Área de Floresta Amazônica em Roraima: Fundo para florestas é aposta do Brasil para a COP30 (Foto: MMA - 06/03/2023)

Fundo para florestas é aposta do Brasil para a COP30

Fundo para florestas é aposta do Brasil para a COP30

Por Oscar Valporto ODS 12ODS 15

A ser lançado em Belém, o TFFF vai usar recursos aplicados no mercado financeiro para remunerar países que conservem suas florestas tropicais

Publicada em 10 de outubro de 2025 - 09:30 • Atualizada em 10 de outubro de 2025 - 11:18

No primeiro dia da COP26, em Glasgow (2021), os países aprovaram um acordo para reduzir as emissões globais de metano em 30% em 2030 em relação a 2020; no primeiro dia da COP28, em Dubai (2023), foi aprovado a criação do Fundo de Perdas e Danos para compensar os países mais afetados pela crise climática; na abertura da COP29, a presidência do Azerbaijão conseguiu o apoio de quase 190 nações para regras básicas do mercado de carbono. Os organizadores das Conferências do Clima da ONU vem se esforçando para começar o encontro com boas notícias: a aposta do Brasil para a COP30 é o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (Tropical Forests Forever Fundo, TFFF na sigla em inglês), novo modelo de financiamento para preservação.

A proposta, articulada pelo Brasil desde a COP28, tem como objetivo remunerar países pela conservação das florestas tropicais e o governo brasileiro acredita que seus mecanismos têm potencial para transformar o TFFF em um dos maiores fundos multilaterais do mundo, beneficiando mais de 70 países com florestas. O Brasil quer lançar o TFFF logo nos primeiros dias da COP30, com aportes significativos. Na semana passada, o presidente Lula anunciou uma doação de US$ 1 bilhão de dólares para o fundo e a expectativa é que até a conferência de Belém, de 10 a 21 de novembro, outros países anunciem aportes.

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Ao realizar pagamento por florestas em pé, protegidas de desmatamento e degradação em biomas como a Mata Atlântica, a Amazônia, as florestas da Bacia do Congo, na África, e do Mekong/Borneo, na Ásia, o TFFF reconhece serviços ambientais fundamentais prestados por estes ambientes em todo o mundo e sua importância para a sustentação de atividades econômicas. “Nós sabemos que as florestas tropicais são fonte da estabilidade climática, porque elas retêm carbono e garantem ciclos hídricos. Mais de 80% da biodiversidade terrestre de todo o mundo está nas florestas tropicais. Logo, elas fornecem serviços ecossistêmicos para a humanidade a nível global. O que o TFFF busca é que o mundo remunere parte desses serviços. É remunerar as florestas como base da vida, como base da economia, pelo nosso bem-estar”, explica André Aquino, assessor especial de Economia e Meio Ambiente do MMA (Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima).

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Citado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seu discurso na 80ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), o TFFF ganhou um evento especial em Nova York para a apresentação da iniciativa, que foi organizado pelo Brasil e pela própria ONU. “O Brasil vai liderar pelo exemplo e se tornar o primeiro país a se comprometer com investimento no fundo de US$ 1 bilhão”, disse Lula, convidando parceiros e outros países presentes ao evento a apresentarem “contribuições igualmente ambiciosas” para o lançamento do Fundo Florestas Tropicais para Sempre na COP30.

Como não faz parte da agenda oficial da Conferência do Clima em Belém, o TFFF não depende da aprovação dos países membros para ser lançado. O governo brasileiro trabalha na articulação com os outros envolvidos – países investidores e nações com florestas tropicais em seus territórios – para fazer o lançamento na COP30. A expectativa é usar a COP da Floresta para ser uma COP para as florestas de todo o mundo, com a formalização do novo fundo.

Lula e Marina, com representantes da ONU e do Banco Mundial, no evento do Fundo Florestas para Sempre em Nova York: aplicações no mercado financeiro para remunerar conservação ambiental (Foto: Fernando Donasci / MMA - 23/09/2025)
Lula e Marina, com representantes da ONU e do Banco Mundial, no evento do Fundo Florestas para Sempre em Nova York: aplicações no mercado financeiro para remunerar conservação ambiental (Foto: Fernando Donasci / MMA – 23/09/2025)

Como o fundo vai ser financiado

De acordo com o MMA, o TFFF é um mecanismo financeiro – um ‘fundo fiduciário’, semelhante aos mecanismos de financiamento de universidades americanas (‘endowments’), em que investimentos iniciais são aplicados no mercado financeiro para garantir o funcionamento sustentável das instituições. A expectativa é que as nações investidoras e outras fontes garantam um aporte de US$ 25 bilhões de dólares (capital júnior, no jargão do mercado financeiro) nos primeiros anos do TFFF. Com esta injeção, o Brasil acredita que será possível alavancar mais US$  100 bilhões de dólares (capital sênior) do setor privado nos próximos anos.

