Diário da Covid-19: Sudeste registra mais óbitos do que nascimentos em abril

Brasil caminha para chegar a 700 mil mortes até o fim do ano. Pandemia também aumenta o número de divórcios e reduz o de casamentos

Por José Eustáquio Diniz Alves | ODS 3 • Publicada em 2 de maio de 2021 - 11:47 • Atualizada em 12 de maio de 2021 - 08:59

Coveiro caminha entre os túmulos das vítimas de covid-19 no cemitério Nossa Senhora Aparecida, em Manaus. Foto Michael Dantas/AFP. Abril/2021

O Brasil ultrapassou a marca de 400 mil vidas perdidas para a covid-19 em meio à lentidão do processo de vacinação. O mês de fevereiro de 2021 foi o mais letal da pandemia, até ser superado pelo mês de março e depois ultrapassado pelo mês de abril. Foram 66,6 mil mortes em março e 82,3 mil mortes em abril, sendo que no dia 25/04 o país atingiu mais de 195 mil mortes em 2021, superando as 194,9 mil vítimas fatais registradas em 2020. A tragédia sanitária fez com que, pela primeira vez na história, a região Sudeste registrasse mais óbitos do que nascimentos em abril de 2021.

A covid-19 não somente aumentou o número de mortes, mas também provocou o aumento dos divórcios, a diminuição dos casamentos e a redução do número de nascimentos. Assim, o decrescimento vegetativo, que é a diminuição da população sem considerar a migração, ocorreu no mês passado em São Paulo, Rio de Janeiro, com praticamente empate em Minas Gerais e Espírito Santo. Mas no conjunto da região Sudeste houve 84,1 mil nascimentos e 88,5 mil óbitos (uma redução de 5 mil pessoas no mês), como mostra o gráfico abaixo. O Rio Grande do Sul também apresentou decrescimento vegetativo com 10,6 mil nascimentos e 11,2 óbitos (redução vegetativa de 574 pessoas). Para o Brasil como um todo os nascimentos superaram os óbitos, mas por uma margem pequena quando comparada com os meses e os anos anteriores.

Gráfico com óbitos e nascimentos no Sudeste em abril

Nas últimas três semanas de abril o número de casos e de óbitos da covid-19 reduziram um pouco, embora permanecendo em um platô elevado. Tudo indica que haverá um certo declínio nas curvas epidemiológicas em maio, embora um novo surto não esteja descartado nos meses de junho a agosto. Infelizmente, o número de mortes vai continuar afetando a estrutura das famílias e o Brasil deve atingir meio milhão de vidas perdidas até o dia 05 de julho. Esta data é anterior à projeção que apresentamos no dia 28/03, no artigo “Brasil, desgovernado, segue em direção à marca de meio milhão de mortes” que projetava esta marca para o dia 14 de agosto. De fato, a projeção anterior foi conservadora e não retratou a velocidade do surto pandêmico. Com os novos números, apresentamos no gráfico abaixo uma outra projeção onde as 500 mil mortes serão atingidas em 68 dias, as 600 mil mortes serão atingidas 73 dias depois, no dia 15 de setembro e as 700 mil mortes serão atingidas após 107 dias, em 30 de dezembro de 2021. Embora o número de mortes seja elevado, a projeção abaixo também pode ser considerada conservadora, a despeito de 700 mil mortes no final do ano significar que o Brasil terá mais de 500 mil mortes em 2021, contra as 194,9 mil mortes de 2020.

No dia 01 de maio do ano passado escrevi aqui no #Colabora um artigo (Alves, 01/05/2020) dizendo que aquele era o Dia do Trabalho mais triste e ameaçador para os trabalhadores brasileiros, quando houve 5,9 mil pessoas infectadas e 428 mortes pela covid-19 em 24 horas. Um ano depois o quadro é muito mais grave com média móvel de 60 mil casos e 2,4 mil vidas perdidas no Dia do Trabalhador. Sem dúvida, o Brasil vive uma situação muito difícil e desafiadora e, infelizmente, não há soluções definitivas no curto e médio prazos.

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Três meses e meio depois do início do plano de imunização, o Brasil vacinou menos de 15% da população (cerca de 5% ao mês). Neste ritmo gastará cerca de 20 meses para imunizar 100% dos brasileiros. Segundo o site Our World in Data, o Brasil é o 58º país em número de doses administradas em relação à população. O país tem 2,7% da população mundial e conseguiu aplicar 3,8% de todas as vacinas globais. Apreensivamente, uma grande proporção da população desprotegida é um espaço aberto para a propagação de novas cepas do SARS-CoV-2 e para a possibilidade de uma terceira onda no inverno brasileiro.

