Dinamam Tuxá: ‘Se o Brasil quer liderar a pauta ambiental, precisa inserir os indígenas na discussão’

Líderes querem tratamento de diplomatas na COP30, mais protagonismo nas discussões climáticas e inclusão de demarcações de terras no documento final da conferência

Por Liana Melo | ODS 13 • Publicada em 25 de abril de 2025 - 09:38 • Atualizada em 25 de abril de 2025 - 10:06

Dinamam Tuxá no Acampamento Terra Livre: indígenas querem protagonismo na COP30 e demarcações de terras no documento final (Foto: Fábio Pozzebom / Agência Brasil)

Mil indígenas já receberam a credencial para participar da Conferência do Clima, a COP30, em Belém. A delegação terá acesso a zona Azul, área restrita onde acontecem as negociações oficiais entre os países. Mais do que os crachás para participarem das reuniões, os indígenas querem ter voz nas discussões climáticas e querem ser tratados como diplomatas. As negociações entre o governo brasileiro, anfitrião da conferência, e a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês) estão avançando, mas o status ainda não foi concedido.

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“Nós queremos maior protagonismo na COP30. O contexto no Brasil é controverso. Se o país quer liderar a pauta ambiental, ele precisa inserir os indígenas na discussão”, pontua Dinamam Tuxá, um dos sete coordenadores executivos da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), representando as Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme).  Ele também é assessor jurídico da entidade. “Sabemos que parte dessa decisão não compete ao governo brasileiro, porque é uma conferência do clima global, mas não queremos apenas aparecer nas fotos. Queremos estar nos espaços de tomada de decisão”.

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Garantir que a demarcação de terras indígenas esteja nos acordos oficiais, como parte da solução para a crise climática, é a pauta que unifica o movimento indígena mundial. Na zona Azul, metade da delegação será de indígenas brasileiros e a outra parte de representantes do mundo todo. Junto com outras entidades do movimento, a Apib pretende levar à COP30, em novembro, em Belém, entre três mil e cinco mil indígenas brasileiros – um número bem mais expressivo do que ocorreu em conferências anteriores.

Avançar com as demarcações é uma forma de alcançar a meta de redução do desmatamento

Dinamam Tuxá
coordenador da Apib

“A regularização fundiária dos territórios indígenas é um compromisso inadiável, porque só assim será possível o Brasil cumprir o Acordo do Clima de Paris”, analisa Dinamam Tuxá, explicando que esse é um dos sete eixos temáticos da NDC indígena. Usada pelos diplomatas envolvidos nas negociações climáticas quando querem se referir as contribuições nacionalmente determinadas, a NDC traduz o esforço dos países para cortar suas emissões de gases de efeitos estufa.

Apenas 19 países dos 197 que fazem parte da Convenção do Clima apresentaram suas NDCs no prazo, que venceu em fevereiro último. A NDC indígena foi anunciada pela Apib no último dia 10 (de abril), durante a 21ª edição do Acampamento Terra Livre (ATL) em Brasília – o principal ato do movimento indígena.

Faltando sete meses para a realização da COP30, o governo ainda não anunciou nenhuma demarcação de terra indígena este ano. Para o movimento indígena, a demarcação deve ser incluída como uma das metas climáticas. “Avançar com as demarcações é uma forma de alcançar a meta de redução do desmatamento”, comentou Tuxá.

Já virou uma espécie de tradição anunciar novas demarcações durante o ATL. Em 2024, por exemplo, o número de demarcações anunciado durante a ocupação dos indígenas em Brasília ficou abaixo do esperado; no encontro deste ano, a decepção foi ainda maior – nenhuma demarcação foi anunciada. Em 2024, foram demarcadas duas terras indígenas e em 2023, um total de seis.

Dinamam Tuxá em reunião em Brasília: mais de mil indígenas já credenciados para a COP30, em Belém (Foto: Adi Spezia / Cimi)
Dinamam Tuxá em reunião em Brasília: mais de mil indígenas já credenciados para a COP30, em Belém (Foto: Adi Spezia / Cimi)

Apesar de zero demarcações em 2025 e do episódio de violência contra os manifestantes durante o ATL deste ano, Tuxá avalia que o encontro foi positivo. Além de ter sido anunciada a meta climática, os indígenas passaram seus recados. Em alto e bom som, criticaram a criação da mesa de conciliação do Supremo Tribunal Federal para discutir o marco temporal, tese que já foi considerada inconstitucional pelo STF, e pediram o fim dos combustíveis fósseis.

Outros avanços apontados por Dinamam Tuxá no ATL deste ano foram a criação do Círculo dos Povos e da Comissão Indígena Internacional, que conta com a parceria de países da Bacia Amazônica, das Austrália e de ilhas do Pacífico. Liderado pela ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, o Círculo dos Povos foi criado para garantir que os  conhecimentos, saberes e experiências dos povos indígenas, comunidades tradicionais e afrodescendentes sejam considerados na construção de soluções para o problema climático. 

No âmbito a COP30, os dois fóruns vão garantir um espaço de diálogo com os povos indígenas, com o objetivo de garantir a sua representação e o reconhecimento dos seus conhecimentos tradicionais nas negociações sobre o clima. “Mas queremos mais”, reforça Tuxá, referindo-se ao status de indígenas diplomatas e lembrando que, nas últimos cinco COPs, os indígenas têm cobrado uma maior participação nesses espaços de tomadas de decisões.

 

 

 

Liana Melo

Formada em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Especializada em Economia e Meio Ambiente, trabalhou nos jornais “Folha de S.Paulo”, “O Globo”, “Jornal do Brasil”, “O Dia” e na revista “IstoÉ”. Ganhou o 5º Prêmio Imprensa Embratel com a série de reportagens “Máfia dos fiscais”, publicada pela “IstoÉ”. Tem MBA em Responsabilidade Social e Terceiro Setor pela Faculdade de Economia da UFRJ. Foi editora do “Blog Verde”, sobre notícias ambientais no jornal “O Globo”, e da revista “Amanhã”, no mesmo jornal – uma publicação semanal sobre sustentabilidade. Atualmente é repórter e editora do Projeto #Colabora.

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