Diário da Covid-19: Brasil tem seis estados em situação de emergência

País responde por quase metade dos casos da América do Sul e cerca de 60% das mortes registradas no continente

Por José Eustáquio Diniz Alves | ODS 3 • Publicada em 11 de abril de 2020 - 09:45 • Atualizada em 14 de abril de 2020 - 10:57

Em Hanói, no Vietnã, jovem caminha na rua usando máscara, como parte do esforço nacional de isolamento. Foto Manan Vatsyayana/AFP

Na Sexta-feira Santa, os números oficiais confirmaram o Brasil com mais de 1 mil mortes e o mundo com mais de 100 mil mortes. E a escalada do vírus continua sem descanso no Sábado de Aleluia. De acordo com o Ministério da Saúde estão em estado de emergência para o coronavírus o Distrito Federal e os estados do Amazonas, Amapá, São Paulo, Ceará e Rio de Janeiro.

O Brasil, com 210 milhões de habitantes, já possui números de casos (20 mil) e número de mortes (1,1 mil) superiores aos números registrados em todo o continente africano, que hospeda 1,34 bilhão de habitantes

O panorama nacional

O boletim do Ministério da Saúde da tarde do dia 10/04 indicou 19.638 casos e 1.057 mortes pela covid-19, com uma taxa de letalidade de 5,4%.

O Brasil ficou em 14º lugar no ranking internacional do número de casos e no 11º lugar no ranking do número de mortes. O Brasil está atrás de Suíça, Turquia e Canadá, em número de casos, mas encontra-se na frente destes 3 países em número de mortes.

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No território nacional, a pandemia se espalha de maneira diferenciada e irregular. Os cinco estados com maiores números de casos são, pela ordem decrescente, São Paulo (8,2 mil), Rio de Janeiro (2,5 mil), Ceará (981 casos), Amazonas (981 casos) e Minas Gerais (698 casos), conforme mostra o gráfico abaixo. Com menos de 50 casos estão Alagoas, Sergipe, Piauí, Rondônia e Tocantins, este último é a única Unidade da Federação (UF) sem mortes registradas pelo coronavírus.

Minas Gerais, que é o segundo estado mais populoso do país, está em quinto lugar em número de casos. Considerando o coeficiente de incidência populacional, o Brasil tem, em média, 7,5 casos para cada 100 mil habitantes. A distribuição regional mostra que as 6 UFs com maior incidência são, pela ordem decrescente, Amazonas (19,1/100 mil), Distrito Federal (16,7), São Paulo (14,5), Ceará (14,1), Amapá (12,4) e Rio de Janeiro (11,2/100 mil). O Piauí tem a menor incidência com 0,9/100 mil. O Ministério da Saúde considera que estas 6 UFs em vermelho no gráfico abaixo estão em emergência. Roraima está em atenção e as UFs em verde estão em alerta.

O panorama global

O dia 10 de abril encerrou com 1,7 milhão de casos e 102,7 mil mortes registradas no mundo, com uma taxa de letalidade de 6%.

Na série histórica, a maior variação diária absoluta global do número de casos ocorreu no dia 03 de abril, com 101,6 mil casos e a segunda maior ocorreu dia 10/04 com 96,4 mil casos. E a maior variação diária absoluta do número de mortes ocorreu dia 07 de abril, com 7,4 mil mortes e a terceira no dia 10/04 com 7 mil óbitos.

A distribuição da pandemia do novo coronavírus não segue um padrão único no mundo, mas apresenta ritmos diferentes no espaço e no tempo. A Ásia, que foi a origem da pandemia, estava em 3º lugar entre os continentes e apresentou 275 mil casos no dia 10/04 (4,2% maior do que no dia anterior) e 10,2 mil mortes (3,3% mais do que no dia 09/04), com uma taxa de letalidade de 3,7% no dia 10/04. A Europa, que assumiu o epicentro da difusão do novo coronavírus, registrou 820,1 mil casos no dia 10/04 (5,3% mais do que no dia anterior) e 70,1 mil mortes (6,4% a mais do que no dia 09/04), com uma taxa de letalidade de 8,5% (a maior entre os continentes). A América do Norte (incluindo América Central) assumiu a segunda posição e teve 536,8 mil casos no dia 10/04 (7,3% acima do dia anterior) e 19,8 mil mortes (12,2% acima do dia anterior), com taxa de letalidade de 3,7%.

A América do Sul vem em quarto lugar, apresentando 45 mil casos (13,6% a mais do que no dia 09/04) e 1,8 mil mortes (12% a mais do que no dia 09/04) e uma taxa de letalidade de 4%. A África apresentou 13,5 mil casos no dia 10/04 (5,1% a mais do que no dia anterior) e 697 mortes (10,3% a mais do que no dia anterior) e uma taxa de letalidade de 5,1%. Os números da Oceania são 7,6 mil casos (1,8% a mais do que em 09/04) e 56 mortes (7,7% a mais do que no dia 09/04), com uma taxa de letalidade de somente 0,7%.

As maiores taxas de crescimento estão nas Américas e as menores na Oceania. Nota-se que a pandemia começou na Ásia, pulou para a Europa e agora cresce com mais intensidade no continente americano (do Norte e do Sul).

Podemos observar que o Brasil possuía 1,2% dos casos de covid-19 e 1% das mortes do mundo no dia 10/04. Concentrava, no mesmo dia, 43,7% dos casos e 58,4% das mortes da América do Sul. E o mais impressionante é que o Brasil acumula mais casos e mais mortes do que todo o continente africano, além de apresentar taxas de variação mais elevadas. Realmente podemos falar, ainda que de maneira triste e irônica, que o Brasil é um continente.

Explosão de mortes: colapso do sistema de saúde e colapso dos cemitérios

Desde o início da pandemia de covid-19, os mais diversos analistas chamam a atenção para a necessidade de “achatar a curva” do crescimento do número de pessoas infectadas para não sobrecarregar o sistema de saúde e para possibilitar o tratamento dos doentes, pois uma curva alongada significa mais pessoas nas UTIs, em menos tempo, podendo até criar uma “escolha de guerra” daqueles que serão abandonados às estatísticas de morte. O não achatamento da curva de óbitos significa também o colapso dos cemitérios que não estão preparados para sepultar tantas pessoas em tão pouco tempo. Em Nova Iorque, uma das cidades mais ricas e avançadas tecnologicamente do mundo, muitas vítimas da pandemia estão sendo enterradas em valas comuns. Na Sexta-feira Santa, imagens aéreas da agência Associated Press mostraram essa triste realidade em um campo em Hart Island, uma ilha perto do Bronx. Como será nas megalópoles brasileiras?

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Estudos mostram que o efeito da pandemia é muito mais amplo, pois existe um tsunami de subnotificações. Enquanto a Islândia lidera a aplicação de testes, existem países que sequer têm ideia da dimensão da pandemia em seus territórios. Segundo o site Worldometer, a proporção de testes para detectar o vírus foi de 20.625 por 1 milhão na Suíça, 15.730 por 1 milhão na Alemanha, 7.652 por 1 milhão nos EUA e somente 296 por 1 milhão no Brasil e 137 por 1 milhão na Índia

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Mulheres nos espaços de poder e a mitigação da pandemia

Uma das lições que podem ser aprendidas com a pandemia de covid-19 é que o mundo precisa urgentemente de um número maior de mulheres nos mais altos níveis políticos das nações. Um dos exemplos mais ilustrativos do poder feminino ocorre na Nova Zelândia, país dirigido por uma inspiradora primeira-ministra, Jacinda Ardern. Ela estabeleceu uma política firme de combate ao novo coronavírus e estimulou os neozelandeses a serem o primeiro país ocidental a buscar a eliminação dos danos da covid-19. No dia 10 de abril, o lindo país da Oceania tinha 1.283 casos, com apenas 2 mortes.

