Transporte com tarifa zero, fim das emissões de gases poluentes pelos veículos e redução (até chegar a zero) das mortes no trânsito: são essas as metas que inspiraram o lançamento, nesta terça (28/03), da Coalizão Mobilidade Triplo Zero, que reúne organizações da sociedade civil, movimentos sociais e pesquisadores. “Não há uma capital neste país que tenha transporte público bom, barato e inclusivo. Por isso, essa união pela mobilidade com esse mote: zero tarifa, zero emissões, zero mortes”, afirmou Anne Oviedo, analista de Mobilidade Urbana no Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), durante o debate virtual, transmitido pelas redes sociais, que lançou a coalizão.
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Durante o evento, Annie Oviedo também apresentou as linhas gerais da primeira iniciativa do grupo: a proposta de criação do Sistema Único de Mobilidade (SUM). “O SUM é uma contribuição para a iniciativa do governo federal de criar um novo marco regulatório para o transporte público coletivo no país”, explicou a analista do Idec, lembrando que a ideia está em debate desde o início do ano passado. “O SUS (Sistema Único de Saúde) e o SUAS (Sistema Único de Assistência Social) são modelos de sucesso e o país precisa de uma política integrada de transporte, com conexão entre o federal e o local”, acrescentou.
A prioridade ao transporte público somada à eletrificação da frota e à adoção de veículos menos poluentes é uma estratégia fundamental não apenas para conter a crise climática mas para proteger a saúde da população. A poluição do ar, como afirma a OMS, é um inimigo invisível mas mortal
Pela proposta, o SUM buscaria atingir cinco objetivos principais: rumar ao Triplo Zero – zero mortes no trânsito, zero emissões de poluentes e zero tarifa – assegurando à universalização do direito ao transporte e à mobilidade urbana como; promover a inclusão social, a acessibilidade universal, a equidade no acesso a oportunidades e a redução das desigualdades socioespaciais; ampliar a porcentagem de viagens realizadas por transporte ativo e transporte público coletivo e reduzir aquelas realizadas por transporte motorizado individual; ampliar as infraestruturas de mobilidade ativa e a oferta dos serviços de transporte público coletivo de forma integrada; e garantir a prestação dos serviços de transporte com qualidade, confiabilidade e disponibilidade. “Não é uma coisa fácil porque vamos enfrentar interesses econômicos pesadíssimos”, disse o engenheiro Lúcio Gregori no evento virtual de lançamento.
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Veja o que já enviamosSecretário de Transportes da cidade de São Paulo na gestão Luiza Erundina, nos anos 90, Gregori destacou que a aliança entre a indústria automobilística e a indústria petrolífera transformou as cidades brasileiras em reféns dos automóveis. “Zerar as tarifas significa ampliar o financiamento público do transporte público e o acesso às cidades, garantindo a todos o direito de se deslocar e de acessar outros direitos, como saúde, educação, trabalho e lazer”, frisou o engenheiro.
As cidades reféns dos automóveis sofrem também com a poluição do ar. “Sistema de mobilidade baseado em carros particulares é uma lógica completamente ultrapassada, apesar de ainda prevalecer nas grandes cidades brasileiras, onde o transporte é o grande vilão das emissões de gases de efeito estufa”, apontou a coordenadora de Gestão da Mobilidade no ITDP Brasil, Lorena Freitas, usando como exemplo o Rio de Janeiro, onde o transporte é responsável por 41% das emissões na cidade.
O SUM vai estruturar essa discussão para caminharmos no rumo do zero tarifa, zero emissões, zero mortes. O nosso objetivo na Coalizão é pautar esse debate e enfrentar esse desafio de colocarmos essas metas nas políticas públicas
A proposta de zero emissões significa transformar a mobilidade urbana em instrumento de combate às mudanças climáticas e à poluição. “A prioridade ao transporte público somada à eletrificação da frota e à adoção de veículos menos poluentes é uma estratégia fundamental não apenas para conter a crise climática mas para proteger a saúde da população. A poluição do ar, como afirma a OMS, é um inimigo invisível mas mortal”, destacou Lorena Freitas, doutoranda em engenharia de transportes, lembrando que doenças provocadas pela poluição do ar matam mais de 50 mil brasileiros por ano.
Zerar o número de mortes é a outra meta da Coalizão Mobilidade Triplo Zero, que tem a participação das ONGs Bigú, Casa Fluminense, Fundação Rosa Luxemburgo, Idec, Inesc, ITDP, Observatório da Mobilidade de Salvador, Observatório dos Trens do Rio de Janeiro, Movimento Passe Livre, Nossas, Movimento Nossa BH, Movimento Nossa Brasília, Tarifa Zero BH, União dos Ciclistas do Brasil (UCB). “Zerar significa fortalecer a segurança das vias, plataformas, ciclovias e calçadas, além de dar prioridade à mobilidade a pé e por bicicleta”, destacou Ruth Costa, diretora presidente da UCB.
De acordo com o DataSUS, em 2020, os sinistros de trânsito mataram 32.716 pessoas, sendo 15,4 a cada 100 mil habitantes. Este número, embora ainda muito alto, vem caindo nos últimos anos (chegou a 45 mil no começo da década de 2010), mas a redução foi maior nas estradas dos que nas áreas urbanas. “É necessário reduzir os limites de velocidade: a alta velocidade é a principal causa de sinistros no trânsito”, destacou Ruth Costa, lembrando que, durante a pandemia, as pessoas foram incentivadas a fazer deslocamentos por bicicleta. “Houve um aumento de viagens de bicicleta e um aumento de ciclistas vítimas de sinistros depois da pandemia”, lamentou a presidente da UCB, destacando que, nos últimos 15 anos, mais de 25 mil ciclistas foram vítimas fatais do trânsito. “Os mais vulneráveis, como pedestres, ciclistas e motociclistas, são sempre maioria entre as mortes no trânsito”, acrescentou.
Para os participantes do lançamento da Triplo Zero, o Sistema Único de Mobilidade Urbana, ao ampliar e fortalecer o transporte público coletivo vai impulsionar . “O SUM vai estruturar essa discussão para caminharmos no rumo do zero tarifa, zero emissões, zero mortes. O nosso objetivo na Coalizão é pautar esse debate e enfrentar esse desafio de colocarmos essas metas nas políticas públicas”, afirmou Annie Oviedo, do Idec.