A proposta, articulada pelo Brasil desde a COP28, tem como objetivo remunerar países pela conservação das florestas tropicais e o governo brasileiro acredita que seus mecanismos têm potencial para transformar o TFFF em um dos maiores fundos multilaterais do mundo, beneficiando mais de 70 países com florestas. O Brasil quer lançar o TFFF logo nos primeiros dias da COP30, com aportes significativos. Na semana passada, o presidente Lula anunciou uma doação de US$ 1 bilhão de dólares para o fundo e a expectativa é que até a conferência de Belém, de 10 a 21 de novembro, outros países anunciem aportes.
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Ao realizar pagamento por florestas em pé, protegidas de desmatamento e degradação em biomas como a Mata Atlântica, a Amazônia, as florestas da Bacia do Congo, na África, e do Mekong/Borneo, na Ásia, o TFFF reconhece serviços ambientais fundamentais prestados por estes ambientes em todo o mundo e sua importância para a sustentação de atividades econômicas. “Nós sabemos que as florestas tropicais são fonte da estabilidade climática, porque elas retêm carbono e garantem ciclos hídricos. Mais de 80% da biodiversidade terrestre de todo o mundo está nas florestas tropicais. Logo, elas fornecem serviços ecossistêmicos para a humanidade a nível global. O que o TFFF busca é que o mundo remunere parte desses serviços. É remunerar as florestas como base da vida, como base da economia, pelo nosso bem-estar”, explica André Aquino, assessor especial de Economia e Meio Ambiente do MMA (Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima).
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Veja o que já enviamosCitado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seu discurso na 80ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), o TFFF ganhou um evento especial em Nova York para a apresentação da iniciativa, que foi organizado pelo Brasil e pela própria ONU. “O Brasil vai liderar pelo exemplo e se tornar o primeiro país a se comprometer com investimento no fundo de US$ 1 bilhão”, disse Lula, convidando parceiros e outros países presentes ao evento a apresentarem “contribuições igualmente ambiciosas” para o lançamento do Fundo Florestas Tropicais para Sempre na COP30.
Como não faz parte da agenda oficial da Conferência do Clima em Belém, o TFFF não depende da aprovação dos países membros para ser lançado. O governo brasileiro trabalha na articulação com os outros envolvidos – países investidores e nações com florestas tropicais em seus territórios – para fazer o lançamento na COP30. A expectativa é usar a COP da Floresta para ser uma COP para as florestas de todo o mundo, com a formalização do novo fundo.
Como o fundo vai ser financiado
De acordo com o MMA, o TFFF é um mecanismo financeiro – um ‘fundo fiduciário’, semelhante aos mecanismos de financiamento de universidades americanas (‘endowments’), em que investimentos iniciais são aplicados no mercado financeiro para garantir o funcionamento sustentável das instituições. A expectativa é que as nações investidoras e outras fontes garantam um aporte de US$ 25 bilhões de dólares (capital júnior, no jargão do mercado financeiro) nos primeiros anos do TFFF. Com esta injeção, o Brasil acredita que será possível alavancar mais US$ 100 bilhões de dólares (capital sênior) do setor privado nos próximos anos.
Os governos, ao aceitarem o papel de capital júnior, se comprometem em incorrer em um risco um pouco maior do que o setor privado, atraindo estes investidores privados. Os organizadores do fundo, entretanto, destacam que os governos e seus parceiros iniciais são investidores e não doadores. “São doadores e não investidores porque eles poderão ter retorno”, explica André Aquino.
Este valor inicial vai ser investido em mercados de capitais. O retorno desse investimento vai ser deduzido do pagamento aos investidores iniciais: a diferença (‘spread’, no jargão do mercado) vai ser distribuída para a conservação ambiental das florestas. As projeções apontam que o mecanismo deverá viabilizar 4 bilhões de dólares anuais – o valor dessa diferença – para a conservação, o que representa, de acordo com o MMA, um valor próximo do triplo do volume aplicado atualmente para a proteção das florestas tropicais por meio de recursos concessionais. O fundo gestor do TFFF não poderá fazer aplicações que envolvam combustíveis fósseis; prioridade será optar por ações e títulos de governos e companhias de países emergentes e produtos considerados verdes.
Os recursos disponibilizados pelo TFFF serão repassados aos países com florestas tropicais, que contarão com uma fonte de recursos previsível e em grande escala para financiar objetivos de longo prazo. Com o Fundo Florestas Tropicais para Sempre, os organizadores esperam que os pagamentos aos países sejam adicionais aos recursos do orçamento hoje empregados para a conservação das florestas, que são extremamente limitados.
Além do Brasil, outros cinco países estão envolvidos na articulação do fundo e devem fazer aportes: Alemanha, Reino Unido, França, Noruega e Emirados Árabes (os quatro países europeus são parceiros tradicionais do Fundo Amazônia). O TFFF conta ainda com o apoio de cinco países com florestas tropicais – Colômbia, Gana, República Democrática do Congo, Indonésia e Malásia – que poderão fazer aportes iniciais menores. O governo brasileiro espera ainda, nesta fase inicial, apoio de fundos filantrópicos privados envolvidos na preservação do meio ambiente.
Como as florestas serão beneficiadas pelo fundo
De acordo com Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, o TFFF funcionará como um mecanismo de pagamento por resultado. Cada país – que aderir ao fundo para as florestas – vai receber um valor baseado na área, em número de hectares, nas florestas conservadas – o Fundo Florestas Tropicais para Sempre busca criar incentivos em escala para mudar a forma como a floresta é gerida e ampliar a conservação. O MMA calcula que mais de 70 países podem ser beneficiados pelo fundo para as florestas.
Apesar de não ser intenção dos criadores do fundo para a preservação das florestas direcionar o uso dos recursos, o TFFF tem regras de elegibilidade: os países devem ter sistemas de gestão financeira transparentes, e concordar em separar 20% dos recursos especificamente para povos indígenas e comunidades tradicionais. O mecanismo para assegurar que esses recursos cheguem na ponta ainda está sendo desenhado – e isso vem gerando desconfiança de lideranças indígenas, quilombolas e de outras comunidades tradicionais.
Os países vão precisar ainda demonstrar, de uma maneira geral, como pretendem usar os recursos para conservar a floresta: quais são as políticas nacionais e quais são os programas nos quais eles pretendem usar esses recursos, por exemplo. O MMA acrescenta, contudo, que o TFFF não pretende direcionar nem monitorar o uso desses fundos, por respeito à soberania nacional dos países tropicais e porque eles vão ser remunerados pelo resultado.
Os países com florestas tropicais que aderirem ao TFFF deverão apresentar ao conselho do fundo relatórios anuais que comprovem a conservação das florestas, com monitoramento via satélite. O Brasil já faz este acompanhamento por meio do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), e poderá ser exemplo para as outras nações, segundo o MMA. Pelo desenho do TFFF, os valores encaminhados às nações com florestas seguem o cálculo de 4 dólares por hectare conservados. Os repasses poderão ser cortados ou sofrer descontos a depender do nível medido de desmatamento e degradação florestal.
No Brasil, o MMA projeta que a verba poderá fortalecer uma série de medidas de conservação ambiental, como o Programa Bolsa Verde, a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais e ações de incentivos à bioeconomia. Pelo desenho articulado pelos organizadores, o Fundo Florestas Tropicais para Sempre apoiaria os países que já têm baixo desmatamento, aumentando os recursos para seus programas e políticas de conservação, uso sustentável e restauração.