O panorama nacional

Segundo o Ministério da Saúde, o Brasil atingiu 14,7 milhões de pessoas infectadas e 406,4 mil mortes pela covid-19, com uma taxa de letalidade de 2,8%, no dia 01 de maio. O gráfico abaixo mostra a média diária de casos nas diversas semanas epidemiológicas de 15 de março de 2020 a 01 de maio de 2021. Nota-se que o número de casos subiu rapidamente até o pico de 45,7 mil casos diários na semana de 19 a 25/07. A partir do final de julho o número médio de infectados, com algumas oscilações, caiu até o mínimo de 16,8 mil casos na primeira semana de novembro. Mas a partir daí teve início uma segunda onda de contágio que culminou com média de 77,1 mil casos diários na semana de 21 a 27 de março.  Nas semanas seguintes os números caíram, mas se mantendo em um alto platô na casa de 60 mil casos diários.

O gráfico abaixo mostra a média diária do número de casos da covid-19 por quinzenas de março de 2020 a abril de 2021. Nota-se que o pico da primeira onda ocorreu na quinzena de 01 a 15 de agosto de 2020 com 43,6 mil casos diários. Houve uma queda até 21,8 mil casos diários na primeira quinzena de novembro, mas os números voltaram a aumentar até 76,8 mil casos diários na segunda quinzena de março. O número de casos diminuiu em abril, mas ainda ficaram acima de 60 mil casos diários, indicando um nível muito elevado.

O gráfico abaixo mostra a média diária do número de casos da covid-19 para os meses de março de 2020 a abril de 2021 no Brasil. Nota-se que houve apenas 184 casos diários no mês de março de 2020, com aumento rápido até o pico de 40,7 mil casos diários no mês de julho, queda até 23,4 mil casos diários em outubro. A partir de dezembro a média diária já ficou acima do pico da primeira onda e cresceu até 70,9 mil casos diários em março de 2021. No mês de abril houve queda no número de casos, mas ainda se mantendo em alto platô.

O gráfico abaixo mostra a evolução do número diário de óbitos no Brasil. Na semana de 15 a 21 de março houve menos de 1 mil mortes diárias, mas aconteceu um salto para mais de mil mortes diárias na primeira semana de junho, se mantendo neste patamar até o início de agosto. No segundo semestre houve queda até 340 óbitos na semana de 01 a 07 de novembro. Mas a segunda onda foi forte, voltou para a casa de 1 mil mortes diárias em janeiro, chegou a 1,83 mil óbitos diários na semana de 07 a 13 de março e alcançou o pico geral de 3,02 mil óbitos diários na semana de 04 a 10 de abril de 2021. Nas últimas 3 semanas o número de mortes diminuiu, mas se mantem em alto patamar, acima de 2,4 mil óbitos diários.

O gráfico abaixo mostra a média diária do número de óbitos da covid-19 por quinzenas de fevereiro de 2020 a abril de 2021 no Brasil. Nota-se que houve apenas 13 óbitos diários na segunda quinzena de março e deu um salto para 1.069 óbitos na segunda quinzena de julho. No segundo semestre o número caiu para 394 óbitos diários na quinzena de 01 a 15 de novembro, mas subiu para 1.623 óbitos diários de 01 a 15 de março e atingiu o pico geral de 2.929 óbitos diários de 01 a 15 de abril. O número de vidas perdidas caiu para 2.556 óbitos diários na segunda quinzena de abril. Mesmo com a queda, o número de vítimas fatais é mais de duas vezes superior do que o pico da primeira onda.

O gráfico abaixo mostra a média diária do número de óbitos da covid-19 para os meses de março de 2020 a abril de 2021. Nota-se que o primeiro pico aconteceu em julho de 2020 com 1.061 óbitos diários. Os números ficaram abaixo deste patamar até janeiro de 2021. Mas deram um verdadeiro salto mortal em março com 2.148 óbitos diários e com 2.654 óbitos diários em abril. Portanto, os meses de fevereiro, março e abril foram os meses mais letais da pandemia. Talvez os números caiam um pouco em maio de 2021, mas uma terceira onda, com um pico ainda mais elevado, não é uma hipótese que possa ser descartada. O mês de abril teve menos casos que o mês de março, mas teve mais mortes.

