ODS 1
Ocupação Esquenta COP: a arte em defesa da natureza

Exposição inédita de Claudia Andujar, conhecida por suas fotos dos Yanomamis, é destaque de iniciativa do Museu do Amanhã, no Rio

Criado com o objetivo de “explorar o presente e imaginar o futuro”, o Museu do Amanhã inaugura agora o projeto Ocupação Esquenta COP, com três exposições com foco na crise climática – o maior desafio do presente que ameaça o futuro da humanidade e do planeta. O projeto busca antecipar os debates da COP30, a Conferência de Clima da ONU, marcada para novembro em Belém, com destaque para a exposição inédita ‘Claudia Andujar e seu Universo: Sustentabilidade, Ciência e Espiritualidade’, inspirada no trabalho da fotógrafa e ativista que dedicou boa parte de sua vida à defesa dos indígenas Yanomami e dos povos da floresta.
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A exposição reúne 130 obras de Claudia Andujar – suíça naturalizada brasileira, hoje com 94 anos – e peças de outras 40 artistas que se relacionam ao seu trabalho. “A obra de Claudia antecipa questões levantadas pelos ODS (Objetivos do Desenvolvimento Sustentável), ampliando esse olhar para outras dimensões. São temas sobre o seres humanos, sobre a preservação da natureza, sobre as desigualdades, sempre com esse olhar amplo”, contou o crítico Paulo Herkenhoff, curador de ‘Claudia Andujar e seu Universo’.
A exposição é dividida em cerca de 30 núcleos temáticos – de séries célebres que retratam a Amazônia, como “A floresta” (1972-1974) e “A casa” (1974), a retratos de Clarice Lispector e de migrantes de São Paulo. “A mostra observa como ela lidou com questões de ciência, conservação e natureza, e funciona como rizoma estelar em conexão com os universos de outros artistas”, disse Herkenhoff, um dos curadores mais importantes do país. Rizoma, termo originado da botânica, foi utilizado por filósofos para descrever uma maneira de encarar o indivíduo, o conhecimento e as relações entre pessoas, ideias e espaços, a partir de uma perspectiva de fluxos e multiplicidades. “A exposição busca ser um periscópio que focaliza diversos pontos de sua obra”, acrescentou o curador aos jornalistas.
Outras duas exposições também estão abertas desta sexta, (18/07): “Água Pantanal Fogo” reúne fotos de Lalo de Almeida e Luciano Candisani que formam um retrato dramático do bioma e sua destruição; a coletiva “Tromba d’água” reúne 27 obras de 14 mulheres latinas, que tratam da relação do feminino com a natureza. Com estas mostras, o Museu do Amanhã inaugura 1.200m² de espaço expositivo e aproveita a coincidência da celebração de seu 10º aniversário, em dezembro, com a realização da COP30 no Brasil (em novembro) para reforçar seu papel no enfrentamento à crise climática. “Todos estamos sentindo literalmente na pele as mudanças climáticas, mas ainda assim esse debate parece distante da maior parte da população. E o Museu do Amanhã tem um público amplo, que vai muito além do público mais habituado a ir as museus; então, temos uma responsabilidade de levar esse debate a esse público”, explicou Nina Pougy, gerente de Desenvolvimento Científico do Museu do Amanhã.
Além das três abertas agora em julho nas galerias principais, estão previstas outras três a partir de setembro em novos espaços (praça, lounge e praça lateral) e a atualização do Antropoceno, com novo vídeo da exposição permanente do museu. Mas o projeto Ocupação Esquenta COP não fica restrita às mostras. No grande lobby do museu, será montado uma arena para receber programação diversa: aulões com cientistas, encontros com convidados especiais, rodas de conversa, palestras, oficinas e apresentações musicais. “A ideia é ter uma programação diária, a partir de agosto, nessa arena aberta, que será um espaço de debate democrático, diverso e plural com foco nas questões climáticas”, contou Camila Oliveira, gerente de conteúdo do Museu do Amanhã.
Além da arena aberta, outros espaços também vão integrar a Ocupação Esquenta COP: o Auditório será aberto para sessões de cinema e também para a série Papos Quentes que terá convidados como a ex-ministra Izabella Teixeira, o cientista Paulo Artaxo e a líder indígena Txai Suruí e o Térreo Educativo com atividades voltadas principalmente para jovens, inclusive crianças. “Nós também vamos usar a área externa, voltada para a Praça Mauá, onde circula um público que não necessariamente chega ao museu para motivar as conversas sobre as mudanças climáticas”, acrescentou Camila.
Para Fábio Scarano, curador do Museu do Amanhã, a Ocupação COP não poderia ter início mais adequado do que a exposição de Claudia Andujar. “A obra de Cláudia antecipa questões sobre clima, perda de biodiversidade, desigualdade. A ciência vem alertando sobre a crise climática há tempos, mas a mensagem não está entrando nos corações e mentes. A arte e a espiritualidade podem ser de grande ajuda nesse diálogo”, apontou Scarano, professor de Ecologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
A exposição ‘Claudia Andujar e seu Universo: Sustentabilidade, Ciência e Espiritualidade’ coloca os trabalhos da fotógrafa ao lado de outros artistas – de nomes consagrados como Cildo Meirelles, Frans Krajcberg, Mario Cravo Neto, Milton Guran de Sebastião Salgado a artistas indígenas como Tirry Pataxó, Xadalu Tupã Jekupé, Maspã Huni Kuin e Denilson Baniwa. “É uma rede que representa esse universo aberto por ela”, disse Paulo Herkenhoff que, na quarta-feira (16/07), ciceroneou a própria Claudia Andujar, que completou 94 anos em junho, num passeio pela exposição.
Pouco antes da inauguração das exposições na quinta (17/07), Herkenhoff lembrou que Claudia foi “intimada” por Darcy Ribeiro a conhecer a floresta e documentar as sociedades indígenas. “A conservacionista Claudia Andujar colocou sua câmera a serviço da natureza. Sua produção fotográfica denunciou diante do mundo o genocídio dos povos indígenas da América do Sul, o genocídio, a espoliação das terras e dos saberes indígenas, o garimpo ilegal, inclusive como o envenenamento dos rios amazônico pelo uso do mercúrio”, escreveu o curador na apresentação da exposição.
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As mulheres e a água
Outras duas mostras do projeto Esquenta COP já estão em exibição a partir desta sexta. A exposição Tromba d’Água reúne 27 trabalhos de catorze artistas latino-americanas – Alice Yura, Azizi Cypriano, Guilhermina Augusti, Jeane Terra, Luna Bastos, Marcela Cantuária, Mariana Rocha, Marilyn Boror Bor, Natalia Forcada, Rafaela Kennedy, Roberta Holiday, Rosana Paulino, Suzana Queiroga e Thais Iroko. Com entrada gratuita, as obras estão expostas na Galeria Leste: são pinturas, esculturas, fotografias e videoarte, que refletem sobre histórias e saberes transmitidos por mulheres que enfrentam e rompem barreiras.
De acordo com o Instituto Aristas Latinas, que organizou a mostra, o fenômeno natural Tromba D’Água serve como metáfora de transformação coletiva. “Todas as catorze artistas convidadas para ocupar este espaço traduzem, em poéticas próprias, a relação direta e subjetiva com a principal fonte da vida humana e suas principais controvérsias e desdobramentos sociais, raciais e econômicos”, escrevem as curadoras Ana Carla Soler, Carolina Rodrigues e Francela Carrera, destacando a relação do feminino com a natureza.

O Pantanal e o fogo
Na Galeria do Tempo, onde há necessidade de comprar ingresso, a exposição “Água Pantanal Fogo” reúne fotos de Lalo de Almeida e Luciano Candisani, premiados fotodocumentaristas brasileiros, que têm se dedicado a retratar o bioma como uma forma de dar visibilidade aos seus dramas e desafios. Lalo fotografou o Pantanal durante os incêndios de 2020 e 2024, quando o fogo destruiu cerca de 25% da vegetação do Pantanal e provocou a morte de 17 milhões de animais vertebrados. Suas imagens circularam pelo mundo, ajudaram a alertar sobre a gravidade do problema e deram a ele o prestigiado prêmio World Press Photo.
Luciano Candisani – vencedor do prêmio Wildlife Photographer of the Year, em 2012 – passou parte de seu tempo na última década submerso no Pantanal. Suas imagens resultaram num acervo importante para embasar pesquisas e mostrar ao mundo a urgência no combate aos crimes ambientais. “Lalo de Almeida e Luciano Candisani são cronistas visuais que elegem temas sensíveis para investigar por longos períodos, em parceria com cientistas e pesquisadores. Esta mostra busca gerar novas consciências não apenas sobre a situação do Pantanal, mas também acerca de nossas atitudes erráticas, que poluem o ar, os rios e os mares, causando danos por toda parte”, escreveu o fotógrafo Eder Chiodetto, curador da exposição, fruto de parceria entre o Museu de Amanhã e o Instituto Tomie Othake, onde já foi exibida em 2024.
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Oscar Valporto
Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade