Petrobras aposta em eletrificação e hidrogênio para descarbonização no Brasil

Em evento na Coppe, diretor diz que empresa vai destinar até 15% do capital de investimento em iniciativas de baixo carbono

Por Amelia Gonzalez | ODS 7 • Publicada em 22 de junho de 2023 - 10:10 • Atualizada em 22 de novembro de 2023 - 18:56

Plataforma de petróleo da Petrobrás no por do sol da Baía de Guanabara: empresa promete investir mais em energias renováveis. Foto Fábio Teixeira/Anadolu Agency/AFP

Em meio a um mundo em transformação constante, acadêmicos, empresários, alguns governantes mais conscientes e cidadãos idem buscam soluções para o maior de todos os problemas da nossa civilização: uma fonte de energia de baixo carbono. Reunidos no auditório do Centro de Tecnologia 2 da COPPE-UFRJ, na manhã da última quinta-feira, dia 15 de junho, representantes dos três poderes participaram do evento de lançamento da plataforma BxC, que pretende ser a contribuição da Academia, como catalisadora do ecossistema de tecnologias de baixo carbono. E o tema foi posto em debate.

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Listadas algumas soluções pelos palestrantes convidados, elas também foram acompanhadas por questões e desafios, como não podia deixar de ser, já que estamos longe de uma situação de fácil equação. Suzana Khan, vice-diretora da Coppe-UFRJ e idealizadora da plataforma, abriu a mesa com uma pergunta direcionada a todos: “A transição energética tem sido debatida em diferentes fóruns, muito direcionado para o setor elétrico. Quais as soluções que parecem mais promissoras para o Brasil, em quais linhas de incentivo?”

Coube a Mauricio Tolmasquim, atualmente na função de diretor executivo de Transição Energética e Sustentabilidade da Petrobras, mostrar uma das saídas possíveis: a eletrificação. “É a eletrificação que vai permitir a descarbonização. Mas uma parte dessas emissões de consumo de energia que não tem como serem substituídas pela energia elétrica, como siderurgia, cimento, refino, transporte aéreo, marítimo, transporte de carga de longa distância. A peça central para esses setores é o hidrogênio. Não estou falando do combustível que Julio Verne previu há mais de 150 anos em seu romance – “A Ilha Misteriosa” . Verne disse que esta seria a “civilização do hidrogênio” porque o petróleo seria substituído pelo hidrogênio. Não é tanto assim. Mas o hidrogênio não terá um papel menor: ele é o último elo que vai permitir a descarbonização total. Sem ele,  não se chega a net zero”, disse.

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Representantes dos três poderes participam de evento na Coppe para o lançamento da plataforma BxC,(Baixo Carbono). Foto Marcos Knoedt/Coppe
Representantes dos três poderes participam de evento na Coppe para o lançamento da plataforma BxC,(Baixo Carbono). Foto Marcos Knoedt/Coppe

Vale lembrar que em 2015 foi assinado, em Paris, na Conferência Mundial do Clima, um acordo entre mais de 190 nações com o objetivo de reduzir as emissões de carbono do mundo. A meta é manter o aumento da temperatura do planeta abaixo dos 2° , sem o que a humanidade não conseguirá habitar alguns lugares.

Como é urgente, portanto, evitarmos o aquecimento, a importância do hidrogênio não pode ser menosprezada. Mas, para ser produzido, ele precisa de energia renovável.

Tolmasquim trouxe então uma boa notícia: a Petrobras está fazendo uma série de ações para produzir energias eólica e solar, em parceria com outras empresas no Brasil e fora do Brasil.  A Petrobras vai utilizar de 6% a 15% de todo o capital de investimento nessa iniciativa de baixo carbono. Isso dá bastante recurso”, disse o diretor de Transição Energética e Sustentabilidade.

Para os setores da economia que não podem ser eletrificados, as iniciativas vão em direção ao diesel renovável, que é diferente e melhor do que o biodiesel, segundo o executivo. “Já temos diesel renovável na refinaria do Paraná, em Paulinia, Duque de Caxias e Cubatão. No diesel renovável entram refino, petróleo, óleo vegetal e um hidrotratamento”, contou Tolmasquim, que citou ainda o hidrogênio azul e a técnica de captura e injeção de carbono como iniciativas que a empresa está adotando para colaborar na linha de descarbonizar a economia.

Telmo Guiorzi, secretário-executivo da ABESPetro, que representa 50 empresas que fornecem bens e serviços para petroleiras, usou tom um pouco menos otimista do que Tolmasquim com relação à descarbonização e disse que já teve que responder muitas vezes à pergunta “vocês vão continuar usando petróleo no nome (da Associação)?”, nesta era das incertezas. “Pode ser que daqui a algumas décadas a gente precise trocar o nome, mas, por enquanto, vamos manter. Estamos vivendo um momento de incertezas e dúvidas, mas não vamos fazer nada muito longe do que já fazemos. Diferentemente do que algumas pessoas possam pensar, o petróleo vai continuar vivo por muito tempo”, disse Guiorzi.