O panorama global

O planeta ultrapassou 151 milhões de pessoas infectadas e chegou a 3,2 milhões de vidas perdidas para a covid-19 no Dia do Trabalho, 01/05/2021. A taxa de letalidade ficou em 2,1% e as médias móveis de 7 dias mantiveram a tendência de alta com 823 mil casos diários e 13,4 mil óbitos diários, segundo o site Our World in Data, com base nos dados da Universidade Johns Hopkins.

O gráfico abaixo, mostra a média diária de casos nas diversas semanas epidemiológicas de 22 de março de 2020 a 01 de maio de 2021. Nota-se que o número de casos subiu rapidamente de março até o pico de 643 mil casos diários na semana de 13 a 19/12. Houve uma pequena queda no final do ano passado e um novo pico ocorreu na semana de 03 a 09 de janeiro de 2021 com 728 mil casos diários. Houve grande queda até o mínimo de 363 mil casos na semana de 14 a 20 de fevereiro A partir do final de julho o número médio de casos, com algumas oscilações, caiu até o mínimo e um novo surto, liderado pela Índia, com o pico geral de mais de 820 mil casos nas duas últimas semanas de abril. Portanto, o mundo está experimentando o maior volume de transmissão do novo coronavírus de toda a pandemia.

O gráfico abaixo mostra a média diária do número de casos da covid-19 por quinzenas de fevereiro de 2020 a abril de 2021. Nota-se que até meados de março o número de casos diários estava abaixo de 7 mil, mas subiu rapidamente até 699 mil casos diários na primeira quinzena de janeiro de 2021. O número de casos diários diminuiu até 386 mil na segunda quinzena de fevereiro, mas subiu novamente e bateu todos os recordes na quinzena 16 a 30 de abril com 821 mil casos diários.

O gráfico abaixo mostra a média diária do número de casos da covid-19 para os meses de janeiro de 2020 a abril de 2021. Nota-se que o número de casos estava abaixo de 100 mil até maio de 2020, ultrapassou 391 mil casos em outubro de 2020 e atingiu o pico de 630 mil casos em janeiro de 2020. Os números caíram em fevereiro e março e bateram todos os recordes de 726 mil infectados por dia no mês passado. Portanto, abril foi o mês com maior número de pessoas infectadas, em grande parte devido ao tsunami de casos da Índia que ultrapassou 400 mil infectados no dia 30 de abril.

O gráfico abaixo mostra a evolução do número diário de óbitos no mundo. Na primeira semana de março houve menos de 1 mil mortes diárias, mas deu um salto para o primeiro pico que aconteceu na semana de 12 a 18 de abril com 7 mil mortes diárias. Nas 26 semanas seguintes os números variaram, mas foram sempre menores do que o pico de abril, atingindo 6,5 mil na última semana de outubro. Todavia, os números subiram até o pico da 2ª onda ocorreu na semana de 24 a 30 de janeiro, com 14,1 mil óbitos. Nas semanas seguintes os óbitos diários diminuíram até a média de 8,5 mil vidas perdidas na semana de 07 a 13 de fevereiro. Mas o volume de vítimas fatais voltou a subir e atingiu 13,4 mil óbitos na semana passada.

O gráfico abaixo mostra a média diária do número de óbitos da covid-19 por quinzenas de fevereiro de 2020 a abril de 2021. Nota-se que até final de março o número de óbitos diários estava abaixo de 2,5 mil, mas subiu rapidamente até o pico de 6,6 mil óbitos na primeira quinzena de abril. Nas quinzenas seguintes os números ficaram abaixo deste patamar até atingir 8,2 mil óbitos na primeira quinzena de novembro, que marcou o início da 2ª onda que culminou com 13,6 mil óbitos na segunda quinzena de janeiro de 2021. O número de vidas perdidas caiu até 8,6 mil óbitos na primeira quinzena de março, mas voltaram a subir e atingiram 12,9 mil óbitos diários na quinzena de 16 a 30 de abril de 2021.

O gráfico abaixo mostra a média diária do número de óbitos da covid-19 para os meses de janeiro de 2020 a abril de 2021. Nota-se que o primeiro pico aconteceu em abril de 2020 com 6,4 mil óbitos diários. Os números ficaram abaixo deste patamar até outubro de 2020, mas voltaram a subir em novembro e atingiram o pico geral em janeiro de 2021. O volume de vítimas fatais caiu em fevereiro e março, mas subiu em abril e atingiu 11,8 mil óbitos diários.

