Protesto na COP29 contra a falta de responsabilidade dos países ricos no financiamento climático: COP30 enfrentará o imbróglio do financiamento climático (Foto: Kiara Worth / UN Climate Change - 24/11/2024)

COP30 enfrentará o imbróglio do financiamento climático: quem vai pagar a conta?

COP30 enfrentará o imbróglio do financiamento climático: quem vai pagar a conta?

Por Liana Melo ODS 13

Dada a complexidade dos fluxos financeiros e a diversidade de atores envolvidos, é crucial um novo contrato político e institucional capaz de impulsionar uma transformação justa

Publicada em 24 de julho de 2025 - 09:43 • Atualizada em 24 de julho de 2025 - 10:17

O imbróglio do financiamento climático continua e não será diferente na COP30, que ocorre em novembro, em Belém. É um tema recorrente e que se arrasta há pouco mais de três décadas, quando da adoção da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês). Considerado um pilar fundamental para viabilizar os investimentos necessários à mitigação e adaptação às mudanças climáticas, a demanda por recursos vem crescendo à medida que aumentam as necessidades reais de financiamento para manter o aquecimento global dentro dos limites do Acordo de Paris — entre 1,5°C e 2°C. Mas afinal, quanto custará resolver a crise climática e quem vai pagar a conta?

Leu essa? Transição energética: tema tabu na COP30

Um estudo do Grupo de Especialistas Independentes de Alto Nível em Financiamento Climático (IHLEG, na sigla em inglês) vem alertando que é necessário mobilizar, em média, US$ 6,5 trilhões anuais até 2030 e US$ 8 trilhões até 2035 para bancar a transição energética, a adaptação climática e a mitigação dos impactos das mudanças climáticas nos países mais vulneráveis. Pelos cálculos do grupo, mais da metade desse volume deverá ocorrer em mercados emergentes e países em desenvolvimento, que precisarão de cerca de US$ 2,4 trilhões por ano até 2030 (excluindo a China), e de US$ 3,3 trilhões até 2035.

Muitos dos países mais vulneráveis aos impactos da mudança do clima são também marcados por alta vulnerabilidade fiscal e níveis elevados de pobreza, o que os torna particularmente dependentes de recursos públicos e financiamento concessional, ou seja, um empréstimo ou ajuda financeira com condições mais favoráveis, como taxas de juros mais baixas ou prazos de pagamento mais longos

Maria Netto
Economista e diretora-executiva do Instituto Clima e Sociedade

O estudo aponta ainda que, deste montante, 40% virão do setor privado — dos quais US$ 400 a 500 bilhões deverão ser aportes internacionais. “Só que os fluxos privados internacionais efetivamente mobilizados hoje para países em desenvolvimento permanecem abaixo de US$ 30 bilhões por ano, ou seja, uma fração do necessário”, chama a atenção a economista Maria Netto, diretora executiva do Instituto Clima e Sociedade (iCS).

Embora seja urgente que os países desenvolvidos aumentem suas contribuições públicas internacionais — o que, de fato, não vem ocorrendo —, Netto defende que o debate sobre financiamento climático vá além do arcabouço tradicional da UNFCCC.

Gostando do conteúdo? Nossas notícias também podem chegar no seu e-mail.

Veja o que já enviamos

É necessário adotar uma abordagem mais abrangente e integrada, que considere múltiplas frentes. Em suma, garantir as finanças necessárias para a transição climática exige uma abordagem sistêmica, multissetorial e multinível”, defende Netto, comentando que é preciso reconhecer “a complexidade dos fluxos financeiros, a diversidade de atores envolvidos e a necessidade de um novo contrato político e institucional capaz de impulsionar uma transformação justa e eficaz.”

