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A corrida brasileira e a busca por um mecanismo global de adaptação

ODS 13 • Publicada em 9 de novembro de 2022 - 09:00 • Atualizada em 10 de novembro de 2022 - 10:39

Sharm el-Sheikh, Egito – Há poucos dias, desembarquei no Egito para participar da 27ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP27), iniciada em 6 de novembro, na cidade litorânea de Sharm el-Sheikh. Eu e mais dezenas de milhares de participantes vindos de 190 países, entre os quais destaco: 33 449 inscritos, mais de 500 pessoas só na delegação brasileira e cerca de 90 chefes de estado. No auge dos 28 graus do outono egípcio, a maior e mais importante cúpula do clima promete movimentar a rotina e a agenda da cidade – e do mundo.

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Vamos começar pelas contradições. Um episódio curioso que me ocorreu quando fui buscar o meu visto no Consulado do Egito foi um breve comentário que ouvi enquanto esperava a minha vez. “Todo ano, fazemos essas conferências, viagens, lá se vão zilhões de emissões aéreas, enquanto os problemas globais parecem piorar em looping”, disseram ironicamente. Me despedi dela tentando perseguir outras facetas de esperança dessa verdade. Convenhamos, não é verdade?

Com as contradições ainda em vista, foquemos em facetas de esperança. Embora o foco desta COP27 seja justamente as promessas feitas pelo Acordo de Paris, em 2015, já começamos em déficit. Segundo o relatório 2022 Nationally Determined Contributions Synthesis Report, recém lançado pelo secretariado da Convenção Clima (UNFCCC), além de mostrar que as forças-tarefas dos países no momento seguem insuficientes para limitar o aquecimento global em 1,5oC até o final do século, comprovam que estamos anos-luz de uma ambição fidedigna ao cenário catastrófico que se impõe.

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Não é da minha praxe jornalística adjetivar títulos e leads como catástrofe para atrair atenção editorial, mas honestamente não consigo encontrar nenhum outro caminho narrativo para ressaltar a dramaticidade climática que vivemos mundialmente. São perdas e danos historicamente legitimados e exacerbados pelo colapso climático. É um pouco disso (e, claro, muitas outras pendências) que traz líderes à mesa de negociação na COP27: a busca de um mecanismo global de adaptação, sobretudo para os países do sul global.

De acordo com um relatório do World Resources Institute (WRI), a ambição global precisa crescer seis vezes mais para frear a crise climática. Seis vezes mais. Enquanto isso, as regiões mais vulnerabilizadas pelos extremos climáticos são as que menos apresentam preocupação com a problemática: Oriente Médio e Norte da África (27,4%) e Sul da Ásia (39,1%).

Abertura do Brazil Climate Action Hub na COP27: debate sobre mulheres na ação climática (Foto: Eduardo Carvalho / Brazil Hub)
Abertura do Brazil Climate Action Hub na COP27: debate sobre mulheres na ação climática (Foto: Eduardo Carvalho / Brazil Hub)

Enquanto seguimos na expectativa de chegar ao fim desta conferência com encaminhamentos sistêmicos que decidam futuros mais equitativos e justos, não podemos deixar de ressaltar que há três Brasis na COP27, o que só reforça a representação política fragmentada. Primeiro, o mais belo, diverso e pulsante de todos de que é, sem dúvidas, o Brazil Climate Action Hub. A casa da sociedade civil brasileira, criada em 2019, promete lotar a audiência nos próximos dias. Segundo, o pavilhão do Consórcio da Amazônia Legal, que é literalmente calouro na conferência. O terceiro, e eu diria menos importante nesta estação política, é o oficial do governo brasileiro. Como bem sabemos, ele é teatral, pois simplesmente não representa o movimento ambientalista do Brasil. Felizmente, os seus dias estão contados!

A abertura do Brazil Climate Action Hub foi bastante festiva. A casa estava cheia, com muitos rostos, corpos e vozes do Brasil. Começamos com um tema muito caro: mulheres na ação climática trazendo várias perspectivas interseccionais. “Eu sou água, eu sou terra, eu sou bioma”, entoou em alta voz a liderança indígena Shirley Krenak, na língua de seu povo (localizado no leste de Minas Gerais), convidando a plateia para cantar em uníssono. O primeiro debate e os seguintes estão disponíveis aqui em português e inglês!

Muita gente tem me perguntado se eu realmente acho que esta será a cúpula da justiça climática? Manchetes, diferentes lideranças e organizações estão disseminando este lema. Enquanto especialista-aprendiz no tema, penso que – indubitavelmente – é um questionamento bastante provocativo se considerarmos o cenário local no qual a conferência global é sediada e a presença em peso de delegações de populações historicamente minorizadas em diferentes sociedades. Não podemos esquecer que apenas quatro COPs foram sediadas no continente africano até hoje. A verdade é dilacerante: em uma realidade geográfica estraçalhada por tantas injustiças sociais, raciais, econômicas, de gênero e geracionais, acho um tanto quanto otimista intitular a COP assim. Contudo, sem otimismo parece que a gente não sobrevive. Então, prefiro acreditar que sim.

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