ODS 1
Meta do Acordo de Paris insuficiente para salvar gelo polar

Estudo aponta que aumento de 1,5º C na temperatura global provocará degelo descontrolado e a aceleração do aumento do nível do mar

Pesquisa liderada por cientistas da Universidade de Durham, no Reino Unido, aponta que os esforços para limitar o aumento da temperatura global a 1,5º grau Celsius acima da era pré-industrial, meta climática estabelecida pelo Acordo de Paris, serão insuficientes para evitar que as camadas de gelo polar do mundo derretam e causem mudanças profundas nas áreas costeiras. A perda de massa nas camadas de gelo é, atualmente, o maior fator para a elevação do nível do mar e, de acordo com o estudo publicado na revista científica Communications Earth and Environment, deve causar “migração catastrófica para o interior”.
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A equipe de pesquisadores revisou evidências, incluindo imagens de satélite, para examinar o efeito que a meta de 1,5º C teria sobre as imensas camadas de gelo da Groenlândia e da Antártida, que juntas armazenam gelo suficiente para elevar o nível global do mar em quase 65 metros. “Sabemos há muito tempo que algum aumento do nível do mar é inevitável nas próximas décadas ou séculos, mas observações recentes de perda de camadas de gelo são alarmantes, mesmo nas condições climáticas atuais”, afirmou o glaciologista Chris Stokes, professor e pesquisador do Departamento de Geografia da Universidade de Durham e autor principal do estudo.
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Veja o que já enviamosDe acordo com os pesquisadores, a massa de gelo perdida dessas camadas de gelo quadruplicou desde a década de 1990: atualmente elas estão perdendo cerca de 370 bilhões de toneladas de gelo por ano – com níveis de aquecimento de cerca de 1,2 º C, em média, acima das temperaturas pré-industriais (meados do século XIX), com base no último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas (ONU). O aquecimento de 1,5º C – em uma média de 20 anos – “provavelmente geraria vários metros de elevação do nível do mar nos próximos séculos, à medida que as camadas de gelo derretem em resposta ao aquecimento do ar e das temperaturas do oceano”, alerta o estudo.
Os pesquisadores trabalham com base em períodos mais longos. Em 2024, contudo, a temperatura média global do planeta ultrapassou pela primeira vez a marca de 1.5°C, comparado aos níveis pré-industriais. Em 11 meses do ano, a média ficou acima do limite do Acordo de Paris: 2024 foi o ano mais quente da história. “Limitar o aquecimento a 1,5°C seria uma grande conquista e esse deve ser o nosso foco. No entanto, mesmo que essa meta seja atingida ou apenas temporariamente excedida, as pessoas precisam estar cientes de que a elevação do nível do mar provavelmente vai acelerar a taxas muito difíceis de se adaptar – taxas de um centímetro por ano não estão fora de questão em algumas décadas, durante a vida de nossos jovens”, afirmou o professor Chris Stokes na apresentação do estudo.
A pesquisa indica que a meta deveria ser mais próxima de 1°C grau para evitar perdas significativas das camadas de gelo polares e impedir uma aceleração adicional na elevação do nível do mar. O meio grau adicional, de acordo com os pesquisadores, tornaria muito difícil e muito mais caro a adaptação à elevação do nível do mar, “causando extensas perdas e danos às populações costeiras e insulares e levando ao deslocamento generalizado de centenas de milhões de pessoas”. O estudo publicado lembra que cerca de 230 milhões de pessoas vivem hoje a menos de um metro do nível do mar e o derretimento do gelo representa uma ameaça existencial para essas comunidades, incluindo países inteiros com baixa altitude.
O glaciologista Chris Stokes participou das últimas três Conferências do Clima da ONU (as COPs de Sharm El-Sheik, Dubai e Baku) e frisa que formuladores de políticas e governos precisam estar mais cientes dos efeitos que um aumento de 1,5°C nas temperaturas pode ter sobre as camadas de gelo e o nível do mar. “Não estamos necessariamente dizendo que tudo está perdido em 1,5 grau, mas estamos dizendo que cada fração de grau realmente importa para as camadas de gelo – e quanto mais cedo conseguirmos deter o aquecimento, melhor, porque isso torna muito mais fácil retornar a níveis mais seguros no futuro”, disse.
Para o pesquisador da Universidade de Durham, especialista em geleiras, a aceleração do degelo está fora de controle. “Basta voltarmos ao início da década de 1990 para encontrar uma época em que as camadas de gelo pareciam muito mais saudáveis”, afirmou o professor Stokes, lembrando que as temperaturas globais estavam cerca de 1 °C acima da era pré-industrial naquela época e as concentrações de dióxido de carbono eram de 350 partes por milhão, um limite muito mais seguro para a Terra. As concentrações de dióxido de carbono estão atualmente em torno de 424 partes por milhão e continuam a aumentar.

Oscar Valporto
Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade