EUA enfrentam recorde de tornados com Meteorologia desfalcada

Em semana com mais 28 mortes provocadas por tornados, cientistas alertam que cortes promovidos pelo governo Trump podem afetar capacidade de previsão de fenômenos climáticos

Por Oscar Valporto | ODS 13 • Publicada em 23 de maio de 2025 - 08:52 • Atualizada em 23 de maio de 2025 - 13:42

Área devastada por tornado em Louisville, no estado do Kentucky: EUA enfrentam temporada intensa de tornados com serviços de meteorologia desfalcado após cortes promovidos pelo Governo Trump (Foto: Reprodução TV WHAS11 / ABC)

Entre sexta-feira (16/05) e terça (20/05), pelo menos 28 pessoas morreram nos estados americanos de Kentucky, Missouri, Kansas e Virgínia, após a passagem de tornados em série – a terceira vez este ano com sequências de dias com fenômenos assim, acompanhados de temporais e ventanias. Até o começo da semana, o Centro de Previsão de Tempestades – Storm Prediction Center – dos EUA já tinha registrado 883 relatos de tornados em 2025, o que representa um aumento de 35% em relação à média para esta altura do ano. O país registra, em média, 1200 tornados por ano: o número de tornados de 2025 caminha para superar o de 2024, o segundo pior ano na história.

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Com a nova série de tornados, cientistas alertaram as dificuldades enfrentadas pelo Serviço Nacional de Meteorologia (National Weather Service, NWS, na sigla em inglês) dos EUA, duramente atingidos pelos cortes nas agências federais promovidos pelo governo de Donald Trump. “Realmente não há pessoas suficientes para lidar com tudo”, disse o climatologista Howard Bluestein, professor de Meteorologia da Universidade de Oklahoma, que monitorou seis tornados no domingo. “Se a estação estiver com falta de pessoal, isso pode afetar a qualidade das previsões”, acrescentou.

Ex-diretor do Serviço Nacional de Meteorologia dos EUA de 2013 a 2022, o meteorologista Louis Uccellini disse à agência Associated Press que os cortes no orçamento reduziram drasticamente o número de lançamentos de balões meteorológicos, que fornecem informações cruciais para as previsões, destacando ainda que trabalhadores do serviço meteorológico não estão autorizados a viajar para ajudar a treinar as autoridades locais de desastres sobre o que fazer quando recebem alertas meteorológicos de perigo. “Quando você tem esse tipo de ameaça e há falta de pessoal em algum momento, algo vai passar despercebido”, alertou Uccellini, que também dirigiu os Centros Nacionais de Previsão Ambiental e atuou como representante dos EUA na Organização Meteorológica Mundial.

Pesquisadores afirmam que muitos centros de previsão estão com mais de 20% dos postos de trabalho vagos, após as demissões realizadas desde o começo deste segundo governo Trump. “As tecnologias usadas para prever tornados melhoraram significativamente, mas o radar não pode substituir uma equipe bem descansada que precisa descobrir o quão severas ou duradouras as tempestades serão e como levar as informações ao público”, disse cientista atmosférica Karen Kosiba, professora da Universidade de Illinois e diretora da Flexible Array of Mesonets and Radars (FARM), uma rede de equipamentos meteorológicos usados para pesquisa.

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Em abril, logo após a segunda sequência violenta de tornados do ano nos EUA com 18 mortes – a primeira, em março, fez mais de 40 vítimas -, dados obtidos pela Associated Press apontaram que, após os cortes de empregos do governo Trump, quase metade dos escritórios de previsão do tempo do NWS tinham taxas de vacância de 20%. “É uma situação de crise”, disse, na ocasião, Brad Colman, ex-presidente da Sociedade Meteorológica Americana, meteorologista responsável pelo escritório do serviço meteorológico em Seattle até o começo do ano. “Estou profundamente preocupado com a possibilidade de inevitavelmente perdermos vidas como resultado do risco adicional devido à falta de pessoal”, acrescentou.

Durante a sequência de tornados agora em maio, Rich Thompson, chefe de previsão de operações do Centro de Previsão de Tempestades do NWS no Oklahoma, assegurou que o trabalho continuava sendo feito. Mas reconheceu que os cortes de pessoal “tornaram tudo mais difícil” para o serviço de meteorologia. “Isso tornou difícil para os escritórios locais simplesmente garantir que todas as nossas tarefas importantes sejam cumpridas. A maioria das pessoas leva essas tarefas importantes a sério, então faremos o que for preciso para cobri-las”, disse Thompson à AP. “Espero que não fiquemos na mesma situação de pessoal a longo prazo. … Seria difícil sustentar isso por meses ou anos”.

Os cientistas lembram que tornados não são incomuns nesta época do ano, mas eles estão cada vez mais frequentes e imprevisíveis. “A umidade que estamos recebendo do Golfo do México é muito maior do que costumávamos receber”, apontou o professor Bluestein. “Isso aumenta a probabilidade de termos uma tempestade mais forte, o que é bastante incomum”, adicionou.

As temperaturas no Golfo estão alguns graus mais altas do que o normal para esta época do ano, de acordo com o serviço meteorológico. Para que os tornados se formem, a atmosfera precisa da colisão de ar quente e úmido do Golfo do México com sistemas de tempestades trazidos por frentes meteorológicas de oeste para leste. “No cenário de mudanças climáticas, estamos sobrecarregando a atmosfera em alguns dias e, em seguida, reduzindo essa carga”, explicou Jana Houser, professora de ciências atmosféricas da Universidade Estadual de Ohio.

Os cientistas também estão observando mais tornados em janeiro, fevereiro, março e outras épocas em que costumava ser frio demais para a formação de tornados, especialmente no Alabama, Geórgia, Mississippi e Tennessee.

No último fim de semana, o Kentucky foi o estado mais atingido, com um tornado devastador danificando centenas de casas, carregando veículos pelos ares e deixando dezenas de desabrigados; pelo menos 19 pessoas morreram no estado. Autoridades do Missouri disseram que 5 mil imóveis foram danificados, com telhados destruídos e linhas de energia elétrica derrubadas pelos tornados. Kentucky e Missouri estão na chamada Alameda dos Tornados (Tornado Alley), a área mais frequentemente atingida nos EUA.

Oscar Valporto

Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade

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