão poderá ficar atrelado por 45 dias antes de descarrilhar (no dia 26 de junho) e o décimo vagão poderá se manter por 50 dias antes de tombar com outras 50 mil mortes, acumulando, em 14 de agosto de 2021, a dramática cifra de meio milhão de vidas perdidas nesta fatídica jornada do maligno serial killer, chamado coronavírus (parente impiedoso da “gripezinha”).
O Brasil se destaca na comparação dos 10 maiores países do mundo, em termos demográficos. Conforme mostra o gráfico abaixo, para a semana de 21 a 27 de março, na dezena que engloba as nações mais populosas do globo, o Brasil (com 2,7% dos habitantes globais) somou a média de 2.543 mortes diárias, enquanto os EUA tiveram 998 mortes diárias em média, o México 517 óbitos, a Rússia 395 óbitos, a Índia 251 óbitos, a Indonésia 120 óbitos, o Paquistão 50 óbitos, Bangladesh 29 óbitos, Nigéria 2 óbitos e na China não houve nenhuma morte por covid-19. Portanto, o volume de vidas perdidas na semana no Brasil foi superior à soma das mortes dos outros 9 países, que, em conjunto, registraram 2.362 óbitos diários, embora possuindo 4,3 bilhões de habitantes, o que representa 55% da população total do Planeta.
A situação brasileira é calamitosa. A campanha de vacinação está mais devagar do que o andor de barro. Em consequência, boa parte do Brasil estará em lockdown no domingo de Ramos (28/03) e o país passará a Semana Santa em penitência. Como mostrou Agostinho Vieira, aqui no # Colabora, no dia 24/03, o Brasil poderia ter salvo a vida de dezenas de milhares de seus filhos e filhas se tivesse levado a sério as políticas de saúde e de controle sanitário: “Se apenas uma vida pudesse ser preservada já faria uma enorme diferença. Nada aconteceu”.
O panorama nacional
Segundo o Ministério da Saúde, o Brasil teve novamente a sua pior semana epidemiológica com números acumulados em toda a série de 12.490.362 pessoas infectadas e 310.550 mil vidas perdidas, com uma taxa de letalidade de 2,5%. Foram 54 casos e 1,8 mortes para cada minuto da semana. As médias móveis de 7 dias superaram todos os montantes anteriores e ficaram em 77,1 mil casos e 2.543 óbitos.
O gráfico abaixo mostra a média diária de casos nas diversas semanas epidemiológicas de 22 de março de 2020 a 27 de março de 2021. Nota-se que o número de casos subiu rapidamente até o pico de 45,7 mil casos diários na semana de 19 a 25/07. A partir do final de julho o número médio de casos, com algumas oscilações, caiu até o mínimo de 16,8 mil casos na primeira semana de novembro. Mas a partir daí teve início uma 2ª onda de contágio que culminou com 47,5 mil casos em meados de dezembro, houve uma breve queda nos feriados de fim de ano e uma nova marca recorde da curva epidemiológica de 77,1 mil casos diários na semana de 21 a 27 de março de 2021. O Brasil vai começar a Semana Santa com perspectiva de números ainda mais elevados, se as medidas de isolamento social e restrição das atividades não funcionarem na prática.
O gráfico abaixo, mostra a variação média diária de óbitos nas diversas semanas epidemiológicas de 22 de março de 2020 a 27 de março de 2021. Observa-se que o número diário de óbitos da covid-19 passou de 13 vítimas diárias na semana de 22 a 28/03 para o pico de 1.097 em 19 a 25 de julho de 2020. Nas semanas seguintes, com pequenas oscilações, os números foram caindo até 343 óbitos diários em 01 a 07/11. Porém, houve inflexão da curva e o número médio de vítimas fatais voltou para a casa de 1.000 óbitos diários em janeiro e ultrapassou 2.000 óbitos diários em março. Na semana de 21 a 27 de março foram registrados, em média, 2.543 mortes diárias, confirmando a semana mais letal de toda a série histórica da pandemia.
O panorama global
O Planeta ultrapassou 126 milhões de pessoas infectadas e 2,7 milhões de vidas perdidas para a covid-19 no dia 27 de março de 2021, com taxa de letalidade de 2,2%. As médias móveis de 7 dias voltaram a subir e estão em 540 mil casos diários e 9,5 mil óbitos diários, segundo o site Our World in Data, com base nos dados da Universidade Johns Hopkins.
O gráfico abaixo mostra a evolução da média diária dos casos da covid-19 no mundo, desde o início de março de 2020. Nota-se que o número de infecções passou de 7 mil casos diários entre 08 e 14 de março para 329 mil casos no início de outubro de 2020, acelerou em seguida e, depois de uma leve redução no final do ano, atingiu o pico absoluto de 728 mil casos na semana de 03 a 09 de janeiro de 2021. A partir daí houve uma queda abrupta e o número de casos diários atingiu 363 mil casos na semana de 14 a 20 de fevereiro. Porém, os números voltaram a subir ligeiramente nas últimas 5 semanas, em parte, devido ao aumento ocorrido no Brasil e na Índia, mas também por conta de uma 3ª onda que teve início na Europa e em alguns países do Oriente Médio.
