Tecnologia baiana premiada pela ONU Ambiente

Ana Luisa e o Aqualuz: dispositivo que purifica, por meio de radiação solar, a água da chuva captada em cisternas (Foto: ONU Ambiente)

Formada em Biotecnologia na UFBA e com bolsa do CNPq, jovem de 21 anos vence Jovens Campeões da Terra por sistema de purificação da água através de energia solar

Por Oscar Valporto | ODS 4ODS 6 • Publicada em 22 de setembro de 2019 - 11:42 • Atualizada em 10 de fevereiro de 2022 - 18:18

Ana Luisa e o Aqualuz: dispositivo que purifica, por meio de radiação solar, a água da chuva captada em cisternas (Foto: ONU Ambiente)

A baiana Anna Luisa Beserra tinha só 15 anos quando criou o Projeto Aqualuz. O objetivo era  purificar a água usada pelas famílias do semiárido sem usar produtos químicos. A ideia, de utilizar raios ultravioletas para purificação, foi inscrita no Prêmio Jovem Cientista, em 2013. Não ganhou, mas seu projeto levou menção honrosa na Olimpíada de Física da Bahia e conquistou o segundo lugar no Encontro de Jovens Cientistas da Bahia. Em 2014, Aqualuz, já aperfeiçoado, ganhou medalha de ouro na Olimpíada Nacional de Biologia. Após seis anos de novos ajustes, Anna Luisa acaba de vencer o Prêmio Jovens Campeões da Terra, concedido pela ONU Meio Ambiente, por desenvolver o dispositivo que purifica, por meio de radiação solar, a água da chuva captada em cisternas.

Formada em Biotecnologia pela Universidade Federal da Bahia, onde entrou aos 17 anos, antes mesmo de completar o ensino médio, ela ganhou uma bolsa do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) para desenvolver sua pesquisa: desde 2013, foram criadas 10 versões distintas do Aqualuz até Anna Luisa chegar à tecnologia atual, que purifica água não-potável usando a luz solar, sem produtos químicos ou filtros descartáveis.  “Meu propósito é levar o direito básico à água limpa para as comunidades carentes nas áreas rurais. Queremos ajudar a melhorar a vida das pessoas e salvar vidas”, disse a baiana de 21 anos à ONU News.

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De acordo com as Nações Unidas, as doenças diarreicas estão entre as principais causas de morte em todo o mundo, sendo diretamente ligadas à falta de água potável e à falta de saneamento e acesso à higiene. Esses problemas atingem principalmente populações jovens, vulneráveis ou que vivem em zonas rurais remotas. Anna Luisa e seu Aqualuz foram escolhidos porque a invenção é de baixo custo, fácil manutenção e pode durar até 20 anos. Embora tenha sido testada apenas no Brasil, o dispositivo, na avaliação da própria ONU, tem potencial para ser aplicado em outros países. No Nordeste, o Aqualuz já distribuiu água potável para 265 pessoas e alcançará mais 700 ainda este ano.

Anna Luisa também acredita no potencial de seu sistema.  “A gente não esperava o prêmio, foi uma grande surpresa. Agora, sabemos que não só vamos ter o retorno financeiro para investir no projeto, como também estamos abrindo portas para expandir a tecnologia para África, Ásia e outros países da América Latina”, acrescentou a jovem baiana. Ela pretende investir os US$ 15 mil (cerca de R$ 62 mil) da premiação na ampliação do Aqualuz. Outros US$ 9 mil (cerca de R$ 37 mil) são oferecidos pela ONU para investimento em “comunicação e comercialização, além de formação, orientação e convites para participar de reuniões de alto nível da ONU”.

Anna Luisa com o Aqualuz: formada em Biotecnologia pela Ufba, ela teve bolsa do CNPq para aperfeiçoar seu projeto de purificação da água (Foto: ONU Ambiente)
Anna Luisa com o Aqualuz: formada em Biotecnologia pela Ufba, ela teve bolsa do CNPq para aperfeiçoar seu projeto de purificação da água (Foto: ONU Ambiente)

Para desenvolver seu projeto, Anna Luísa criou a Safe Drinking Water For All (SDW), uma startup socioambiental que vem contando com a ajuda outros universitários e pesquisadores interessados no tema. “É um projeto simples e viável para ser desenvolvido nessas áreas. Basta bombear a água da cisterna para o equipamento. Primeiro, ela passa pelo filtro e as partículas sólidas que deixam o líquido escuro são retiradas. Depois disso segue para um reservatório, onde fica exposta ao sol por um período que vai de uma a quatro horas. O controle é feito por um sistema de monitoramento que avisa quando a água está pronta e o operador, assim, pode retirá-la diretamente da torneira”, explica a biotecnóloga, que está fazendo Pós-Graduação em Sistemas de Gestão Integrada de Qualidade, Segurança, Meio Ambiente e Sustentabilidade.

Além da SDW, Anna Luisa està à frente de outra startup, a AIA, com foco na criação de um biodigestor doméstico urbano para restos de comidas. Entrevistada pelo serviço em português da BBC após a conquista do prêmio, ela foi perguntada sobre o que diria ao presidente Jair Bolsonaro caso o encontrasse em Nova York, onde a baiana vai receber a premiação em cerimônia na próxima semana que coincidirá com a reunião anual da Assembleia Geral das Nações Unidas e a Cúpula de Ação Climática. “Eu diria ao presidente que, por favor, não desestimule a ciência e o empreendedorismo local. Se não houver estímulo, as pessoas vão se desmotivar”, disse a jovem, nascida em Salvador, que estudou em universidade federal e teve bolsa do CNPq, dois alvos dos cortes do governo na área de educação.

A cerimônia de entrega do prêmio está marcada par a sede da ONU no dia 26 de setembro. O Prêmio Jovens Campeões da Terra é concedido anualmente pela ONU Meio Ambiente, desde 2017, a jovens ambientalistas entre 18 e 30 anos, por suas destacadas ideias na área ambiental. Anna Luisa foi uma das sete vencedoras de África, América do Norte, América Latina e Caribe, Ásia e Pacífico, Europa e Ásia Ocidental. “Nosso planeta com estresse hídrico está sofrendo o peso da extração incessante, da poluição e da mudança climática. É vital encontrarmos novas formas de proteger, reciclar e reutilizar este precioso recurso. Tornar a água potável acessível e segura a todos e todas é vital para atingirmos os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável”, disse a diretora-executiva da ONU Meio Ambiente, Inger Andersen. No próximo ano, as iniciativas inovadoras dos campeões serão documentadas pela ONU nas mídias sociais por meio de atualizações regulares em notícias e vídeo-blogs.

A série #100diasdebalbúrdiafederal terminou, mas o #Colabora vai continuar publicando reportagens para deixar sempre bem claro que pesquisa não é balbúrdia.

Oscar Valporto

Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade

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