A covid-19 já atingiu mais de 220 países e territórios. No dia 01 de março de 2020, havia somente 1 país com mais de 10 mil casos confirmados de Covid-19 (a China) e havia 5 países com valores entre 1 mil e 10 mil casos (Irã, Coreia do Sul, França, Espanha, Alemanha e EUA). No dia 01 de abril já havia 50 países com mais de 1 mil casos, sendo 36 países com montantes entre 1 mil e 10 mil casos, 11 países com números entre 10 mil e 100 mil e 3 países com mais de 100 mil casos (nenhum país com mais de 1 milhão de casos).

No primeiro dia de 2021 já havia 175 países com mais de 1 mil casos e 18 países com mais de 1 milhão de casos. Os números continuaram aumentando e em 01 de maio de 2021 foram contabilizados 193 países com mais de 1 mil casos, sendo 38 entre 1 mil e 10 mil casos, 64 países entre 10 e 100 mil casos, 65 países entre 100 mil e 1 milhão de casos e 26 países com mais de 1 milhão de casos.

A lista dos 26 primeiros colocados do ranking, com a data em que chegaram à marca de 1 milhão, são: EUA (27/04), Brasil (19/06), Índia (16/07), Rússia (01/09), Espanha (15/10), Argentina (19/10), França (23/10), Colômbia (24/10), Turquia (28/10), Reino Unido (31/10), Itália (11/11); México (15/11),  Alemanha (26/11), Polônia (02/12), Irã (03/12), Peru (22/12), Ucrânia (24/12), África do Sul (26/12), Indonésia (26/01), República Tcheca (01/02), Holanda (06/02), Chile, Canadá (05/4), Romênia (09/04), Iraque (21/04) e Filipinas (26/04). (01/04/2021). São cada vez mais países com cada vez mais pessoas contaminadas pelo novo coronavírus.

A pandemia atingiu todos os países e todos os continentes do mundo, se transformando em um acontecimento global sem precedentes históricos, se considerarmos os tamanhos da população e da economia internacional. Alguns países como Nova Zelândia, Taiwan e Vietnã controlaram a pandemia por meio de uma excelente barreira sanitária, de uma testagem em massa e de um rastreamento e monitoramento dos doentes. Outros países e territórios, como Gibraltar e Israel conseguiram vacinar a grande maioria da população e estão apresentando baixas taxas de mortalidade. Porém, o mundo já vacinou mais de 1 bilhão de habitantes e o número de pessoas infectadas continua batendo recordes sucessivos, enquanto o número de mortes se aproxima, lamentavelmente, do pico ocorrido em janeiro.

O triste destaque atual é a Índia que tem superado todas as marcas anteriores, com média móvel de 3 dias na casa de 400 mil casos e ao redor de 3.500 óbitos em 24 horas. Com isso, ela supera todas as cifras anteriores estabelecidas pelos EUA. A tragédia da Índia é tão apavorante que tirou o foco do drama brasileiro. A população indiana é quase 7 vezes maior do que população brasileira e os números absolutos são realmente colossais. Mas em termos de coeficiente de incidência o Brasil tem 284 casos diários por milhão de habitantes e a Índia 265 casos por milhão. Em termos de coeficiente de mortalidade o Brasil tem 12 óbitos por milhão, enquanto a Índia tem 2,4 óbitos diários por milhão de habitantes. Os dois países juntos possuem cerca de 20% da população mundial e estão apresentando cerca de 50% dos novos casos e novas mortes. A Índia e o Brasil são dois gigantes que estão sucumbindo diante de um vírus microscópico. E o pior, estão arrastando o mundo para uma situação ingovernável e para um desastre sem fim, embora totalmente evitável se houvesse governos capazes de estabelecer uma sinergia com a sociedade civil e de colocar em prática as ações preconizadas nos livros textos das epidemias.

Frase do dia 02 de maio de 2021

“Um problema sem solução é um problema mal colocado”

Ralph Waldo Emerson (1803-1882)

Referências

ALVES, JED. Diário da Covid-19: Dia do Trabalhador com ameaças ao emprego e à vida, #Colabora, 01/05/2020

ALVES, JED. Diário da Covid-19: Brasil, desgovernado, segue em direção à marca de meio milhão de mortes, #Colabora, 28/03/2021

José Eustáquio Diniz Alves

José Eustáquio Diniz Alves é sociólogo, mestre em economia, doutor em Demografia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar/UFMG), pesquisador aposentado do IBGE, colaborador do Projeto #Colabora e autor do livro "ALVES, JED. Demografia e Economia nos 200 anos da Independência do Brasil e cenários para o século" (com a colaboração de F. Galiza), editado pela Escola de Negócios e Seguro, Rio de Janeiro, 2022.

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