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Tragédia sanitária e drama social no Brasil: painel abre debates pelos 6 anos do #Colabora
Participaram da live a pesquisadora Fernanda Viana e o sociólogo José Eustáquio Diniz Alves, autor do Diário da Covid-19. Mediação ficou por conta do jornalista Aydano André Motta.
A pandemia do coronavírus deixou, até o momento, 614 mil mortos no Brasil. O país ficará marcado na história como um dos mais afetados pela crise sanitária, sendo o 10º entre as nações com mais mortes por milhões de habitantes. Um total de 13% das mortes de todo o mundo. Os impactos desastrosos desse cenário foi assunto nesta segunda-feira, 29, do primeiro painel do #Colabora em comemoração aos seis anos de fundação do portal. Com mediação de Aydano André Motta, a live “Tragédia sanitária e drama social no Brasil” contou com participação da assistente social Fernanda Viana e do sociólogo José Eustáquio Diniz Alves, autor do Diário da Covid-19.
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Além de saúde, clima, economia verde, gênero, meio ambiente e diversidade são os temas discutidos no ciclo de debates “#Colabora 6 anos, 6 debates fundamentais”. No primeiro encontro, os participantes abordaram sobre a ineficiente gestão do governo brasileiro diante da pandemia; o avanço da vacinação; o negacionismo e as perspectivas para o país pós-covid, que como alertou a médica e pesquisadora da Fiocruz Margareth Dalcolmo, será o maior desafio da medicina. A live teve tradução em libras de Gildete Amorim e Bernadete Araújo. Assista abaixo na íntegra:
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Veja o que já enviamosCoronavírus e desigualdade
Em maio de 2020, o #Colabora começou a publicar diariamente, até julho, um panorama da evolução da pandemia no Brasil e no mundo, com dados, gráficos, projeções e análises de José Eustáquio Diniz Alves, doutor em Demografia. No segundo semestre, o “Diário da Covid-19” passou a ser semanal, sempre aos domingos. Para o especialista e autor da série, ficou evidente que os efeitos só não foram ainda piores em razão da mobilização de instituições e organizações em prol de comunidades e populações mais vulneráveis.
Está mais do que comprovado que pandemia escancarou, de uma vez por todas, o tamanho da desigualdade no país e quem mais sentiu os impactos foram aqueles que já vivem em situação de vulnerabilidade, como periféricos, negros, indígenas, idosos, LGBT+, entre outros grupos. “As pessoas se mobilizaram para evitar um estrago ainda maior. A sociedade sem o apoio do governo, em meio a uma onda negacionista, conseguiu evitar isso”, afirma José Eustáquio.
[g1_quote author_name=”Fernanda Viana” author_description=”Pesquisadora e assistente social” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]O fim da pandemia seria um alívio. Estamos morrendo por causa da pandemia, por causa de tiros e por causa da fome. Vai ser menos uma coisa que nos mata.
[/g1_quote]Quem faz parte dessa corrente do bem que ainda toma conta do Brasil é a pesquisadora e assistente social Fernanda Viana, moradora da Nova Holanda, no conjunto de favelas da Maré, no Rio de Janeiro. Ela é coordenadora da entrega de cestas básicas na Redes de Desenvolvimento da Maré. Quinze dias após o início do isolamento, o movimento já começou a trabalhar com a distribuição. Foram entregues cestas básicas para 22 mil famílias, beneficiando 55 mil pessoas, além de doação de 280 mil máscaras.
“A gente sabia que quando a pandemia chegasse aqui, iria ter muita fome e mortes. Como você fala para uma família de sete ou oito pessoas para ficar em casa? Chega a ser cruel. Muitas vezes, a pessoa é a única que sustenta essa família”, disse Fernanda durante o debate.
O trabalho segue. Fernanda acredita que, apesar da queda nos casos de coronavírus, neste ano as pessoas estão precisando ainda mais de ajuda por causa das altas taxas de desemprego. “Por isso, a emancipação é o foco dos futuros projetos, para que assim o próprio morador produza seus alimentos, por meio de hortas, por exemplo”, adianta.
Má gestão do governo e CPI da Covid-19
José Eustáquio destacou no evento virtual três pontos importantes para vencer uma pandemia: barreira sanitária; testes e rastreamento; e isolamento das pessoas doentes. Tudo conectado à uma união entre o poder público e a sociedade civil. Para ele, está mais do que clara a falta de ação do governo diante da crise.
“O Brasil teve um desempenho muito ruim no combate à pandemia. Tem um dos piores desempenhos de mortalidade em relação ao número de habitantes. É um atestado de incompetência da gestão”. Nessa linha, ele reforça a importância da CPI da Covid-19, que investiga as ações e omissões do governo federal no enfrentamento. “Houve negligência, erros e má vontade. Com certeza, milhares e milhares de vidas poderiam ter sido salvas, isso é conhecido internacionalmente”.
Ômicron e vacinação
A descoberta da nova variante da África do Sul, chamada de Ômicron, também foi tema na primeira live. A cepa é motivo de preocupação pelo alto número de mutações, de acordo com a Organização Mundial da Saúde. Por aqui, o cenário ainda é incertezas. A alta adesão à vacinação, apesar de tardia, pode ser considerada um ponto favorável, mas é preciso mais, segundo José Eustáquio.
“Se o Brasil estivesse fazendo uma testagem eficiente e uma barreira sanitária, a gente poderia dar uma resposta melhor sobre a nova variante. Ela vai chegar no Brasil, com certeza, mas não necessariamente juntamente com outra onda da doença. Por causa da vacinação, pode ser que chegue aqui mais fraca e menos letal. As medidas de prevenção precisam continuar: evitar grandes aglomerações e o uso de máscaras, porque não temos certeza de nada”.
No Brasil, 62,25% da população brasileira está com o esquema vacinal completo. Segundo Fernanda Viana, no Complexo da Maré, onde moram cerca de 140 mil pessoas, houve uma intensa mobilização para conscientização da importância da vacinação.
“O que foi bom com isso tudo: muitas das pessoas não tinham cadastros nos postos de saúde. Fizemos esse cadastro e conseguimos ampliar o número de atendidos pelo sistema público. Agora, o morador vê o SUS com outro olhar, ele sai fortalecido”, acredita.
[g1_quote author_name=”José Eustáquio Diniz” author_description=”Sociólogo e e doutor em Demografia” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]A pandemia diminuindo, vamos nos preocupar com outros pontos principais que o mundo precisa olhar imediatamente, como a fome e o desemprego.
[/g1_quote]O que esperar do futuro?
O Brasil vai demorar a superar a crise sanitária. Isso é consenso entre os debatedores. Para o sociólogo, a projeção é que a pandemia se torne uma endemia, que é quando a doença é recorrente na região, mas não há um aumento significativo no número de casos e a população convive com ela.
“O vírus vai afetar alguns lugares e outros não, a exemplo da dengue. Vamos ter uma transição: de uma doença que está afetando o mundo todo em um mesmo momento para uma que vai afetar alguns lugares em momento diferentes. A pandemia diminuindo, vamos nos preocupar com outros pontos principais que o mundo precisa olhar imediatamente, como a fome e o desemprego”.
Dois temas que afetam ainda com mais força moradores de periferias e regiões mais vulneráveis. O fim da pandemia seria um alívio para a Maré, segundo Fernanda, por razões que envolvem outras mazelas sociais. “Estamos morrendo por causa da pandemia, por causa de tiros e por causa da fome. Vai ser menos uma coisa que nos mata. Vamos poder nos concentrar nas outras emergências”. A assistente social já tem exatamente na cabeça o que vai fazer caso o fim da pandemia seja decretado. “Uma romaria para a casa do meu tio com meus filhos e dar um abraço nele”, divide a mãe solo de três crias, como a própria gosta de enfatizar.
Texto produzido pelos jornalistas da redação do #Colabora, um portal de notícias independente que aposta numa visão de sustentabilidade muito além do meio ambiente.