Embora o continente europeu esteja na liderança do número de casos e de mortes, dois países se destacam dos demais: a Islândia e a Finlândia. Na Finlândia, a primeira-ministra Sanna Mirella Marin, de apenas 34 anos – do Partido Social-Democrata – tem implementado políticas de contenção do vírus que resultam em números baixos para o padrão europeu: 2.769 casos e 48 mortes (bem abaixo dos números de outros países nórdicos como Suécia e Noruega).

Mesmo Ângela Merkel, que enfrenta grandes dificuldades na Alemanha, tem tido um desempenho melhor do que as lideranças do sexo oposto, como Emmanuel Macron, da França, Giuseppe Conte, da Itália, Pedro Sánchez, da Espanha, Boris Johnson, do Reino Unido e, especialmente, Donald Trump, dos Estados Unidos.

Destaque cabe também à primeira-ministra islandesa, Katrín Jakobsdóttir – do partido Esquerda Verde – que liderou um esforço nacional para fazer testes precoces e amplos para identificar a prevalência e a letalidade do vírus, visando reduzir a epidemia na paradisíaca e gelada ilha do Atlântico Norte, com 340 mil habitantes. Segundo o site Worldometer, a Islândia apresenta a maior taxa de testes realizados para detectar o novo coronavírus e já testou 10% da população (100 mil em 1 milhão). O resultado são 7 mortes, um dos menores números da Europa, menor inclusive do que em países minúsculos como Luxemburgo (54 mortes), San Marino (34 mortes) e Andorra (26 mortes).

Um tsunami de subnotificações

Os números de novos casos de pessoas infectadas pela covid-19 e o número de mortes não para de crescer e são cada dia mais assustadores. Porém, diversos estudos mostram que o efeito da pandemia é muito mais amplo, pois existe um tsunami de subnotificações. Enquanto a Islândia lidera a aplicação de testes e o conhecimento sobre as necessidades de cuidado médico da população, existem países que sequer têm ideia da dimensão da pandemia em seus territórios. Segundo tabela do site Worldometer, a proporção de testes para detectar o vírus foi de 20.625 por 1 milhão na Suíça, 15.730 por 1 milhão na Alemanha, 7.652 por 1 milhão nos EUA e somente 296 por 1 milhão no Brasil e 137 por 1 milhão na Índia.

Na quinta-feira, durante apresentação do Ministério da Saúde, o secretário de Vigilância em Saúde, Wanderson de Oliveira disse que o Brasil tem “127 mil casos” aguardando a “investigação laboratorial”. Ou seja, a pandemia é muitas vezes maior do que mostram os já assustadores dados subenumerados.

Por que o mundo não ouviu Alexander von Humboldt?

Estamos nos 250 anos do nascimento do grande cientista, geógrafo e ambientalista alemão Friedrich Wilhelm Heinrich Alexander von Humboldt (14/09/1769 – 06/05/1859). De maneira absolutamente pioneira, ele antecipou a visão da Terra como um organismo vivo e integrado. Há mais de 200 anos, depois de uma visita ao continente americano que começou em 1799, ele esboçou uma teoria científica, chamada ‘Naturgemälde’. Trata-se de um termo alemão que traduz a ideia de unidade ou todo, mostrando que o Planeta Terra deveria ser interpretado como um imenso organismo vivo e que os seres humanos deveriam respeitar a natureza e não implementar um modelo  desregrado de dominação e exploração do meio ambiente. As pessoas precisam da natureza, a natureza não precisa das pessoas. Se não escutamos Humboldt, pelo menos vamos lê-lo na quarentena.

José Eustáquio Diniz Alves

José Eustáquio Diniz Alves é sociólogo, mestre em economia, doutor em Demografia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar/UFMG), pesquisador aposentado do IBGE, colaborador do Projeto #Colabora e autor do livro "ALVES, JED. Demografia e Economia nos 200 anos da Independência do Brasil e cenários para o século" (com a colaboração de F. Galiza), editado pela Escola de Negócios e Seguro, Rio de Janeiro, 2022.

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