ODS 1
Aqui jaz o Bolsonarismo
Tentativa violenta e fracassada de golpe em Brasília põe fim a um dos mais tristes capítulos da história política do Brasil
Aos oito dias de janeiro de 2023, em Brasília, capital da república, faleceu o movimento de extrema direita conhecido como Bolsonarismo, responsável por um dos capítulos mais tristes da história política do Brasil. A facção criminosa, que começou com o slogan “bandido bom é bandido morto”, terminou com 1.200 bandidos presos por invadirem e depredarem o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal. Os partidários da seita, derrotados na última eleição presidencial, fracassaram na tentativa de tomar o poder e estabelecer uma ditadura militar. O criador do movimento, o ex-capitão do Exército Jair Messias Bolsonaro, que um dia foi acusado de planejar explodir bombas em unidades militares, não participou diretamente da invasão e da destruição, mas foi o principal inspirador e incentivador do atentado à democracia.
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Bolsonaro, que está refugiado na Flórida, nos EUA, passou toda a sua carreira política menosprezando as instituições democráticas, os direitos civis e incentivando o ódio. São dele frases terríveis como: “Deveriam ter sido fuzilados uns 30 mil corruptos, a começar pelo presidente Fernando Henrique Cardoso”, “Se o filho começa a ficar assim meio gayzinho, leva um coro e pronto, ele muda o comportamento”, “Competente sim foi a cavalaria americana, que dizimou os seus índios no passado”, “Eu não empregaria mulheres com o mesmo salário…”, “Fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas”, “Eu não vou te estuprar porque você é feia, não merece”, “O grande erro da ditadura foi torturar e não matar”. Algumas dessas frases, durante muito tempo, foram classificadas como folclóricas, ou mesmo autênticas.
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Veja o que já enviamosInspirado por ultradireitistas americanos, como Steve Bannon e Jason Miller, ambos ex-assessores de Donald Trump, o bolsonarismo foi o primeiro movimento populista de direita, radical e digital do Brasil. Eles souberam usar como poucos os algoritmos, as mentiras e direcionar o debate público de acordo com os seus interesses imediatos. E esse conhecimento não será perdido, alguém vai herdá-lo. É verdade que o Bolsonarismo não teria prosperado no Brasil sem uma sociedade reacionária, preconceituosa, machista, racista e violenta como a nossa. No entanto, mesmo para os ouvidos conservadores de alguns brasileiros, os atentados do último domingo parecem ter ido um pouco longe demais. Terrorismo, não.
O fim do Bolsonarismo, como ideologia política, obviamente, não significa o fim do pensamento de direita e conservador no Brasil. Muito pelo contrário. Ele sempre existiu, sempre foi relevante, e depois de Bolsonaro, ficou claro que tem bastante viabilidade política. O que deve acontecer daqui em diante é que o bode será retirado da sala. Ninguém vai querer mais brincar com fogo. O cheiro de enxofre que todos sentiam, mas alguns fingiam ignorar, agora se tornou insuportável. Se é possível identificar alguma notícia boa em meio aos escombros de Brasília, talvez seja essa: a morte do Bolsonarismo.
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Formado em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Foi repórter de Cidade e de Política, editor, editor-executivo e diretor executivo do jornal O Globo. Também foi diretor do Sistema Globo de Rádio e da Rádio CBN. Ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo, em 1994, e dois prêmios da Society of Newspaper Design, em 1998 e 1999. Tem pós-graduação em Gestão de Negócios pelo Insead (Instituto Europeu de Administração de Negócios) e em Gestão Ambiental pela Coppe/UFRJ. É um dos criadores do Projeto #Colabora.