Atentado em comunidade tradicional da Bahia causa revolta e indignação

Fumaça, poeira e rejeitos tóxicos da mineração afetam os moradores de Angico dos Dias. Foto Thiago Ripper

Três pessoas foram baleadas em Angico dos Dias, comunidade de fundo de pasto marcada por grilagem de terras e avanço da mineração

Por Ligia Coelho | ODS 16 • Publicada em 6 de setembro de 2023 - 11:14 • Atualizada em 21 de novembro de 2023 - 19:28

Fumaça, poeira e rejeitos tóxicos da mineração afetam os moradores de Angico dos Dias. Foto Thiago Ripper

Dois dias depois de ter dividido, junto com outras comunidades tradicionais, o prêmio Dom Helder Câmara, da Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias (Embrapa), a comunidade de fundo de pasto de Angico dos Dias – no município de Campo Alegre de Lourdes, no norte da Bahia – sofreu violento atentado no último sábado (02/09/2023). Três pessoas foram baleadas e se encontram hospitalizadas; pelo menos uma delas em estado grave. Duas das vítimas são lideranças rurais da comunidade. O terceiro atingido é um agente da Comissão Pastoral da Terra (CPT) da Diocese de Juazeiro (BA).

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De acordo com relatos dos moradores, os tiros teriam sido disparados por José Dias Soares Neto, conhecido como Zé do Salvo, que estaria envolvido em tentativas de grilagem de terras na região. Moradores relatam ainda que dois policiais civis – um deles de Campo Alegre de Lourdes – teriam participado do ataque, dando cobertura e disparando contra os posseiros.

Desde o dia 25 de agosto, as famílias camponesas da comunidade de Angico dos Dias têm denunciado invasão na área de fundo de pasto, na divisa com os municípios de Caracol e Guaribas (PI), próximo ao Parque Nacional da Serra das Confusões, área de preservação ambiental. Segundo nota da CPT de Juazeiro, funcionários que dizem estar a serviço da empresa Terra Quente Agropecuária, de propriedade do português Carlos Manuel Subtil Duarte, teriam desmatado a vegetação nativa, transportando maquinário e material para o local. Também teriam feito perfurações no solo, colocando postes de energia e iniciando uma construção.

Comunidade de Fundo de Pasto, em Angico dos Dias, que trabalha com agricultura familiar e pecuária. Foto Thiago Ripper
Comunidade de Fundo de Pasto, em Angico dos Dias, que trabalha com agricultura familiar e pecuária. Foto Thiago Ripper

Solidariedade

O atentado causou revolta na comunidade, mobilizando lideranças e entidades numa rede de solidariedade e apoio. Em nota, o bispo da Diocese de Juazeiro, Dom Beto Breis, condenou o ataque e denunciou o avanço da Mineradora Galvani sobre o território das comunidades tradicionais, conforme divulgado aqui no #Colabora, no dia 26 de julho último (https://projetocolabora.com.br/ods12/sistemas-agricolas-tradicionais-superam-preconceitos-e-ganham-visibilidade/). “Temos acompanhado com indignação a situação da comunidade de Angico dos Dias, no município de Campo Alegre de Lourdes, que sofre os efeitos da presença da Mineradora Galvani e seu desrespeito à população local e ao meio ambiente.  Associado a esse drama, que perdura há mais de quinze anos, surgiram nos últimos anos grileiros invadindo área de comunidade de fundo de pasto”, diz a nota.

A CPT de Juazeiro está prestando assessoria jurídica à comunidade e cobra providências das autoridades, com investigação rigorosa e punição dos culpados. O bispo encerra a nota rogando que os moradores da comunidade “permaneçam firmes na resistência” e pedindo “que seja ouvida sua voz e suas reivindicações”.

Políticos como o deputado federal Josias Gomes (PT/BA) também repudiaram o ataque. Em nota, o parlamentar lembrou ainda o recente assassinato, na Bahia, da líder religiosa Mãe Bernadete, “por sua corajosa defesa das terras quilombolas”. Atualmente, a Bahia ocupa o primeiro lugar, no ranking dos estados brasileiros mais violentos.

Ligia Coelho

É jornalista há mais de 40 anos. Entre outros veículos, passou pelo jornal Última Hora, TV Manchete e assessorias de imprensa. Trabalhou como jornalista concursada da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, de onde se aposentou após dez anos. Em 2002, venceu o Concurso de Monografias Giovanni Falcone, na categoria jornalista, promovido pela Associação de Magistrados do Estado do Rio de Janeiro (Amaerj), sobre o tema “Direito à privacidade e liberdade de expressão”.

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