Leu essa? COP30 enfrentará o imbróglio do financiamento climático: quem vai pagar a conta?
Antes mesmo da reunião, chefes de delegações de 27 países desenvolvidos e em desenvolvimento, além dos representantes dos grupos de países africanos e dos países menos desenvolvidos do mundo, haviam enviado uma carta ao secretário extraordinário da COP30, Valter Correa, e ao secretário executivo da Convenção do Clima (UNFCCC) Simon Stiell expressando sua grande preocupação com a falta de acomodações acessíveis e a todas as delegações da COP30, marcada marcada para ocorrer entre 10 e 21 de novembro, em Belém.
As reclamações vieram de nações classificadas pela ONU como países menos desenvolvidos, pequenos estados insulares e também da delegação africana, mas há queixas também de nações mais ricas, que avaliam reduzir suas delegações para a COP30. Em entrevista à agência Reuters, após a reunião na UNFCCC o presidente do Grupo Africano de Negociadores, Richard Muyungi, afirmou que os países africanos não querem reduzir sua participação em razão dos custos logísticos. “Não estamos prontos para reduzir o número de participantes. O Brasil tem muitas opções em termos de ter uma COP melhor, uma boa COP. É por isso que estamos pressionando para que o Brasil forneça melhores respostas, em vez de nos dizer para limitar nossa delegação”, disse Muyungi.
O embaixador André Corrêa do Lago, presidente da COP30, confirmou que alguns países pediram que o evento não aconteça em Belém e criticou a postura do setor hoteleiro, de cobrar valores altos para a hospedagem no período da reunião. “Acredito que talvez os hotéis não estejam se dando conta da crise que eles estão provocando”, disse o embaixador. “Os preços estão completamente abusivos”, afirmou também. “Há um esforço muito grande do governo de conseguir convencer os hotéis a baixar o preço, porque, pela legislação brasileira. não se pode impor isso aos hotéis, acrescentou Corrêa do Lago, durante a participação em evento, lembrando que dois terços dos países-membros da UNFCCC são mais pobres que o Brasil. .
Os organizadores brasileiros da COP30, entretanto, descartam tirar a COP30 de Belém. Em encontro com jornalista na sexta-feira (01/08), André Corrêa do Lago, reiterou que o evento será realizado na capital do Pará. O embaixador afirmou que o Brasil está atuando para garantir que todos os países, em especial os mais pobres, consigam participar da conferência. “A COP vai ser em Belém, o encontro de chefes de Estado vai ser em Belém e não há nenhum plano B. O que aconteceu foi uma reunião de emergênc ia e os representantes dos países disseram ter uma preocupação muito grande por causa dos preços de hospedagem em Belém e que esses preços estão muitíssimo acima de qualquer aumento que houve em qualquer outra COP”, afirmou.
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Corrêa do Lago afirmou durante a entrevista que o governo está trabalhando para oferecer tarifas de hospedagem entre US$ 100 e US$ 600, com prioridade para essas delegações de países em desenvolvimento. “Esses países se manifestaram de maneira muito clara na reunião. Disseram que, com a diária de cerca de US$ 143 que recebem, precisam de quartos entre 50 e 70 dólares para poder participar. Se você olhar hoje os preços em Belém, há centenas de quartos nessa faixa. Mas nas datas da COP, os valores disparam”, explicou.
O presidente da COP30 disse ainda que o Brasil, como país em desenvolvimento, tem compromisso com uma COP inclusiva. “Temos que encontrar uma maneira de que esses países possam estar em Belém, porque eles também dizem que a COP, com a ausência dos países mais pobres, ficaria sem legitimidade por não ter a universalidade. O governo está trabalhando para oferecer quartos dentro do que eles podem pagar”, frisou. Cerca de 45 mil pessoas estão previstas para participar da conferência do clima na capital do Pará.
Em nota, a Secretaria Extraordinária da COP30, do governo federal, informou que 2.500 quartos foram disponibilizados para as delegações. Foram reservados 15 quartos individuais por delegação para 73 países que se enquadram em alguma das classificações, com tarifas entre US$ 100 (R$ 554) e US$ 200 (R$ 1109). Outros 10 quartos individuais por delegação, com tarifas entre US$ 220 (R$ 1.220) e US$ 600 (R$ 3.327), foram disponibilizados para os demais países.
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Veja o que já enviamosCarta alerta para crise de hospedagem
A carta dos 27 chefes de delegações formalizou a crise de hospedagem na COP30, a 100 dias de sua abertura, marcada para 11 de novembro, deflagrada pelos preços abusivos cobrados pela rede hoteleira. “O fato de nem todos terem suas acomodações garantidas em junho ou julho não é incomum No entanto, o número de delegações que este ano não têm onde ficar e nenhuma opção concreta à vista é altamente incomum. É preocupante, dada a proximidade da COP”, dizem os signatários da carta, revelada pela jornalista Daniela Chiaretti no Valor.
Os chefes de delegação compreendem a dificuldade e o simbolismo de se fazer uma COP na Amazônia. “Aplaudimos a decisão do presidente Lula de trazer líderes globais para Belém e aproximá-los das realidades das mudanças climáticas– uma realidade já vivida por muitos. É evidente que o local escolhido traz desafios específicos. Isso é exemplificado pelo seu trabalho incansável para aumentar o número de opções de acomodação”, diz o texto.
Mas os chefes de delegação destacam que ter condições efetivas de participar da COP30 “significa ser possível viajar para Belém, ficar em acomodações adequadas e acessíveis, e ir ao pavilhão e voltar de forma segura e eficiente em termos de tempo, inclusive tarde da noite”, lembra a carta. Além de países mais pobres e do grupo dos negociadores africanos, também assinam o documento representantes de países mais ricos como Canadá, Bélgica, Finlândia, Holanda, Noruega e Suíça.
Ambientalistas e representantes da sociedade civis defendem a COP30 em Belém mas criticam os governos. “A ideia é excelente, os negociadores precisam saber como são os desafios reais de uma cidade de um país de renda média e na Amazônia. O Brasil precisava ter dado oportunidade de as pessoas chegarem até o lugar, e isso o Brasil não fez”, critica Cláudio Angelo, coordenador de Política Internacional do Observatório do Clima, que participa de COPs desde 2000. “A crise que a gente está vivendo agora, que é uma coisa inédita na história da UNFCCC, é resultado do desleixo do governo brasileiro. Não precisaríamos ter chegado neste ponto. Belém é uma cidade incrível, mas agora a gente não vai mais conseguir fazer esta COP super legal e super inclusiva”, acrescenta.
Mahryan Sampaio, diretora e co-fundadora do Instituto Perifa Sustentável, de São Paulo, , explica que não há opções acessíveis: casas, hostels e hotéis, todos têm preços inacessíveis, o que coloca em xeque o objetivo de ter uma COP inclusiva. “A média de valor que recebemos é de R$ 60 mil para uma pessoa passar todos os dias do evento em Belém. Isso é muito mais do que já pagamos no exterior. Estamos tentando nos reunir com outras entidades e alugar casas juntos, mas ainda assim os preços são muito altos”, disse a dirigente do Perifa ao G1, que viabilizou a participação em cinco COPs anteriores na Europa e na Ásia.