ODS 1
A luta da Onça, a luta de Brasis
Acadêmicos do Grande Rio levam mito do Velho Onça dos Tupinambás para Marquês de Sapucaí
Vários Brasis desfilaram no Sambódromo da Marquês de Sapucaí, na madrugada de domingo (11) para segunda (12 de fevereiro). A Acadêmicos do Grande Rio fez jus ao seu enredo: “Nosso destino é ser Onça!” e entrou na Avenida para lutar. Não só pelo título do campeonato de 2024. A luta que a escola do município de Duque de Caxias mostrou é de um país diverso, plural, onde homem, mata e bichos se encontram no Carnaval. A Grande Rio ficou em terceiro lugar na disputa das escolas de samba do Carnaval 2024 e volta à Passarela neste sábado (17/02) para o Desfile das Campeãs.*
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“São diversos Brasis que a gente encontra entendendo a figura da onça como esse personagem central e a gente vai desde 15 mil anos atrás até o futuro, pensando que o futuro é ancestral. Para entendermos que o futuro é algo que a gente olha pra frente, vendo o que ficou para trás. É a mesma simbologia do Sankofa, que caminha pra frente olhando pra trás. Essa é a importância do enredo da Grande Rio”, disse ao #Colabora, o carnavalesco da escola, Gabriel Haddad, que assina o enredo junto com Leonardo Bora.
O Salgueiro nem tinha 30 minutos do seu desfile e a concentração da Grande Rio já era um corre-corre, gritos e tensão. Os momentos que antecedem um desfile de uma escola no grupo especial do Rio de Janeiro é o mais aguardado pelo povo do samba. Nada pode dar errado. E a escola de Caxias apostou alto. Pela primeira vez usou a, tão criticada, nova iluminação do Sambódromo da Marquês de Sapucaí. E a distribuição de pulseiras de led, a la Coldplay, que podia dar muito errado, deu certo.
“Trovejou, escureceu”, começava o samba-enredo da Grande Rio. E a Marquês de Sapucaí ia ao delírio, com os efeitos luminosos das pulseiras e de uma alegoria de Onça gigante iluminada junto a uma Comissão de frente com fantasias neon. Era o mito da criação do mundo, que na crença tupinambá a humanidade é toda uma poeira cósmica que vagueia pelo infinito até a grande onça celeste.
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Veja o que já enviamosComo um livro a céu aberto que é a Marquês de Sapucaí, a Grande Rio escolheu contar sua história inspirada no livro “Meu destino é ser Onça”, de Alberto Mussa. Onça, florestas, povos indígenas: Brasil. O motivo dessa mistura estava na ponta da língua do carnavalesco Gabriel Haddad: “Temos que entender a importância da onça, que é símbolo de luta e é isso que a gente vai fazer na avenida: lutar”, disse ele.
Integrante da Ala das baiana, Bianca Roque chegou à Praça da Apoteose em êxtase, para ela a Grande Rio já é campeã por mostrar a luta de toda a comunidade e de todas as mulheres negras como ela. “Somos como a onça: lutadora, “trabalhadora”, que enfrenta tudo, sem medo. Para chegarmos até aqui hoje, só com muita garra”, contou Bianca.
Carnaval é político e a Grande Rio encerrou seu desfile com uma mensagem que ecoa desde antes de 1500, mas ultimamente com mais urgência: Brasil Terra indígena. Em seu desfile os mitos e histórias dos Tupinambás não passaram em vão. Esse povo indígena já habitava o Brasil, do Recôncavo Baiano até o Rio de Janeiro, quando os portugueses invadiram suas terras. Ao longo da Avenida, os animais com os quais convivem os Tupinambás, a antropofagia, característica desse povo e as matas das quais são guardiões e tiram seus sustentos.
Iguitto, estreando na Comissão de Frente da escola, disse ser importante enredos que tratam de política e da natureza. “O enredo da Grande Rio traz também a conservação da biodiversidade. É importante a gente guardar o que temos de valioso. Essa visibilidade que dão agora e cada vez mais para os povos indígenas é muito importante. Quanto mais tivermos enredos e debates dessa forma as pessoas vão se conscientizar sobre esses temas”, disse ele.
No desfile da Grande Rio, a onça também caiu no samba. Uma das alegorias foi chamada de Onças Foliônicas que trazia O Carnaval como a grande catarse antropofágica, onde todos, todas e todes podem soltar suas feras. E a diversidade seguiu presente com a ala das Panteronas e Bichanas que representavam a luta contra a homofobia.
Na frisa de um camarote, John Lenon, empunhava a camisa da Grande Rio e se conectava com todos os integrantes da escola que passavam na sua frente. Alguns paravam para beijar a blusa. Outros acenavam e vibravam pela torcida. Ele fez seu julgamento, nada imparcial parcial. “Tudo perfeito, carros e fantasias perfeitas”.
Para ele, o enredo escolhido por Gabriel e Leonardo são um resumo do Brasil. “Todo mundo tem um pouco de onça. Somos lutadores e guerreiros. Ela vive na selva, lutando todos os dias. E nós também somos batalhadores, travando nossas lutas e guerras de todo dia”.
*Atualizado em 14/02 para adicionar a colocação da Grande Rio na disputa das escolas de samba do Carnaval 2024 no Rio de Janeiro
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Thiago Camara é jornalista formado pela PUC-Rio, apaixonado por samba. Desde 2015 faz coberturas do Carnaval, nos desfiles das escolas de samba e nos blocos de rua do Rio. Já teve passagens pelo IG, UOL, revista Quem. No jornalismo ambiental trabalhou no Portal O Eco. Já coordenou a Comunicação da Anistia Internacional Brasil. Atualmente é Analista de Comunicação e Marketing no Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio).