Pessoas trans preparam lançamento de agência de jornalismo

A comunicadora indígena Samela Sateré Mawé e o jornalista trans Caê Vasconcelos com o mediador Yuri Fernandes e a intérprete Bernadete: debate sobre diversidade e comunicação

Jornalista Caê Vasconcelos revela projeto em debate promovido no #Colabora: "Quem melhor do que nós, pessoas trans, para falar de nós?"

Por #Colabora | ODS 10 • Publicada em 30 de novembro de 2021 - 20:38 • Atualizada em 6 de dezembro de 2021 - 11:02

A comunicadora indígena Samela Sateré Mawé e o jornalista trans Caê Vasconcelos com o mediador Yuri Fernandes e a intérprete Bernadete: debate sobre diversidade e comunicação

Durante debate sobre comunicação e diversidade promovido pelo #Colabora, o jornalista Caê Vasconcelos, homem trans, revelou que prepara, ao lado de amigos, o lançamento de uma agência de jornalismo de e para pessoas trans. “Quem melhor do que nós, pessoas trans, para falar de nós”, disse Caê, de 30 anos, que trabalhou na Ponte Jornalismo e agora atua na Agência Mural de Jornalismo das Periferias. “Eu escolhi fazer do meu jornalismo uma luta pelos direitos humanos e para as pessoas LGBT+”, acrescentou.

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O encontro com o tema ‘Comunicação e diversidade: juntas por um mundo mais inclusivo’ encerrou o ciclo de debates promovido pelo #Colabora para celebrar seu sexto aniversário e teve a participação também da comunicadora indígena Samela Sateré Mawé, apresentadora do Canal Reload, estudante de Biologia na Universidade do Estado do Amazonas e uma das representantes dos povos indígenas na COP26. O evento virtual #Colabora 6 anos, 6 debates fundamentais reuniu convidados para conversas sobre saúde, clima, economia verde, gênero, meio ambiente e diversidade.

Caê Vasconcelos contou que se descobriu jornalista durante as chamadas Jornadas de Junho, em 2013, quando os protestos, que começaram contra o aumento das tarifas de ônibus, se multiplicaram para várias outras pautas. “Eu via uma coisa nas ruas e via outra na mídia. Foi quando eu comecei a querer mostrar o meu olhar sobre os fatos”, disse o jornalista, formado em 2017 pelo Centro Universitário FIAM-FAAM, na capital paulista.

Seu TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) foi o livro-reportagem “Transresistência: Pessoas trans no mercado de trabalho” – o trabalho ajudou na sua transição, no seu renascimento como Caê. “Personagens do livro me agradeceram por eu não ter sido transfóbico. As pessoas trans estão acostumadas ao tratamento transfóbico por parte da mídia. Os repórteres reproduzem a transfobia”, afirmou Caê Vasconcelos no debate, mediado pelo jornalista Yuri Fernandes, editor no #Colabora. O livro vai ser relançado, com mais histórias, na Livraria Martins Fontes, no dia da visibilidade trans, 29 de janeiro.

“Queria trabalhar onde eu pudesse desenvolver pautas LGBT”, lembrou Caê que participou de entrevista com a vereadora Erika Hilton – negra, trans e a mulher mais votada do Brasil nas eleições municipais – no programa Roda Viva. “Foi um momento histórico: três pessoas trans na bancada do Roda Viva”.

Essa trajetória de abrir espaços para pautas trans e LGBT+ foi fortalecendo a ideia da agência de jornalismo que vai ser lançado no ano que vem. “Gosto muito do exemplo do Alma Preta, que é uma site feito por pessoas negras para pessoas negras. Por que então não ter uma mídia feita por pessoas trans para pessoas trans?”, argumentou Caê, também ativo nas redes sociais como twitter e instagram. “Nós temos que ocupar os espaços para que a nossa voz seja ouvida. A gente recebe muito ataque de ódio mas já aprendi que devemos simplesmente ignorar”, desabafou Caê Vasconcelos.

Ataques semelhantes pelas redes sociais também fazem parte da rotina da jovem líder indígena Samela Sateré Mawé, que tem 35 mil seguidores no Instagram. “Nós sofremos ataques porque eles não querem que a voz dos indígenas seja ouvida. Faz parte de uma tentativa de desconstrução da identidade indígena pelos não indígenas que querem ditar como nós devemos ser. Indígena não pode usar internet, não pode ter celular, não pode ser ativo nas redes sociais. Mas nós vamos usar esses espaços para fortalecer e defender a nossa cultura, a nossa identidade indígena”, disse Samela, também apresentadora do Canal Reload.

A indígena de 25 anos, da comunidade Sateré Mawé, em Manaus, foi uma das 40 lideranças que participaram da COP26. “Nossa pauta prioritária foi a defesa da demarcação de nossos territórios. Proteger os territórios indígenas é proteger o ambiente porque somos nós quem mais cuidamos da terra, da biodiversidade, da natureza. Nos 13% do território brasileiro que são terras indígenas, são onde a natureza está mais preservada”, destacou. “Foi muito importante que os líderes das grandes nações ouvissem a nossa voz, a voz dos indígenas, e ouvissem que suas decisões afetam nossas vidas, nossas terras, nossas crianças”, acrescentou.

Para Samela, as mídias independentes e as redes sociais são fundamentais para que as pautas indígenas sejam compartilhadas entre as próprias etnias espalhadas pelo país e também para os não indígenas. “Muitas denúncias de ataques de garimpeiros, grileiros e madeireiros foram feitas através da internet pelos jovens comunicadores indígenas e outras lideranças. Nós usamos as mídias sociais como um instrumento de luta porque a grande mídia, muitas vezes, ignora as pautas indígenas”, afirmou a jovem universitária, que está concluindo o curso de Biologia em Manaus.

Ela lembra que o olhar colonizador do homem branco tem sido reforçado pelos séculos através dos estereótipos sobre os indígenas reforçado desde a escola de ensino fundamental. Esses estereótipos permanecem e reforçam preconceitos que estão na mídia. “É comum ver termos como índio e tribo que nada tem a ver com a nossa identidade. Por isso, precisamos de comunicadores indígenas que façam a nossa voz se espalhar e ser ouvida. Não precisamos que falem por nós”, disse Samela Sateré Mawé no debate promovido pelo #Colabora.

#Colabora

Texto produzido pelos jornalistas da redação do #Colabora.

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