Um hotel voltado para a Rocinha

O majestoso Hotel Nacional está recuperado depois de duas décadas de abandono (Foto Divulgação)

Projeto de Niemeyer, o Nacional reabre com restauração que respeita sua história e de braços abertos à comunidade vizinha

Por Carla Lencastre | Economia VerdeODS 14 • Publicada em 5 de abril de 2017 - 09:00 • Atualizada em 2 de setembro de 2017 - 15:41

O majestoso Hotel Nacional está recuperado depois de duas décadas de abandono (Foto Divulgação)
A sereia está de volta à piscina do antigo Hotel Nacional (Foto Divulgação)
A sereia está de volta à piscina do antigo Hotel Nacional (Foto: Divulgação)

Depois de duas décadas de abandono, o Hotel Nacional acaba de comemorar três meses de volta à vida. Chega a ser emocionante ver brilhar novamente o imenso lobby sem colunas com quase três mil metros quadrados, um dos pontos de destaque do moderno projeto de Oscar Niemeyer em 1972; a majestosa sereia em bronze de Alfredo Ceschiatti entre a piscina e o Oceano Atlântico; os jardins de Roberto Burle Marx com suas 46 plantas nativas brasileiras emoldurando a vista; o grande painel em dezenas de placas de concreto assinado por Carybé, que ocupa a parede curva ao fundo do lobby; a luminária suspensa com 12 metros de extensão do artista plástico Pedro Correa de Araújo logo à entrada.

A rede espanhola Meliá, administradora do Hotel Nacional nesta sua versão século XXI, não precisou ir longe para contratar parte de suas três centenas de funcionários. A torre cilíndrica de 34 andares compartilha o bairro carioca de São Conrado com a Rocinha. Dos primeiros 300 funcionários do Gran Meliá Nacional Rio de Janeiro (o nome oficial), 100 são moradores da comunidade vizinha. E outros virão, já que o hotel ainda não está 100% pronto.

Os apartamentos executivos estão em fase final de decoração. O restaurante gourmet, assinado por Felipe Bronze, no 32º andar, e o bar na cobertura ainda não têm data de inauguração marcada. No lobby, o bar Amaro e o restaurante Sereia, de cozinha mediterrânea, já estão abertos ao público em geral. O Spa by Clarins, da prestigiada marca francesa, por enquanto funciona apenas para hóspedes, mas também será aberto ao público.

O lobby de 3 mil metros quadrados sem pilastras do projeto de Niemeyer para o Hotel Nacional (Foto Carla Lencastre)
O lobby de 3 mil metros quadrados, sem pilastras, do projeto de Niemeyer para o Hotel Nacional   (Foto: Divulgação)

O Hotel Nacional é o primeiro no Brasil com a bandeira de luxo contemporâneo Gran Meliá. O grupo espanhol administra outros 17 estabelecimentos no país, em cidades como São Paulo, Brasília e Recife. O Nacional foi arrematado por R$ 85 milhões em um leilão, em 2009, por um grupo de empresários brasileiros. Na época, o hotel estava nas mãos da Superintendência de Seguros Privados (Susep), uma autarquia vinculada ao Ministério da Fazenda. Reforma e restauração (foram feitas poucas modificações no projeto original, tombado pelo município do Rio) custaram mais de R$ 400 milhões.

Era um dos estabelecimentos de luxo mais aguardados para os Jogos Olímpicos, mas as obras atrasaram e a abertura foi adiada para 15 de dezembro passado, dia do aniversário de Niemeyer, com apenas algumas dezenas dos 413 apartamentos disponíveis. No carnaval deste ano, já com metade dos quartos e suítes funcionando, o hotel teve 80% de ocupação.

Os apartamentos continuam no desafiador formato original de fatia de pizza, com tamanho mínimo de 33 metros quadrados

Os apartamentos continuam no desafiador formato original de fatia de pizza, com tamanho mínimo de 33 metros quadrados. Os elevadores ficam concentrados no centro do prédio. A suíte presidencial, no 29º andar, terá 300 metros quadrados e acesso direto pelo heliponto. O objetivo é voltar a atrair as celebridades que no passado colaboraram para a fama do hotel.

As imensas janelas envidraçadas do chão ao teto exigem uma equipe permanente de manutenção, que limpa diariamente uma coluna da torre, de alto a baixo. Sempre haverá um andaime em algum ponto do prédio. O #Colabora perguntou ao grupo Meliá de onde vem tanta água e qual o tipo de detergente usado, mas não teve resposta. Dependendo da posição, os quartos e suítes podem ter vista livre para a Pedra da Gávea, um panorama com a Praia de São Conrado e o Oceano Atlântico, a exuberante vegetação verde do “verso” do Morro dos Irmãos (colado ao hotel), ou a Rocinha, com o bônus do Cristo Redentor ao fundo nos andares mais altos. Entre os visitantes estrangeiros faz sucesso a vista noturna da Rocinha.

Com sua vista de 360 graus, o novo Hotel Nacional se volta à comunidade da Rocinha (Foto de divulgação)
Com sua vista de 360 graus, o novo Hotel Nacional se volta à comunidade da Rocinha  (Foto Divulgação)

Muitos moradores do Rio têm boas lembranças do Nacional nos anos 1980 e 1990 por conta dos eventos constantes que aconteciam no teatro em frente ao hotel, como os festivais de cinema e de jazz. No subsolo, a boate Mykonos também teve seus 15 minutos de fama. Por enquanto, estas memórias ficarão no passado. Tanto o teatro quanto a boate não poderiam funcionar hoje por conta das atuais normas de segurança. A ideia é transformar a área anexa ao hotel em um centro de convenções, com capacidade para quatro mil pessoas, e construir uma torre de apartamentos. O projeto desagrada aos moradores da região. Por enquanto, ainda não avançou e a área está cercada e isolada. Com tapumes pintados de branco e decorados com reproduções de desenhos de Niemeyer, nem parece um canteiro de obras.

Escolas de hotelaria para qualificar a mão de obra local

Origem de mais de 30% da mão de obra atual do Nacional, a Escola de Hotelaria da Rocinha está recebendo apoio do hotel. O curso profissionalizante foi inaugurado em 2011 e inicialmente teve patrocínio da rede de hotelaria Windsor. Não é a única escola de hotelaria da cidade vinculada a um grande grupo hoteleiro.  O Hilton Barra Rio de Janeiro, outro estabelecimento relativamente novo,  mantém desde 2015 uma escola de hotelaria em parceria com a construtora Carvalho Hosken. Os cursos, gratuitos, têm duração de seis meses e são para jovens entre 18 e 24 anos, que tenham concluído o ensino médio ou estejam no terceiro ano. As aulas são no próprio hotel de 298 quartos. Já foram formados 76 alunos e vários foram contratados pelo Hilton Barra em áreas como cozinha, recepção e administração.

A turma deste primeiro semestre de 2017 da Escola Carvalho Hosken de Hotelaria em parceria com o Hilton reúne 33 alunos. O curso ainda tem o apoio da ONG RioSolidário, do Senac Rio e da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH-RJ).

O Hilton Barra, que fica na Avenida Embaixador Abelardo Bueno, recebeu este mês o selo Leed Gold de boas práticas ambientais. Além do uso racional de água e energia, um dos fatores para a certificação foi justamente a integração com as comunidades vizinhas ao hotel.

 

 

Carla Lencastre

Jornalista formada pela Universidade Federal Fluminense (UFF), trabalhou por mais de 25 anos na redação do jornal O Globo nas áreas de Comportamento, Cultura, Educação e Turismo. Editou a revista e o site Boa Viagem O Globo por mais de uma década. Anda pelo Brasil e pelo mundo em busca de boas histórias desde sempre. Especializada em Turismo, tem vários prêmios no setor e é colunista do portal Panrotas. Desde 2015 escreve como freelance para diversas publicações, entre elas o #Colabora e O Globo. É carioca e gosta de dias nublados. Ama viajar. Está no Instagram em @CarlaLencastre 

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