O gráfico abaixo mostra a média diária de óbitos no mundo por semanas epidemiológicas. Na segunda semana de março houve menos de 1 mil mortes diárias, mas entre 29/03 e 04/04 já tinha saltado para 5,2 mil óbitos diários e o primeiro pico aconteceu na semana de 12 a 18 de abril com 7 mil mortes diárias. Nas semanas seguintes os números variaram, mas foram sempre menores do que o pico de abril, atingindo 6,5 mil na última semana de outubro. Todavia, nas diversas semanas de novembro foram batidos recordes sucessivos e na quarta semana foi ultrapassado o limiar de 10 mil mortes diárias. O pico da 2ª onda ocorreu na semana de 24 a 30 de janeiro, com 14,1 mil óbitos. No mês de fevereiro houve queda significativa e na primeira quinzena de março uma queda mais modesta. Todavia, o número de mortes voltou a subir nas duas últimas semanas, se aproximando de 10 mil vidas perdidas a cada 24 horas.
Em números acumulados, os EUA, o Brasil e a Índia estão no pódio do ranking dos países mais impactados da pandemia, em termos absolutos. Mas para comparar os países de diferentes dimensões é preciso considerar o peso demográfico. O gráfico abaixo apresenta o coeficiente de mortalidade (óbitos por milhão de habitantes) dos países do topo do ranking, a média mundial, os exemplos da Índia e Uruguai e, por fim, alguns dos países que conseguiram vencer o SARS-CoV-2 e tiveram baixíssima proporção de mortes entre a população.
A República Tcheca e a Hungria já passaram de 2 mil mortes por milhão de habitantes. A Bélgica, a Eslovênia e a Bósnia e Herzegovinea possuem coeficientes entre 1.900 e 2.000 mortes por milhão. O Brasil já aparece em 16º lugar com 1.478 mortes por milhão (segundo o Ministério da Saúde). A média de mortes do mundo é de 358 óbitos por milhão, sendo que o Uruguai tem 251 óbitos por milhão e a Índia 117 óbitos por milhão. Entre os países menos impactados pela pandemia estão Nova Zelândia (5 óbitos por milhão), China (3 óbitos por milhão), Camboja (0,5 óbito por milhão) e Vietnã e Taiwan com 0,4 óbito por milhão de habitantes.
O ranking dos países não é fixo, pois muda em função dos diferentes ritmos nacionais da pandemia. Há países subindo no ranking e outros descendo. No dia 12 de fevereiro, apresentamos o gráfico abaixo (à esquerda) no Diário da Covid-19, intitulado “Na contramão da queda global, mortes sobem no Brasil”, aqui no # Colabora, quando o Brasil estava na 22ª posição do ranking. Mas, como vimos no gráfico anterior (reproduzido abaixo no painel da direita), o Brasil deu um salto para a 16ª posição, ultrapassando: Colômbia, Suíça, Lituânia, Suécia, França, Panamá e Croácia. A Bélgica que estava em primeiro lugar em fevereiro caiu para o 3º lugar, enquanto a República Tcheca que estava em 4º lugar, passou para a liderança geral. Portugal estava em 8º lugar e caiu para 12º lugar. A Suíça estava em 20º lugar e caiu para 27º lugar. O Camboja que não tinha registrado nenhuma morte até fevereiro, anotou 8 mortes em março e atingiu o coeficiente de 0,5 óbito por milhão de habitantes. Entre todos os países, o Brasil é o que apresenta o ritmo mais acelerado de mortalidade. Entre os países da América Latina, o Brasil deve ultrapassar o Peru e o México ainda no mês de abril ficando na triste liderança da mortalidade da região. Se a pandemia não for mitigada, o Brasil pode pular para o grupo das 10 nações com maior coeficiente de mortalidade até o mês de junho de 2021, ficando em companhia apenas de países de clima mais frio e de estrutura etária mais envelhecida.
O Ministério da Saúde registrou 3.438 vidas perdidas para o novo coronavírus no sábado (27/03), imediatamente anterior à Semana Santa. Foi um recorde absoluto e indesejado para qualquer dia, mas especialmente para um sábado. Foi também o terceiro dia com mais de 3 mil mortes na semana. Na quarta-feira (24/03) o Brasil atingiu 300 mil mortes e no sábado ultrapassou 310 mil falecimentos provocados pela covid-19. Desta forma, o trem pandêmico continua avançando em ritmo alucinante e fazendo vítimas em todo o território nacional. O expresso que fez as primeiras vítimas em 2020, deve superar as suas próprias marcas em 2021 e, mesmo sem o general Pazuello, já parte com atropelo para 2022. O novo Ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, tem dado algumas declarações sensatas, mas o seu receituário deveria ter sido adotado quando o “trem” ainda estava na estação de partida. O plano de imunização deveria ter sido planejado com antecedência e com uma logística adequada. Atualmente, a pandemia impõe desafios que devem ser tratados com grandeza de ideias, liderança e firmeza na ação. Mas estes valores parecem distantes dos dirigentes encastelados no Planalto.
Frase do dia 28 de março de 2020
“Não há vivos, há os que morreram e os que esperam a vez”
Carlos Drummond de Andrade (1902-1987)
Referências:
Agostinho Vieira. Covid-19: Brasil chega a 300 mil mortes. Quantas poderiam ter sido evitadas?, # Colabora, 24/03/2021
https://projetocolabora.com.br/ods3/brasil-chega-a-300-mil-mortes-pela-covid-19/
ALVES, JED. Diário da Covid-19: Na contramão da queda global, mortes sobem no Brasil, # Colabora, 14/02/2021 https://projetocolabora.com.br/ods3/na-contramao-da-queda-global-mortes-sobem-no-brasil/
José Eustáquio Diniz Alves é sociólogo, mestre em economia e doutor em Demografia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com pós-doutorado no Núcleo de Estudos de População (Nepo) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). É professor e pesquisador independente. Currículo Lattes em http://lattes.cnpq.br/2003298427606382