Quanto custa o desperdício de água no Brasil?

Mulheres carregam baldes na cabeça na favela de Paraisópolis, em São Paulo: acesso a água precisa ser universalizado. Foto Maurício Lima/AFP

Redução nas perdas de água tratada no país representariam um ganho de R$ 55 bilhões até 2034

Por Agostinho Vieira | ArtigoODS 6 • Publicada em 10 de outubro de 2023 - 11:45 • Atualizada em 25 de janeiro de 2024 - 16:52

Mulheres carregam baldes na cabeça na favela de Paraisópolis, em São Paulo: acesso a água precisa ser universalizado. Foto Maurício Lima/AFP

Que o recurso é essencial, todo mundo sabe, ninguém quer ficar sem água. Mas, e se o problema for na casa dos outros? No Brasil de hoje, em pleno século XXI, ainda existem 33 milhões de pessoas que sofrem com a ausência de água tratada. E uma das principais causas é a enorme ineficiência no controle de perdas do recurso hídrico. Cerca de 40% da água é desperdiçada antes de chegar nas torneiras, por conta de vazamentos, erros de medição e consumos não autorizados. Se considerarmos o desperdício em casa, na hora do banho, na lavagem de louça e na calçada “varrida” com água, o percentual seria muito maior.

Um estudo do Instituto Trata Brasil, feito em parceria com a GO Associados, mostrou que o volume total de água não faturada em 2021(último dado disponível), equivale a quase 8 mil piscinas olímpicas de água tratada desperdiçadas diariamente. Isso representa mais de sete vezes o volume do Sistema Cantareira, o maior conjunto de reservatórios do Estado de São Paulo. E qual é o custo dessa brincadeira? Em um cenário realista, com uma redução dos atuais 40% de desperdício para 25%, o potencial de ganhos brutos chegaria a R$ 54,8 bilhões até 2034. Como será necessário fazer alguns investimentos para garantir a redução, o ganho líquido seria da ordem de R$ 27 bilhões em 13 anos.

O aumento de temperatura global de 1,5ºC, com contribuição significativa das ações humanas, segundo o relatório recente do IPCC, contribui para esse processo de redução de superfície de água no Brasil. Foto Custódio Coimbra
O aumento de temperatura global de 1,5ºC, com contribuição significativa das ações humanas, segundo o relatório recente do IPCC, contribui para esse processo de redução de superfície de água no Brasil. Foto Custódio Coimbra

Mas os benefícios de uma gestão mais eficiente da água não se limitam ao ganho financeiro. Quando se considera apenas as perdas físicas, ou seja, os vazamentos, o volume de 3,8 bilhões de metros cúbicos seria suficiente para abastecer aproximadamente 67 milhões de brasileiros em um ano. Essa quantidade não somente equivale a pouco mais de 30% da população do país em 2021, como também representa cerca de duas vezes o número de habitantes sem acesso ao abastecimento de água nesse ano, em torno dos 33 milhões. Além disso, com a redução de 40% para 25%, já seria possível abastecer os 17,9 milhões de brasileiros que vivem nas favelas brasileiras por um ano e meio. Ao meio ambiente, a redução dessas perdas implicaria na disponibilidade de mais recurso hídrico para a população sem a necessidade de captação em novos mananciais. Com o cenário de mudanças climáticas, os desafios para a disponibilidade hídrica nos mananciais se tornam cada vez mais evidentes.

Como nada é tão ruim que não possa ficar pior, esse Índice de Perdas na Distribuição, como é chamado, só andou para trás nos últimos anos. Entre 2017 e 2021, houve um aumento de dois pontos percentuais no indicador. As perdas que eram de 38,3% passaram para 40,3%. Os maiores desperdícios acontecem nas regiões Norte e Nordeste, respectivamente com 51,16% e 46,15%. Mas a situação não melhora muito no resto país. O desperdício é de 38,5% no Centro-Oeste, 37,97% no Sudeste e 36,89% no Sul. Entre os estados, os mais eficientes são Goiás e Mato Grosso do Sul, seguidos por Paraná e Santa Catarina. O mais ineficientes são o Amapá e o Acre, acompanhados de perto por Roraima e Rondônia.

O Marco Legal do Saneamento estabelece que 99% da população brasileira deve ter o seu acesso garantido à água potável até 2033. Reduzir as perdas é um passo imprescindível para chegar a essa meta. Precisamos de políticas públicas, de investimentos e de uma consciência maior sobre a importância desse tema. O quadro atual é economicamente inviável, socialmente injusto e ambientalmente insustentável.

Agostinho Vieira

Formado em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Foi repórter de Cidade e de Política, editor, editor-executivo e diretor executivo do jornal O Globo. Também foi diretor do Sistema Globo de Rádio e da Rádio CBN. Ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo, em 1994, e dois prêmios da Society of Newspaper Design, em 1998 e 1999. Tem pós-graduação em Gestão de Negócios pelo Insead (Instituto Europeu de Administração de Negócios) e em Gestão Ambiental pela Coppe/UFRJ. É um dos criadores do Projeto #Colabora.

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