Os governos, ao aceitarem o papel de capital júnior, se comprometem em incorrer em um risco um pouco maior do que o setor privado, atraindo estes investidores privados. Os organizadores do fundo, entretanto, destacam que os governos e seus parceiros iniciais são investidores e não doadores. “São doadores e não investidores porque eles poderão ter retorno”, explica André Aquino.

Este valor inicial vai ser investido em mercados de capitais. O retorno desse investimento vai ser deduzido do pagamento aos investidores iniciais: a diferença (‘spread’, no jargão do mercado) vai ser distribuída para a conservação ambiental das florestas. As projeções apontam que o mecanismo deverá viabilizar 4 bilhões de dólares anuais – o valor dessa diferença – para a conservação, o que representa, de acordo com o MMA, um valor próximo do triplo do volume aplicado atualmente para a proteção das florestas tropicais por meio de recursos concessionais. O fundo gestor do TFFF não poderá fazer aplicações que envolvam combustíveis fósseis; prioridade será optar por ações e títulos de governos e companhias de países emergentes e produtos considerados verdes.

Os recursos disponibilizados pelo TFFF serão repassados aos países com florestas tropicais, que contarão com uma fonte de recursos previsível e em grande escala para financiar objetivos de longo prazo. Com o Fundo Florestas Tropicais para Sempre, os organizadores esperam que os pagamentos aos países sejam adicionais aos recursos do orçamento hoje empregados para a conservação das florestas, que são extremamente limitados.

Além do Brasil, outros cinco países estão envolvidos na articulação do fundo e devem fazer aportes: Alemanha, Reino Unido, França, Noruega e Emirados Árabes (os quatro países europeus são parceiros tradicionais do Fundo Amazônia). O TFFF conta ainda com o apoio de cinco países com florestas tropicais – Colômbia, Gana, República Democrática do Congo, Indonésia e Malásia – que poderão fazer aportes iniciais menores. O governo brasileiro espera ainda, nesta fase inicial, apoio de fundos filantrópicos privados envolvidos na preservação do meio ambiente.

Levantamento do MMA aponta 74 países com florestas elegíveis para integrar o fundo (Arte: MMA)
Levantamento do MMA aponta 74 países com florestas elegíveis para integrar o fundo (Arte: MMA)

Como as florestas serão beneficiadas pelo fundo

De acordo com Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, o TFFF funcionará como um mecanismo de pagamento por resultado. Cada país – que aderir ao fundo para as florestas – vai receber um valor baseado na área, em número de hectares, nas florestas conservadas – o Fundo Florestas Tropicais para Sempre busca criar incentivos em escala para mudar a forma como a floresta é gerida e ampliar a conservação. O MMA calcula que mais de 70 países podem ser beneficiados pelo fundo para as florestas.

Apesar de não ser intenção dos criadores do fundo para a preservação das florestas direcionar o uso dos recursos, o TFFF tem regras de elegibilidade: os países devem ter sistemas de gestão financeira transparentes, e concordar em separar 20% dos recursos especificamente para povos indígenas e comunidades tradicionais. O mecanismo para assegurar que esses recursos cheguem na ponta ainda está sendo desenhado – e isso vem gerando desconfiança de lideranças indígenas, quilombolas e de outras comunidades tradicionais.

Os países vão precisar ainda demonstrar, de uma maneira geral, como pretendem usar os recursos para conservar a floresta: quais são as políticas nacionais e quais são os programas nos quais eles pretendem usar esses recursos, por exemplo. O MMA acrescenta, contudo, que o TFFF não pretende direcionar nem monitorar o uso desses fundos, por respeito à soberania nacional dos países tropicais e porque eles vão ser remunerados pelo resultado.

Os países com florestas tropicais que aderirem ao TFFF deverão apresentar ao conselho do fundo relatórios anuais que comprovem a conservação das florestas, com monitoramento via satélite. O Brasil já faz este acompanhamento por meio do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), e poderá ser exemplo para as outras nações, segundo o MMA. Pelo desenho do TFFF, os valores encaminhados às nações com florestas seguem o cálculo de 4 dólares por hectare conservados. Os repasses poderão ser cortados ou sofrer descontos a depender do nível medido de desmatamento e degradação florestal.

No Brasil, o MMA projeta que a verba poderá fortalecer uma série de medidas de conservação ambiental, como o Programa Bolsa Verde, a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais e ações de incentivos à bioeconomia. Pelo desenho articulado pelos organizadores, o Fundo Florestas Tropicais para Sempre apoiaria os países que já têm baixo desmatamento, aumentando os recursos para seus programas e políticas de conservação, uso sustentável e restauração.

Oscar Valporto

Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade

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