Caos climático: temporais e inundações repentinas matam mais de 700 no Paquistão

Balanço de agências da ONU aponta ainda que temporada de monções provocou milhares de desabrigados; estudo indica que mudança climática intensificou chuvas

Por Oscar Valporto | ODS 13
Publicada em 22 de agosto de 2025 - 11:04  -  Atualizada em 22 de agosto de 2025 - 11:58
Tempo de leitura: 6 min

Crianças atravessam canal inundado no Paquistão: mais de 700 mortos com temporais e inundações repentinas (Foto: Vlad Sokhin / UNICEF / Arquivo)

Fortes chuvas de monções e inundações repentinas mataram pelo menos 739 pessoas em todo o Paquistão desde o final de junho, desabrigando milhares e destruindo casas e plantações, com previsão de tempo mais severo nas próximas semanas, de acordo com balanço de agências da ONU, divulgado nesta quinta (21/08). A Autoridade Nacional de Gestão de Desastres também relatou 978 feridos e a destruição ou danos a mais de 2.400 casas, enquanto mais de 1.000 animais foram perdidos. A previsão é de que o tempo severo continue até o início de setembro, aumentando o risco de novas inundações, deslizamentos de terra e perdas de plantações, de acordo com o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA, na sigla em inglês).

Leu essa? Caos climático: tempestade atípica deixa mais de 100 mortos no Texas

A província de Khyber Pakhtunkhwa, no noroeste do país, foi a mais afetada pelo desastre. As autoridades declararam estado de emergência em nove distritos, incluindo Buner, Shangla e Mansehra, após chuvas torrenciais entre 15 e 19 de agosto, que deixaram 368 mortos, 182 feridos e danificaram mais de 1.300 casas. Quase 100 escolas também foram destruídas.

Gostando do conteúdo? Nossas notícias também podem chegar no seu e-mail.

Veja o que já enviamos

A organização internacional de caridade CARE informou que suas equipes encontraram devastação generalizada em Buner, onde famílias relataram que suas casas e meios de subsistência foram destruídos em minutos por torrentes de água da enchente, carregando pedras e detritos.

O impacto sobre as crianças tem sido particularmente grave, com deslocamentos, perda de escolaridade e acesso limitado à água potável, colocando sua saúde e bem-estar em sério risco. De acordo com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), pelo menos 21 crianças estavam entre as vítimas fatais em Khyber Pakhtunkhwa desde 15 de agosto. Muitas escolas foram destruídas ou estão sendo usadas como abrigos temporários, restringindo ainda mais o acesso à educação e a espaços seguros.

Na província de Sindh, fortes chuvas no começo da semana provocaram inundações urbanas em Karachi – a maior cidade do Paquistão – onde pelo menos seis pessoas morreram em desabamentos de muros e eletrocussões. As chuvas atingiram até 145 milímetros (cerca de 5,75 polegadas) em partes da cidade, inundando ruas e deixando muitos bairros sem energia elétrica por horas. A província de Punjab também sofreu extensas inundações ao longo dos rios Indo e Chenab, que desabrigaram mais de 2.300 famílias e danificaram plantações comerciais em milhares de hectares.

O OCHA informou que enviou coordenadores de campo para os distritos mais afetados e ativou mecanismos de emergência, incluindo a liberação de fundos de seu pacote humanitário regional para o Paquistão – priorizando assistência vital em saúde, água, segurança alimentar e abrigo. Por sua vez, o Unicef enviou medicamentos essenciais e kits de higiene para os distritos afetados. Cada kit inclui sabão, recipientes de água e outros suprimentos de higiene para ajudar a prevenir surtos de doenças.

Temporais mais intensos com mudanças climáticas

O Paquistão tem enfrentado temporadas de monções devastadoras nos últimos anos. Em 2022, inundações sem precedentes mataram mais de 1.700 pessoas, desabrigaram milhões e causaram perdas econômicas estimadas em US$ 40 bilhões.

As chuvas de monções no Paquistão foram mais intensas devido às mudanças climáticas, tornando as inundações mais perigosas, de acordo com relatório da World Weather Attribution (WWA), grupo de cientistas internacionais que estuda o papel do aquecimento global em eventos climáticos, publicado no começo de agosto, com a avaliação do primeiro mês da temporada de monções.

As chuvas de monções no Paquistão, que normalmente ocorrem de junho a setembro, são variáveis. Mas, em 2025, país registrou mais de um terço a mais de chuva, ou 36%, em julho deste ano em comparação com o ano passado, de acordo com o departamento meteorológico paquistanês. A precipitação é cerca de 10% a 15% mais intensa devido às mudanças climáticas, de acordo com os pesquisadores da WWA, que analisaram a precipitação de 24 de junho a 23 de julho no Paquistão.

Gostando do conteúdo? Nossas notícias também podem chegar no seu e-mail.

Veja o que já enviamos

Uma atmosfera mais quente retém mais umidade, afirmam os climatologistas, o que pode tornar a chuva mais intensa. “Cada décimo de grau de aquecimento levará a temporais de monções mais intensos”, disse Mariam Zachariah, principal autora do estudo da WWA e pesquisadora ambiental do Imperial College London, na apresentação do estudo.

O relatório afirma que a precipitação máxima de 30 dias na região afetada é agora aproximadamente 22% mais intensa do que teria sido sem o aquecimento de 1,3°C causado pela queima de combustíveis fósseis e pelo desmatamento. “Tendências históricas associadas ao aquecimento global em conjuntos de dados observacionais mostram que a precipitação máxima de 30 dias na região estudada é agora aproximadamente 22% mais intensa do que teria sido em um clima que não tivesse aquecido 1,3°C, devido à queima de combustíveis fósseis e, em menor grau, ao desmatamento”, aponta o estudo.

De acordo com o relatório, a maioria dos modelos e observações que analisada pelos cientistas mostra que temporais semelhantes se tornaram mais intensos à medida que o Paquistão se aqueceu. Dois modelos climáticos incluídos na análise, ambos conhecidos por sua representação mais realista dos aerossóis e da irrigação, que, apontam os pesquisadores, são os principais fatores que influenciam os processos de precipitação na região, apresentaram aumentos de 40 a 80%. “Os resultados sintetizados indicam que as mudanças climáticas atuais aumentaram a intensidade das chuvas em cerca de 15%, mas as incertezas são grandes, o que significa que um aumento muito maior não pode ser descartado”, alerta o estudo da WWA.

O relatório lembra ainda que, após as devastadoras enchentes de 2022, estimou-se que US$ 16,3 bilhões foram necessários para reabilitação e reconstrução de forma resiliente, com doadores prometendo mais de US$ 8,5 bilhões, principalmente como empréstimos, e o governo do Paquistão cobrindo os outros custos. “No entanto, este evento mostra que há um imperativo não apenas para reconstruir, mas também para se adaptar aos riscos crescentes. Estima-se que o Paquistão precise de US$ 152 bilhões para adaptação entre 2023 e 2030, a maior parte dos quais permanece sem financiamento”, aponta a WWA.

Oscar Valporto

Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade

Newsletter do #Colabora

A ansiedade climática e a busca por informação te fizeram chegar até aqui? Receba nossa newsletter e siga por dentro de tudo sobre sustentabilidade e direitos humanos. É de graça.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Compartilhe:

Sair da versão mobile