O executivo recorda ainda que quando o petróleo entrou na produção energética do mundo, em 1859, o carvão era o principal energético. De lá para cá, o carvão aumentou em 40 vezes a produção e o consumo. O que prevalece, e que segundo ele precisa de um novo cenário, é a pobreza e a miséria no mundo (dados recentes da ONU dão conta de que o número de pessoas afetadas pela fome globalmente subiu para cerca de 828 milhões em 2021, um aumento de cerca de 46 milhões desde 2020 e 150 milhões desde 2019).

“Não podemos deixar pessoas com fome em razão de não produzir nenhum grama de CO2. O que nós precisamos agora é continuar produzindo petróleo, talvez mais ainda do que os 90 milhões de barris que produzimos hoje por dia, mas tentar fazer mais limpo: a solução pode ser hidrogênio verde, azul, amonia, ou o próprio petróleo, talvez um pouco mais limpo. O que não podemos é parar de andar de avião ou de transportar cargas em navio. A visão da ABESpetro é na linha de que nós vamos continuar na área de petróleo”, disse Guiorzi.

Brasil não é gasífero

A segunda questão colocada por Suzana Khan, mediadora do painel, foi sobre o gás natural, também visto como fonte da transição energética. “Mas o Brasil tem gás suficiente para isso? Para industrializar o interior, para fazer hidrogênio?”, perguntou a cientista.

Mauricio Tolmasquim foi direto: o Brasil “é um país petrolífero, não gasífero”, disse. “É importante entender isso, para não ter frustrações. Além disso, nosso gás está a uma distância muito grande da costa e a uma grande profundidade. Não é competitivo”, acrescentou Tolmasquim.

O painelista Cristiano da Costa, presidente da Shell do Brasil,  comemorou o fato de estar numa mesa com a possibilidade de trazer essa realidade à tona. “É bom ver o Tolmasquim falar abertamente sobre isso. Eu passei 10 anos trabalhando na área de gás da Shell lá fora e sempre me surpreendeu essa percepção de que o Brasil tem abundância de gás. Os fatos mostram o contrário. Temos na casa de 12 TCF (trilhões de pés cúbicos), a América do Norte tem 400. Rússia mais de 1.000, o campo na fronteira entre Irã e Qatar tem 900”, afirmou o executiva da petroleira.

Investir em pesquisa e desenvolvimento, portanto, no sentido de abrir caminhos para “limpar” cada vez mais o petróleo, foi uma opção sugerida por todos os  palestrantes na mesa coordenada por Suzana Khan. Além de Tolmasquim, Guiorzi e Cristiano Pinto da Costao CEO da Petrogal Brasil, Daniel Elias; o diretor-presidente da Enauta, Décio Oddone e o  diretor de Comunicação e Responsabilidade Social Corporativa da Engie Brasil, Gil Maranhão Neto.

Apesar do tom festivo – a COPPE estava comemorando 60 anos – e comemorativo, com o lançamento de uma plataforma que pretende ser uma ferramenta de ajuda para as empresas, o evento elencou mais desafios do que soluções no caminho da descarbonização. A julgar pelo cenário mundial, não há como discordar.

No mesmo dia 15, quando o debate aqui no Brasil girava sobre a melhor maneira de se conseguir conter o aquecimento global,  representantes de 196 países reuniram-se em Bonn, na Alemanha. Foi  um encontro preparatório para delinear uma agenda de debates para a COP28, que vai acontecer em novembro em Dubai, nos Emirados Árabes. Mas a reunião foi tensa e esteve a um passo de ser inconclusiva.

Segundo informações do site Observatório do Clima, a política deu o tom, o que não é nada bom quando se vive num mundo tão polarizado e com uma guerra. Países pobres acusavam os ricos de não cumprirem suas promessas – o que está certo, já que em 2009 foi feita uma promessa, até hoje não cumprida, de que eles dariam US$ 100 bilhões/ano para ajudar a mitigar os problemas causados pelos eventos extremos.

Os ricos, por sua vez, reclamaram dos pobres, dizendo que eles querem implodir a Conferência.

Não são mesmo tempos fáceis.

A plataforma BxC

Baixo Carbono (BxC) é uma plataforma catalisadora do ecossistema de tecnologias para Low Carbon, liderada pela COPPE UFRJ. Com a atuação de especialistas capazes de navegar e traduzir mindset e objetivos dos atores do ecossistema, ela se propõe a conectar, enquadrar e acompanhar parcerias de Pesquisa e Desenvolvimento com o apoio de uma plataforma digital.

A ideia é ajudar empresas a cumprirem suas metas de descarbonização e solucionar seus desafios tecnológicos.

Amelia Gonzalez

Jornalista, durante nove anos editou o caderno Razão Social, encartado no jornal O Globo, que atualizava temas ligados ao desenvolvimento sustentável. Entre 2013 e 2020 foi colunista do G1, sobre o mesmo tema. Atualmente mantém o Blog Ser Sustentável, onde as questões relacionadas ao meio ambiente, ao social e à governança são tratadas sempre com ajuda de autores especialistas.

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