Temos uma demanda muito maior e crescente por financiamento, seja para mitigação, adaptação e perdas e danos, para nos prepararmos para esse novo clima que já contraímos

Stela Herschamnn
Especialista em Política Climática do Observatório do Clima

Para alavancar o financiamento climático, Netto defende, entre outras alternativas, um maior envolvimento dos bancos multilaterais de desenvolvimento, acesso facilitado dos países emergentes aos fundos climáticos e uma governança global adequada que vai além da Convenção do Clima e inclua fóruns como o G20, reformas do sistema financeiro internacional, maior integração entre agendas de clima, desenvolvimento e estabilidade financeira.

É fato que as necessidades de financiamento e as capacidades de acesso aos recursos públicos variam significativamente entre os países. Levar em conta essas diferenças, argumenta Maria Netto, será crucial nos próximos anos para o avanço de medidas eficazes de financiamento climático. “Muitos dos países mais vulneráveis aos impactos da mudança do clima são também marcados por alta vulnerabilidade fiscal e níveis elevados de pobreza, o que os torna particularmente dependentes de recursos públicos e financiamento concessional, ou seja, um empréstimo ou ajuda financeira com condições mais favoráveis, como taxas de juros mais baixas ou prazos de pagamento mais longos”, afirma a diretora do iCS.

Dívida climática

Para tentar converter compromissos em resultados e destravar o financiamento climático, o Brasil, que está na presidência a COP30, está produzindo, em parceria com o Azerbaijão, que sediou a COP29, um plano de voo: o “Roadmap de Baku a Belém”. A tentativa é mobilizar US$ 1,3 trilhão por ano até 2035 para que os países em desenvolvimento consigam fazer a transição climática – um esforço hercúleo, dado que a meta de financiamento climático ficou US$ 1 trilhão abaixo do que fora reivindicado no ano passado, na COP29.

Há muitas maneiras sutis de os países ricos demostrarem que não estão dispostos a contribuir financeiramente, como, por exemplo, fugindo das negociações sobre o tema”, analisa Stela Herschamnn, especialista em Política Climática do Observatório do Clima (OC). A não aprovação de um financiamento climático adequado ao enfrentamento da crise, tem feito a demanda por recursos não parar de crescer. “Temos uma demanda muito maior e crescente por financiamento, seja para mitigação, adaptação e perdas e danos, para nos prepararmos para esse novo clima que já contraímos.”

Gostando do conteúdo? Nossas notícias também podem chegar no seu e-mail.

Veja o que já enviamos

Até o ano passado, os países ricos eram responsáveis pelo aquecimento e, por isso, pelo custeio da mitigação de suas consequências – a regra estabelecida no Acordo de Paris foi flexibilizada na COP29. Desde então, os países ricos devem estar na “dianteira” desses esforços. “Essa decisão aumentou ainda mais a desconfiança e desconforto entre os países em desenvolvimento”, lembrou Herschamnn, comentando que, desde então, o financiamento climático de US$ 1,3 trilhão reivindicado pelos países em desenvolvimento passou a ser um roteiro importante de como as negociações podem atingir esse novo patamar de recursos na COP30.

Liana Melo

Formada em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Especializada em Economia e Meio Ambiente, trabalhou nos jornais “Folha de S.Paulo”, “O Globo”, “Jornal do Brasil”, “O Dia” e na revista “IstoÉ”. Ganhou o 5º Prêmio Imprensa Embratel com a série de reportagens “Máfia dos fiscais”, publicada pela “IstoÉ”. Tem MBA em Responsabilidade Social e Terceiro Setor pela Faculdade de Economia da UFRJ. Foi editora do “Blog Verde”, sobre notícias ambientais no jornal “O Globo”, e da revista “Amanhã”, no mesmo jornal – uma publicação semanal sobre sustentabilidade. Atualmente é repórter e editora do Projeto #Colabora.

Newsletter do #Colabora

A ansiedade climática e a busca por informação te fizeram chegar até aqui? Receba nossa newsletter e siga por dentro de tudo sobre sustentabilidade e direitos humanos. É de graça.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *