ODS 1
Lição de economia nos livros didáticos
Pais economizam até mil reais com o troca-troca nas escolas
Pais e filhos estão aprendendo com os livros didáticos uma lição de economia e sustentabilidade. O aprendizado não vem especificamente do conteúdo das obras e, sim, de uma prática cada vez mais frequente e organizada: o passa-passa de livros de quem já os utilizou ao longo de um ano letivo para quem vai precisar deles nos próximos meses. Tem mãe economizando quase mil reais na lista de material escolar com esse escambo. “Troquei seis livros que minha filha usou no ano passado por outros de ex-alunos do 7º ano, que é o que ela vai cursar. Consegui de matemática, história, geografia, ciências e dois de inglês. Com isso, economizei uns R$ 900, já que cada um custa, em média, R$ 150. Este ano, só vou precisar comprar o de português e alguns paradidáticos”, comemora Adriana Ferreira, mãe de Ana Clara, de 12 anos, e orientadora educacional do colégio Mopi.
Este ano, pela primeira vez, o Mopi promoveu uma feira de troca-troca. “Algumas mães já trocavam livros entre si, geralmente via WhatsApp, mas eu nunca tinha participado desses grupos. A ideia da feira partiu do departamento de marketing. Foi um sucesso”, conta Adriana. Ela já pensa em como aprimorar a próxima edição da feira. “O ideal é que ela aconteça em dezembro, antes do Natal, para ter mais adesão. Outra ideia é incentivar os alunos a não anotar nada nos livros, nem usar caneta iluminadora. Eles podem, por exemplo, usar post it”, diz, lembrando que 99,99% desses livros não têm espaço para exercícios. “Até têm perguntas, mas, por falta de onde responder, os alunos acabam usando o caderno”.
[g1_quote author_name=”Valéria Garcia” author_description=”Funcionária pública, mãe de Luís Carlos, do 9º ano” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]“No Cruzeiro, essas trocas são promovidas pelo setor de Ação Social, para a introdução dos alunos nesses temas de sustentabilidade. Isso começou porque, todo ano, o colégio ficava com seu setor de achados e perdidos lotado de uniformes e livros usados e descartados”
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Veja o que já enviamosMãe de outra aluna do mesmo colégio, Rozane Gonzales também adorou a iniciativa. “Primeiro por economia, mas também para não jogar livros fora”, diz ela, que é professora de inglês da rede municipal do Rio e da Uerj. “No município, as crianças recebem os livros. Mas, mesmo assim, o meio ambiente agradeceria se a gente pudesse reaproveitá-los e não precisasse derrubar tantas árvores”. Rozane economizou, aproximadamente, R$ 200 com a troca de dois livros. Queria mais: “Levei seis do 6º ano, mas só consegui dois do 7º”.
Em escolas bilíngues do Rio, a prática não é tão nova, como conta a funcionária pública Valéria Garcia, mãe de Luís Carlos, que vai cursar o 9º ano no Colégio Cruzeiro, alemão: “Lá, essas trocas são promovidas pelo setor de Ação Social da escola, para a introdução dos alunos nesses temas de sustentabilidade. Isso começou porque, todo ano, o colégio ficava com seu setor de achados e perdidos lotado de uniformes e livros usados e descartados. Eu era o tipo de mãe que ia lá e pegava um monte de coisas, desde 2010, mais ou menos. Ai, começou o troca-troca promovido pelo colégio, com data marcada”, relembra. Este ano, Valéria acabou não indo. Isso porque, segundo ela, o colégio promove o troca-troca antes de liberar a lista do material escolar do ano seguinte. “Aí, às vezes, mantinham algum livro do ano anterior que eu já tinha levado para trocar”, explica. Ela fez o orçamento da lista de livros pedida para o filho numa livraria especializada: R$ 1.450. Mas ainda resta a chance de conseguir os livros com outras mães. “Estou começando super tarde, mas existem pelo menos três páginas no Facebook de troca-troca, só entre pais do Cruzeiro”.
[g1_quote author_name=”Simone Ribeiro” author_description=”Administradora, mãe de Bruno, que vai cursar o 8º ano, no Lyceé Molière” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]“Eu relutava um pouco em reaproveitar os livros, mas hoje vejo que era uma besteira. Não temos espaço para guardá-los, e é preciso fazê-los circular”
[/g1_quote]O Lycée Molière também aderiu à ideia de reaproveitamento de livros. O colégio empresta as obras em francês aos alunos, e elas têm que ser devolvidas ao fim de cada ano, para novo empréstimo. Os outros livros são negociados pelos pais, por preços bem mais camaradas do cobram as livrarias. “Você vê que lá (na França) o pessoal tem muito mais essa consciência. Eu relutava um pouco em reaproveitar os livros, mas hoje vejo que era uma besteira. Não temos espaço para guardá-los, e é preciso fazê-los circular”, conta a administradora Simone Ribeiro, mãe de Bruno, de 13 anos, que está indo para o 8º ano no Lyceé. “Há dois anos faço este tipo de negócio com outras mães. Os livros do meu filho são muito bem-cuidados: eu encapo, guardo direitinho. Então, coloco à venda os que ele não usa mais (no Facebook da associação de pais) por cerca de 50% do preço original. E compro os do ano seguinte com outros pais, também com desconto”.
Valéria, do Cruzeiro, já identifica alguns sinais de que as coisas podem estar mudando pra melhor. “Tem desde o livro que parece virgem até o que meu filho chama de ‘repolhado’, tão usado que fica aberto feito uma flor. Mas noto que a quantidade de livros em mau estado está diminuindo. Mesmo quando há anotações, são menos à caneta e mais a lápis. Só não sei se isso é fruto de conscientização de pais e filhos, ou apenas porque os pais estão com vergonha de levar livros mal-conservados para trocar”. Ela também desconfia de que o novo hábito já está incomodando o mercado editorial. “Ano passado, troquei um livro que não serviu porque pediram uma edição atualizada. E olha que a do meu filho nem era de 1500. Era bem recente. Acho que essas edições atualizadas podem ser uma reação do mercado, para marcar posição”.
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Paula Autran e Reneé Rocha se completam. No trabalho e na vida. Juntos, têm umas quatro décadas de jornalismo. Ela, no texto, trabalhou no Globo por 17 anos, depois de passar por Jornal do Brasil, O Dia e Revista Veja, sempre cobrindo a cidade do Rio. Ele, nas imagens (paradas ou em movimento), há 20 anos bate ponto no Globo. O melhor desta parceria nasceu no mesmo dia que o #Colabora: 3 de novembro de 2015. Chama-se Pedro, e veio fazer par com a irmã, Maria.