No segundo dia do ciclo “#Colabora6anos – Seis debates fundamentais”, para comemorar o sexto aniversário do projeto #Colabora, a questão do meio ambiente foi tratada pelo viés da economia sustentável. O foco central do encontro girou em torno de uma questão aparentemente irreconciliável: a elaboração de iniciativas que convirjam para a preservação da biodiversidade e simultaneamente gerem crescimento econômico. Em resumo, como explorar economicamente os variados biomas do Brasil sem devastá-los.
Leu essa? Economia de baixo carbono não é mais opção. Virou uma obrigação
As atuações em seus respectivos campos, o engajamento e o entusiasmo com as suas atividades constituíram a tônica das falas dos participantes, instigados ainda por provocações colocadas pelo mediador da mesa, deixaram claro que essa convergência, apesar de complexa, é viável. Ela envolve mais do que investir em monoculturas que gerem commodities com selo verde. É preciso ir além e valorizar formas que preservem a cultura e o saber tradicional.
Mediado pelo jornalista e editor do #Colabora, Agostinho Vieira, a mesa reuniu Kátia Favilla, antropóloga e secretária-executiva da “Rede Cerrado”, além de uma das coordenadoras da iniciativa “Tô no Mapa”, aplicativo para automapeamento de povos e comunidades do Brasil; Nélida Tainá, estudante de engenharia florestal da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e líder da etnia terena da Terra Indígena de Taunay-Ipegue; além de Francisco Costa, pesquisador do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (Naea) da Universidade Federal do Pará (UFPA). O debate contou com o apoio do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia).
Gostando do conteúdo? Nossas notícias também podem chegar no seu e-mail.
Veja o que já enviamosFavilla iniciou o debate fazendo um contraponto à ideia de Rubens Ricúpero, ex-ministro da Fazenda e de Meio Ambiente no governo de Itamar Franco, de que o Brasil tem vocação para ser uma potência ambiental. Para a antropóloga, a potencialidade econômica dos biomas do país está no uso de sua sociobiodiversidade, isto é, um olhar que considere a riqueza ambiental e a diversidade social. Para isso, defendeu a valorização do saber tradicional, como alternativa à tendência ao agronegócio por via da monocultura exportadora. Em vez de olhar para os produtos como commodities, considerar os biomas em seu conjunto, inclusive o savoir-faire local.
Não à toa, ela considera o projeto de automapeamento fundamental, para desconstruir a ideia de que muitos biomas, como a Amazônia e o Cerrado, são constituídos de vazios populacionais. Para ela, um mapa, com sua sociobiodiversidade esquadrinhada, preenche física e simbolicamente esses territórios. Segundo Favilla, o mapa permite que as pessoas visualizem um território não só físico, mas simbólico também, em torno do qual se constituem formas de vida, demandas e direitos. “O mapa é uma ferramenta política”, conclui.
Francisco Costa debruçou-se sobre a complexidade da questão, considerando o que chamou de economia real, feita de sujeitos reais, referindo-se à subsistência do dia a dia. Segundo ele, o saber e as tecnologias tradicionais precisam dialogar com a economia real. A partir daí, torna-se viável construir um futuro baseado numa bioeconomia real. Costa citou o exemplo dos terroirs em algumas regiões europeias, que se mostraram uma exploração inteligente do potencial econômico da sociobiodiversidade.
Referindo-se ao que classificou como bioeconomia real, ele apresentou números impressionantes, tomando como exemplo 30 produtos, como o açaí e a castanha. Segundo Costa, em 2019, esse tipo de economia gerou R$ 5,4 bilhões envolvendo diversos segmentos, como indústria e comércio, e empregou 224 mil pessoas.
Tainá, por sua vez, emocionou por seu entusiasmo e envolvimento nos projetos de que participa e coordena nas aldeias de sua etnia. Ela fez um balanço da luta contra a expansão do agronegócio sobre áreas tradicionais, sobretudo indígenas. Segundo ela, é preciso ir além do lucro e pensar nos produtos dos biomas brasileiros como um bem para a população. Segundo Tainá, essas iniciativas alternativas ajudam a preservar igualmente as tradições e fixar as famílias na região. “Não pensamos apenas no dinheiro, mas no que vamos deixar para as próximas gerações.”, disse.